Livro ‘12 Regras para a Vida’ por Jordan B. Peterson

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Aclamado psicólogo clínico, Jordan Peterson tem influenciado a compreensão moderna sobre a personalidade e, agora, se transformou em um dos pensadores públicos mais populares do mundo, com suas palestras sobre tópicos que variam da bíblia, às relações amorosas e à mitologia, atraindo dezenas de milhões de espectadores. Em uma era de mudanças sem precedentes e polarização da política, sua mensagem franca e revigorante sobre o valor da responsabilidade individual e da sabedoria ancestral tem ecoado em todos os cantos do mundo. Neste livro, ele oferece doze princípios profundos e práticos sobre como viver uma vida com significado. A partir de exemplos vívidos de sua prática clínica e vida pessoal, bem como de lições extraídas das histórias e mitos mais antigos da humanidade, 12 Regras para a Vida oferece um antídoto para o caos em nossas vidas: verdades eternas aplicadas aos nossos problemas modernos.

Editora: Editora Alta Books; 1ª edição (30 abril 2018); Páginas: 448 páginas; ISBN-10: 8550802751; ISBN-13: 978-8550802756; ASIN: B07H4TVD5D

Biografia do autor: Jordan B. Peterson é professor de psicologia na Universidade de Toronto. Ele ensina mitologia para advogados, médicos e pessoas de negócios, foi consultor do Secretário Geral da ONU e ajudou seus pacientes clínicos a lidarem com a depressão, o transtorno obsessivo-compulsivo e a ansiedade. Quando lecionava na Universidade de Harvard, foi indicado ao prestigioso prêmio Levenson Teaching Prize. Seu livro Maps of Meaning revolucionou a psicologia da religião.

Leia trecho do livro

“Jordan Peterson é o mais importante e influente pensador canadense desde Marshall McLuhan. Sua fama e impacto internacional continuam a crescer exponencialmente. A síntese ousada e interdisciplinar de Peterson combinando psicologia, antropologia, ciência, política e religião comparada cria um modelo acadêmico genuinamente humanístico do futuro.”
Camille Paglia


“O sucesso 12 Regras para a Vida, de Jordan Peterson, acerta em cheio — discute desde a identificação da hierarquia profundamente arraigada, que motiva nossa tomada de decisão, até os questionamentos indispensáveis e, às vezes, politicamente impopulares sobre a vida, além de indicar formas de melhorá-la. Se isso por si só não for suficiente, suas primeiras 20 páginas oferecem um sumário da psicologia evolutiva de tirar o fôlego.”

Howard Bloom, autor de The Lucifer principie

“Assertivo, mas gentil… Peterson fala do jeito que eu gostaria que meu pai tivesse feito… Ele é o homem certo na hora certa, alguém capaz de mostrar a um jovem que limpar o quarto tem um significado cósmico e que impor um pouco de ordem é bom para a alma, o que por sua vez, é bom para o mundo.”
National Review

A proeminente “Figura Paterna” do YouTube é a voz da razão que urna geração inteira ansiava ouvir.

Em 2017, Dr. Jordan B. Peterson se tornou um dos pensadores mais populares do mundo, depois de décadas de ajuda a seus clientes como psicólogo clínico e inspiração para seus alunos como aclamado professor em Harvard e na Universidade de Toronto. Suas palestras no YouTube, que descrevem as profundas conexões entre neurociência, psicologia e as mais antigas histórias da humanidade, atraíram milhões de espectadores do mundo todo com suas mensagens fortes, mas perspicazes, sobre responsabilidade pessoal e o sentido que ela atribui à vida. Em uma época de mudanças sem precedentes, em que as estruturas familiares desmoronam, a educação se degenera em doutrinação e a sociedade política está perigosamente polarizada, 12 Regras para a Vida oferece um antídoto: a verdade —uma verdade muito antiga, aplicada a problemas muito atuais.

Em seu livro divertido, surpreendente e informativo, dr. Peterson conta-nos o que podemos aprender com o sistema nervoso da humilde lagosta sobre manter as costas eretas (e os ombros para trás) e percorrer com confiança os caminhos da vida; por que você não deve permitir que seus filhos façam algo que o faça não gostar deles e por que os antigos egípcios reverenciavam tanto a capacidade de prestar atenção a ponto de venerá-la na forma de um deus. Peterson fala de disciplina, coragem e da necessidade de um pensamento claro e verdadeiro, destilando as descobertas da ciência e as lições dos grandes mitos do mundo em 12 diretrizes profundas para viver da forma correta enquanto permanecemos imersos na ordem e no caos de nossas vidas.

Jordan B. Peterson ensinou mitologia para advogados, médicos e executivos, foi consultor do secretário-geral da ONU, ajudou seus pacientes clínicos a lidarem com depressão, transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade e esquizofrenia, atuou como consultor de sócios majoritários de grandes escritórios de advocacia e palestrou por toda a América do Noite e Europa. Juntamente com seus alunos e colaboradores em Harvard e na Universidade de Toronto, dr. Peterson publicou mais de uma centena de artigos científicos, transformando a compreensão moderna da personalidade. Seu primeiro livro, hoje um clássico, Maps of Meaning : The Architecture of Belief, revolucionou a psicologia da religião. Siga @jordanbpeterson no Twitter, Dr. Jordan B. Peterson no Facebook e o canal JordanPetersonVideos no YouTube. Visite www.understandmyself.com, www.selfauthoring.com e www.jordanbpeterson.com.

12 REGRAS PARA A VIDA

Um antídoto para o caos


Jordan B. Peterson

Prefácio de Norman Doidge
Ilustrações de Ethan Van Scriver

SUMÁRIO

Prefácio
Introdução
REGRA 1: Costas eretas, ombros para trás
REGRA 2: Cuide de si mesmo como cuidaria de alguém sob sua responsabilidade
REGRA 3: Seja amigo de pessoas que queiram o melhor para você
REGRA 4: Compare a si mesmo com quem você foi ontem, não com quem outra pessoa é hoje
REGRA 5: Não deixe que seus filhos façam algo que faça você deixar de gostar deles
REGRA 6: Deixe sua casa em perfeita ordem antes de criticar o mundo
REGRA 7: Busque o que é significativo, não o que é conveniente
REGRA 8: Diga a verdade.Ou, pelo menos, não minta
REGRA 9: Presuma que a pessoa com quem está conversando possa saber algo que você não sabe
REGRA 10: Seja preciso no que diz
REGRA 11: Não incomode as crianças quando estão andando de skate
REGRA 12: Acaricie um gato ao encontrar um na rua
ENCERRAMENTO
AGRADECIMENTOS

PREFÁCIO

REGRAS? MAIS REGRAS? SÉRIO? A vida já não é complicada e restritiva o suficiente sem regras abstratas que não levam em conta nossa situação única e individual? E urna vez que nosso cérebro é moldável e se desenvolve de forma diferente com base nas experiências da vida, por que, então, esperar que algumas regras possam ser úteis para todos nós?

As pessoas não clamam por regras, nem mesmo na Bíblia… como quando Moisés desce a montanha, após urna longa ausência, carregando as tábuas inscritas com os Dez Mandamentos e encontra os Filhos de Israel na folia. Eles haviam sido escravos do Faraó e submetidos às suas regras tirânicas por 400 anos e, após isso, Moisés os sujeitou ao deserto inclemente por outros 40 anos para purificá-los de sua servidão. Agora, finalmente libertos, estão desenfreados e perderam o controle dançando loucamente em frente a um ídolo, um bezerro de ouro, exibindo todas as formas de corrupção corpórea.

“Tenho boas… e más notícias”, brada o legislador para eles. “Quais vocês querem primeiro?”

“As boas notícias!”, respondem os hedonistas.

“Consegui convencê-Lo a reduzir de 15 para 10 Mandamentos!”

“Aleluia!”, exclama a multidão desenfreada. “E as más?”

“Adultério ainda está na lista.”

Então, regras hão de existir — mas, por favor, não muitas. Somos ambivalentes em relação às regras, mesmo quando sabemos que são boas para nós. Se somos almas espirituosas, se temos personalidade, as regras parecem restritivas, urna afronta ao nosso livre-arbítrio e ao nosso orgulho de determinar nossa própria vida. Por que deveríamos ser julgados de acordo com a regra dos outros?

E julgados nós somos. Afinal, Deus não deu “As Dez Sugestões” para Moisés, deu Mandamentos, e se sou um agente livre, minha primeira reação perante um Mandamento pode ser a de que ninguém, nem mesmo Deus, diz o que devo fazer, mesmo que seja bom para mim. Mas a história do bezerro de ouro nos lembra de que sem regras rapidamente nos tomamos escravos das nossas paixões — e não há nada de libertador nisso.

E a história sugere algo a mais: desacompanhados e deixados por conta de nosso próprio julgamento, sem supervisão, seremos rápidos em almejar pouco e louvar qualidades que estão abaixo de nós — nesse caso, um animal artificial que traz à tona os próprios instintos de forma totalmente descontrolada. A antiga história dos hebreus deixa claro como os antigos se sentiam sobre nossas perspectivas de um comportamento civilizado na ausência de regras que buscassem elevar nosso olhar e padrões.

Uma coisa interessante nessa história da Bíblia é que ela não apenas lista as regras, como juristas, legisladores e administradores geralmente fazem; ela inclui uma história dramática que ilustra por que precisamos delas, tornando-as, desse modo, mais fáceis de serem compreendidas. Da mesma forma, neste livro, o Professor Peterson não apenas propõe suas 12 regras, mas conta histórias também, aplicando seu conhecimento de várias áreas ao ilustrar e explicar por que as melhores regras, basicamente, não nos restringem; pelo contrário, facilitam nossos objetivos e nos ajudam a ter urna vida mais plena e livre.

Conheci Jordan Peterson em 12 de setembro de 2004, na casa de dois amigos em comum, o produtor de TV Wodek Szemberg e a clínica geral Estera Bekier. Era a festa de aniversário de Wodek. Ele e Estera são imigrantes poloneses que cresceram durante o império soviético, quando era de conhecimento comum que vários assuntos eram proibidos e que questionar, mesmo que casualmente, arranjos sociais e ideias filosóficas (sem mencionar o regime em si) poderia significar um grande problema.

Mas, agora, os anfitriões deleitam-se em conversas despreocupadas, honestas, dando festas elegantes devotadas ao prazer de poder dizer o que você realmente pensa e ouvir os outros da mesma forma, em um toma lá dá cá desinibido. A regra se tornou “diga o que pensa”. Se a conversa mudasse para política, pessoas com convicções políticas diferentes falavam entre si — de fato, ansiavam por isso — de uma forma que é cada vez mais rara. Algumas vezes as próprias opiniões, ou verdades, de Wodek explodiam para fora dele, assim como sua risada. Então, ele abraçaria quem quer que fosse que o tivesse feito rir, ou o provocado para dizer o que pensava, com maior intensidade do que ele mesmo havia pretendido. Essa era a melhor parte das festas, e sua franqueza e seus abraços calorosos faziam com que valesse a pena provocá-lo. Enquanto isso, a voz da Estera cadenciava do outro lado da sala por um caminho muito preciso até atingir o ouvinte desejado. As explosões de verdades não tornavam a atmosfera menos descontraída para a turma, mas incentivavam mais explosões de verdades — o que nos libertava e provocava mais risadas, tornando a noite inteira mais agradável, pois com europeus orientais não mais reprimidos, tais como os Szemberg-Bekiers, você sempre sabia com o que e com quem estava lidando e essa franqueza era energizante. Honoré de Balzac, o romancista, uma vez descreveu os bailes e festas na França, onde nasceu, observando que o que aparentava ser uma festa eram, na realidade, duas. Nas primeiras horas, a festa se enchia com pessoas chatas cheias de poses e trejeitos, com frequentadores que iam encontrar, talvez, uma pessoa especial que endossaria sua beleza e status. Depois, bem tarde, após a maioria dos convidados ter ido embora, a segunda festa, a verdadeira, começaria. Ali, a conversa era compartilhada por todos os presentes e as risadas sinceras substituíam a atmosfera empolada. Nas festas de Estera e de Wodek, esse tipo de exposição e intimidade das altas horas da madrugada frequentemente acontecia assim que entrávamos na sala.

Wodek tem cabelo grisalho e volumoso, um caçador sempre em busca de intelectuais públicos em potencial, alguém que sabe identificar as pessoas que realmente conseguem falar na frente de uma câmera e aparentam ser autênticas, pois de fato o são (a câmera capta isso). Ele frequentemente convida essas pessoas para as festas. Um dia, Wodek levou um professor de psicologia da Universidade de Toronto, em que eu trabalho, que tinha o que era preciso: intelecto e emoção combinados. Wodek foi o primeiro a colocar Jordan Peterson na frente de uma câmera e pensou nele como um professor em busca de alunos — pois estava sempre pronto para explicar. E o fato de ele ter gostado da câmera e a câmera dele ajudou.

Naquela tarde, havia uma mesa grande no jardim dos Szemberg-Bekier. Ao redor dela, estava a coleção habitual de bocas, ouvidos e gênios eloquentes. Parecia, no entanto, que estávamos sendo atacados por um gigantesco enxame de abelhas barulhentas, e ali estava esse novo colega à mesa, com um sotaque da província de Alberta e botas de cowboy, ignorando o zumbido e continuando a falar. Enquanto falava, todos movimentávamos as cadeiras para nos desvencilhar das abelhas, tentando ao mesmo tempo não nos distanciar da mesa, pois a conversa do novato era muito interessante.

Ele tinha uma mania estranha de falar sobre questões mais profundas com quem estivesse à mesa — quase todos recém-conhecidos — como se conversasse sobre trivialidades. Ou, se falasse sobre trivialidades, o intervalo entre “Como você conheceu Wodek e Estera?” ou “Já fui apicultor, estou acostumado com abelhas” e tópicos mais sérios era de nanossegundos.

Alguém pode ouvir esses tipos de questões sendo debatidos em festas frequentadas por professores e profissionais, mas geralmente a conversa permaneceria restrita a um canto, entre dois especialistas no assunto, e se fosse estendida para o grupo todo sempre haveria alguém se gabando. Mas esse Peterson, embora erudito, não pareceu ser pedante. Ele tinha o entusiasmo de uma criança que acabou de aprender algo novo e queria compartilhá-lo. Parecia que ele acreditava, assim como uma criança — antes de saber como os adultos podem ser chatos —, que se ele achasse que alguma coisa era interessante os outros também achariam. Havia uma certa inocência naquele cowboy ao discorrer sobre os assuntos como se todos tivéssemos crescido juntos na mesma cidade ou família e pensado nos mesmos problemas sobre a existência humana.

Peterson não era um “excêntrico” na realidade, tinha habilidades tradicionais suficientes, fora professor de Harvard e era um cavalheiro (como os cowboys conseguem ser), embora dissesse alguns pequenos xingamentos bem ao estilo rural dos anos 1950. Mas todos ouviam com fascinação, pois ele falava sobre assuntos que interessavam a todos na mesa.

Havia algo de libertador em estar com uma pessoa tão estudada e que, contudo, falava de forma tão espontânea. O pensamento dele era cadenciado Parecia que tinha a necessidade de pensar em voz alta, de usar seu córtex motor para pensar, ao mesmo tempo que esse motor tinha que rodar rapidamente para funcionar bem. Para conseguir decolar. Não de forma descontrolada, mas mesmo no neutro o giro do seu motor era alto. Pensamentos espirituosos simplesmente transbordavam. Mas, diferentemente de muitos acadêmicos que assumem o controle e não abrem mão disso, quando alguém o desafiava ou corrigia ele parecia gostar. Não assumia a defensiva. Ele simplesmente dizia um “sim” amigável e baixava sua cabeça involuntariamente, balançando-a se tivesse se esquecido de algo, rindo de si mesmo por ter supergeneralizado. Ele gostava que outras pessoas mostrassem o outro lado de uma questão e ficava claro que pensar sobre um problema, para ele, era um processo dialógico.

Outro fato diferente sobre ele choca qualquer um: para um nerd, Peterson era extremamente prático. Seus exemplos eram cheios de aplicações cotidianas: gestão empresarial, como construir móveis (ele construiu a maioria dos seus), fazer o design de uma casa simples, deixar seu quarto bonito (o que virou um meme na internet) ou, como em um caso relacionado à educação, criar um projeto online de escrita que evitou que alunos das minorias abandonassem a escola ao realizar um tipo de exercício psicanalítico sobre eles mesmos, em que fizeram associações livres com seu passado, presente e futuro (agora conhecido como Self-Authoring Program — Programa de Autoria Própria).

Sempre tive um afeto especial por pessoas do Meio-oeste, da região das Pradarias Canadenses, que vêm da fazenda (onde aprenderam tudo sobre a natureza) ou de uma cidadezinha, e que construíram seus utensílios com as próprias mãos, passaram longos períodos ao ar livre sob as intempéries e, geralmente, são autodidatas e frequentam a universidade desafiando todas as possibilidades. Eu as considero bem diferentes de seus colegas urbanos e sofisticados, mas de certa forma desnaturados, para os quais a educação superior era mera predestinação e, por esse motivo, muitas vezes não valorizada ou não considerada como um fim em si, mas simplesmente uma fase da vida a serviço do avanço da carreira. Esses interioranos são diferentes: vencem por mérito próprio, são prestativos, hospitaleiros e menos presunçosos do que vários dos seus colegas da cidade grande, que passam a maior parte de suas vidas dentro de casa manipulando símbolos em computadores. Esse psicólogo cowboy parecia se importar com algum pensamento apenas se, de alguma forma, fosse útil para alguém.

Ficamos amigos. Como psiquiatra e psicanalista que ama literatura, fui atraído para ele, pois ali estava um clínico que também se permitira aprender com os grandes livros e que não apenas amava os romances russos comoventes, a filosofia e a mitologia antigas, mas que parecia tratá-los como sua herança mais valiosa. Porém, ele também fez pesquisas estatísticas brilhantes sobre a personalidade e o temperamento e havia estudado as neurociências. Embora fosse treinado como um behaviorista, era fortemente fascinado pela psicanálise, com sua ênfase em sonhos, arquétipos, persistência dos conflitos da infância na vida adulta e no papel de defesas e racionalizações do cotidiano. Ele era igualmente diferente por ser o único a manter uma prática clínica e também ser membro do Departamento de Psicologia da Universidade de Toronto, direcionado para pesquisas.

Durante minhas visitas, nossa conversa se iniciava com brincadeiras e risadas — esse era o Peterson da cidadezinha do interior de Alberta, sua adolescência como no filme FUBAR —, dando as boas-vindas ao seu lar. Ele e sua esposa, Tammy, haviam destruído a casa para construí-la novamente, transformando-a naquilo que provavelmente era a casa de classe média mais fascinante e impactante que eu já vira. Eles tinham obras de arte, máscaras esculpidas e quadros abstratos, mas o que se sobressaía era uma coleção enorme de quadros realistas originais sobre socialismo retratando Lenin e os primeiros comunistas, comissionados pela URSS. Não muito tempo depois da queda da União Soviética, quando a maior parte do mundo respirou aliviada, Peterson começou a comprar essa propaganda política a preço de banana. Os quadros idolatrando o espírito soviético revolucionário preenchiam completamente todas as paredes, o teto e até os banheiros. Os quadros não estavam lá por Jordan ter qualquer simpatia pelo totalitarismo, mas porque queria lembrar a si mesmo de algo que ele e todo inundo gostariam de esquecer: que centenas de milhões foram mortos em nome de uma utopia.

Demorou para eu me acostumar a essa casa semiassombrada, “decorada” por um delírio que praticamente havia destruído a humanidade. Mas isso era amenizado por sua esposa singular e fantástica, Tammy, que se doava integralmente, que abraçava e encorajava essa necessidade incomum de se expressar! Esses quadros ofereciam ao visitante uma primeira janela para toda a amplitude da preocupação de Jordan com a capacidade humana de praticar o mal em nome do bem e o mistério psicológico do autoengano (como alguém pode enganar a si mesmo e sair impune?) — um interesse que temos em comum. Então, havia ainda as horas que passávamos debatendo o que considero um problema menor (por ser mais raro), a capacidade humana para o mal em nome do mal, a alegria que algumas pessoas têm em destruir outras, com sucesso captada pelo poeta inglês do século XVII John Milton em Paraíso Perdido.

Assim, conversávamos tomando chá em sua cozinha, rodeada por sua estranha coleção de arte, um marcador visual da sua busca sincera por ir além da ideologia simplista, de direita ou esquerda, e não repetir os erros do passado. Após um tempo, não havia nada de peculiar em tomar chá nessa cozinha falando sobre assuntos familiares ou nossas últimas leituras com aqueles quadros ameaçadores à espreita. Era apenas viver no mundo como ele era ou, em alguns lugares, é.

No primeiro e único livro de Jordan antes deste, Maps of Meaning [“Mapas do Sentido”, em tradução livre], ele compartilha seus insigths profundos sobre temas universais da mitologia mundial e explica como todas as culturas criaram histórias para nos ajudar a enfrentar e mapear o caos ao qual somos lançados quando nascemos; caos esse que se constitui de tudo aquilo que é desconhecido por nós e qualquer território inexplorado que precisemos atravessar no mundo social ou na psique.

Combinando evolução, neurociência da emoção, parte do melhor de Jung e Freud, e muito das grandes obras de Nietzsche, Dostoiévski, Solzhenitsyn, Eliade, Neumann, Piaget, Frye e Frankl, o livro Maps ofMeaning, publicado cerca de duas décadas atrás, mostra a ampla retórica de Jordan para entender como os seres humanos e seu cérebro lidam com a situação arquetípica que surge sempre que nós, no cotidiano, precisamos enfrentar algo que não entendemos. O brilhantismo do livro está na demonstração de quão enraizada essa situação está na evolução, no nosso DNA, cérebro e nas nossas histórias mais antigas. E ele defende que essas histórias sobreviveram porque ainda oferecem uma orientação para lidarmos com a incerteza e o inevitável desconhecido.

Uma das muitas virtudes do livro que você está lendo agora é que ele oferece uma introdução para o Maps of Meaning, cujo trabalho foi altamente complexo, uma vez que Jordan estava desenvolvendo sua abordagem da psicologia enquanto o escrevia. No entanto, ele foi um alicerce, pois não importa quão diferentes nossos genes ou experiências possam ser ou como nosso cérebro moldável é conectado com nossa experiência, todos temos que lidar com o desconhecido e tentamos abandonar o caos em busca da ordem. É por isso que muitas das regras deste livro, sendo baseado em Maps ofMeaning, têm um elemento de universalidade.

O livro Maps of Meaning nasceu da dolorosa percepção de Jordan, enquanto adolescente crescendo em plena Guerra Fria, de que grande parte da humanidade parecia estar a ponto de explodir o planeta para defender suas várias identidades. Ele sentiu que tinha de entender como era possível que aquela gente estivesse disposta a sacrificar tudo por uma “identidade”, não importava qual fosse. E percebeu que tinha de entender as ideologias que levaram os regimes totalitários a uma variante daquele mesmo comportamento: matar seus próprios cidadãos. Em Maps of Meaning, e novamente neste livro, a ideologia é uma das questões para a qual ele aleita os leitores a terem muito cuidado, não importa quem a esteja propagando ou para qual fim.

Ideologias são ideias simples, disfarçadas de ciência ou filosofia, que pretendem explicar a complexidade do inundo e oferecer soluções para aperfeiçoá-lo. Os ideólogos são pessoas que fingem saber como “fazer um mundo melhor” antes de organizarem o próprio caos interior. (A identidade de guerreiro outorgada por sua ideologia encobre esse caos.) Isso é arrogância, é claro, e um dos temas mais importantes deste livro é “arrume sua casa primeiro”, para o que Jordan fornece conselhos práticos.

As ideologias substituem o conhecimento verdadeiro, e os ideólogos são sempre perigosos quando ganham poder, pois um comportamento simplista e sabe-tudo não é páreo para a complexidade da existência. Além disso, quando suas engenhocas sociais não funcionam, os ideólogos não culpam a si mesmos, mas a todos que desmascaram suas simplificações. Outro grande professor da Universidade de Toronto, Lewis Feuer, em seu livro Ideology and the Ideologists [“A deologia e os Ideólogos”, em tradução livre], observou que os ideólogos reestruturam as mesmas histórias religiosas que julgavam capazes de suplantar, mas eliminam a narrativa e a riqueza psicológica. Tal qual o Comunismo, uma história emprestada dos Filhos de Israel no Egito, com uma classe escravizada, perseguidores ricos, um líder, como Lenin, que vai ao exterior, vive com os escravizadores e então guia os escravizados à terra prometida (a utopia; a ditadura do proletariado).

Para entender a ideologia, Jordan leu extensivamente não apenas sobre o gulag soviético, mas também sobre o Holocausto e a ascensão do Nazismo. Eu nunca havia conhecido alguém que, nascido cristão e de minha geração, fosse tão completamente atormentado pelo que aconteceu com os judeus na Europa e que houvesse se esforçado tanto para entender como isso pôde ocorrer. Eu também havia estudado com essa profundidade. Meu próprio pai sobreviveu a Auschwitz. Minha avó estava na meia-idade quando ficou face a face com o Dr. Josef Mengele, o médico nazista que conduziu experimentos indescritivelmente cruéis em suas vítimas, e ela sobreviveu a Auschwitz ao desobedecer sua ordem para entrar na fila com os mais velhos, grisalhos e fracos, e, em vez disso, enfiou-se na fila dos mais jovens. Ela escapou das câmaras de gás uma segunda vez ao negociar comida por tintura de cabelo, para que não fosse morta por aparentar ser muito velha. Meu avô, o marido dela, sobreviveu ao campo de concentração Mauthausen, mas morreu engasgado com o primeiro pedaço de comida sólida que recebeu bem próximo do dia da libertação. Conto isso pois, muitos anos após termos nos tornado amigos, quando Jordan assumiu uma posição liberal clássica a favor da liberdade de expressão foi acusado pelos extremistas de esquerda de ser um fanático de direita.

Permita-me dizer, com todo o cuidado possível: no mínimo, esses acusadores simplesmente não fizeram seu dever de casa. Eu fiz. Com um histórico familiar como o meu, qualquer um desenvolve não apenas um radar, mas um sonar subaquático que detecta o fanatismo de direita; mas, ainda mais importante, aprende a reconhecer o tipo de pessoa com compreensão, ferramentas, boa vontade e coragem para combatê-lo, e Jordan Peterson é essa pessoa.

Minha própria insatisfação com as tentativas da ciência política atual de entender a ascensão do Nazismo, totalitarismo e preconceito foi um fator preponderante em minha decisão de complementar meus estudos de ciência política com os do inconsciente, projeção, psicanálise, potencial regressivo da psicologia em grupo, psiquiatria e cérebro. Jordan afastou-se da ciência política por motivos parecidos. Com esses interesses paralelos cruciais, não concordávamos sempre nas “respostas” (graças a Deus), mas quase sempre concordávamos nas perguntas.

Nossa amizade não eram só angústia e melancolia. Criei o hábito de participar das aulas dos meus colegas professores em nossa universidade e, assim, assistia às aulas dele, que estavam sempre lotadas, e vi aquilo que milhões puderam ver online: um palestrante brilhante, por vezes esplêndido, que oferecia seu melhor solo, como um artista de jazz; às vezes parecia um inflamado pregador das Pradarias Canadenses (não pela evangelização, mas por sua paixão e habilidade de contar histórias que transmitem tudo o que está em jogo na vida ao crermos ou não em diversas ideias). Ele conseguia facilmente mudar o assunto para fazer um resumo sistemático impressionante sobre uma série de estudos científicos. Era um mestre em ajudar os alunos a serem mais reflexivos e levarem a si mesmos e seus futuros a sério. Ele os ensinou sobre vários dos grandes livros que já foram escritos. Oferecia exemplos reais da prática clínica, era (apropriadamente) autorrevelador, mesmo quanto às próprias vulnerabilidades, e construía ligações fascinantes entre evolução, cérebro e histórias religiosas. Em um mundo em que os estudantes são condicionados a entender a evolução e a religião unicamente como opostas (através de pensadores como Richard Dawkins), Jordan demonstrava aos seus alunos como a evolução, entre todas as coisas, ajuda a explicar o profundo apelo psicológico e a sabedoria de muitas histórias antigas, de Gilgamesh à vida de Buda, mitologia egípcia e à Bíblia. Ele mostrava, por exemplo, como as histórias sobre se aventurar voluntariamente rumo ao desconhecido — a jornada do herói —espelham-se nas tarefas universais para as quais o cérebro evoluiu. Ele respeitava as histórias, não era um reducionista, e nunca alegou ter esgotado a sabedoria delas. Quando debatia um assunto, como preconceito, seus parentes emocionais, medo e repulsa, ou as diferenças típicas dos gêneros em geral, conseguia mostrar como esses traços evoluíram e por que sobreviveram.

Acima de tudo, ele alertava seus alunos sobre assuntos raramente debatidos na universidade, tais como o simples fato de que todos os antigos, de Buda aos autores bíblicos, sabiam aquilo que qualquer adulto vivido sabe: que a vida é sofrimento. Se você ou alguém próximo está sofrendo, isso é triste. Mas, de forma lamentável, não é particularmente especial. Não sofremos apenas porque “os políticos são idiotas”, “o sistema é corrupto” ou porque você e eu, assim como a maioria, podemos nos descrever legitimamente como uma vítima de algo ou de alguém, de alguma maneira. É pelo fato de termos nascido humanos que, com certeza, teremos nossa dose de sofrimento. E, muito provavelmente, se você ou alguém que ama não está sofrendo agora, estará dentro de cinco anos, a menos que você seja bizarramente sortudo. Criar os filhos é dificil; trabalhar é dificil; velhice, doença e morte são dificeis, e Jordan enfatizou que passar por tudo isso completamente sozinho, sem o auxílio de um relacionamento amoroso, da sabedoria ou dos insigths psicológicos dos grandes psicólogos, apenas dificulta ainda mais. Ele não queria assustar os alunos; aliás, eles consideravam essa conversa franca reconfortante, pois no fundo de suas psiques a maioria sabia que ele dizia a verdade, mesmo que nunca tivesse existido um fórum para debater isso — talvez porque os adultos, durante suas vidas, tornaram-se tão ingenuamente superprotetores que enganaram a si mesmos pensando que não falar sobre sofrimento, de alguma forma, protegeria magicamente seus filhos.

Nesse ponto, ele trazia à tona o mito do herói, um tema intercultural explorado psicanaliticamente por Otto Rank, que Peterson, seguindo Freud, percebeu que é similar em muitas culturas. A mesma questão já foi levantada por Carl Jung, Joseph Campbell e Erich Neumann, entre outros. Com ele, Freud fez grandes contribuições ao explicar as neuroses através, entre outras coisas, do foco no entendimento daquilo que podemos chamar de história do herói fracassado (como a de Édipo); Jordan concentrou-se nos vitoriosos. Em todas essas histórias de triunfo, o herói precisa se aventurar rumo ao desconhecido em um território inexplorado, lidar com um desafio grande e novo, e correr grandes riscos. No processo, uma parte dele tem que morrer ou ser deixada de lado para que possa renascer e enfrentar o desafio. Isso demanda coragem, algo raramente discutido em aulas ou livros de psicologia. Durante sua manifestação pública recente sobre a liberdade de expressão e contra o que chamo de “expressão forçada” (pois envolve um governo forçando os cidadãos a darem voz para visões políticas), havia muito em jogo; ele tinha muito a perder, e sabia disso. Não obstante, pude vê-lo (e também a Tammy) não apenas demonstrar tal coragem, mas também continuar a viver seguindo muitas das regras deste livro, várias das quais podem ser bastante exigentes.

Pude vê-lo crescer, da pessoa incrível que era, para alguém ainda mais capaz e seguro — ao viver seguindo estas regras. De fato, foi o processo de escrever este livro e desenvolvê-las que o levou a se posicionar contra a expressão forçada ou mandatária. E foi por isso que, durante aqueles eventos, ele começou a postar alguns dos seus pensamentos sobre a vida e estas regras na internet. E agora, após mais de mo milhões de visualizações no YouTube, sabemos que seus posts tocaram profundamente as pessoas.

Considerando nossa aversão por regras, como podemos explicar as reações extraordinárias às suas palestras, justamente quando o que propõem são regras? No caso de Jordan, foram, é claro, seu carisma e uma disposição incomum para defender um princípio que inicialmente lhe proporcionaram uma vasta exposição online; as visualizações de suas primeiras declarações no YouTube rapidamente atingiram centenas de milhares. Mas as pessoas continuaram o acompanhando porque o que ele diz atinge uma necessidade profunda e silenciosa. E isso porque, paralelamente ao nosso desejo de sermos livres de regras, todos buscamos uma estrutura.

Para muitos jovens a carência de regras, ou de diretrizes, é maior hoje por um bom motivo. No Ocidente, pelo menos, milhares estão vivendo um momento histórico único. Eles são, acredito, a primeira geração diligentemente ensinada sobre duas ideias aparentemente contraditórias sobre moralidade, ao mesmo tempo — em suas escolas, faculdades e universidades, por muitos de minha geração. Essa contradição deixou-os, em geral, desorientados e inseguros, sem um guia e, mais tragicamente, privados de riquezas que nem sabem que existem.

A primeira ideia, ou ensinamento, é de que a moralidade é relativa, no mínimo um “julgamento de valor” pessoal. Relativo significa que não há certo ou errado absolutos; em vez disso, a moralidade e as regras associadas a ela são apenas uma questão de opinião ou casualidade pessoal; “relativo a” ou “relacionado a” uma estrutura específica, como a etnicidade, a criação ou a cultura e o momento histórico nos quais cada um nasce. Nada além de um acidente de nascimento. De acordo com esse argumento (agora, uma doutrina), a história ensina que religiões, tribos, nações e grupos étnicos tendem a discordar sobre questões fundamentais, e sempre discordaram. Hoje, a esquerda pós-modernista alega, adicionalmente, que a moralidade de cada grupo não é nada além da tentativa de exercer poder sobre o outro. Portanto, o mais decente a ser feito — uma vez que se torna evidente como os valores morais que você e sua sociedade defendem são arbitrários — é demonstrar tolerância com as pessoas que pensam de modo diferente e que vêm de contextos distintos (diversos). Essa ênfase na tolerância é tão primordial que para muitas pessoas uma das piores falhas de caráter que alguém pode ter é ser alguém “dado a fazer julgamentos de valor”el. E, uma vez que não sabemos diferenciar o certo do errado, ou o que é bom, a coisa mais inadequada que um adulto pode fazer é dar conselhos aos mais jovens sobre como viver.

Assim, uma geração cresceu ignorando o que se denominava, corretamente, de “sabedoria prática”, que guiou as anteriores. Os chamados millenials, ou geração Y, que ouviram inúmeras vezes que receberam a melhor educação disponível possível, na verdade sofreram uma forma de grave abandono intelectual e moral. Os relativistas da minha geração e da de Jordan, vários dos quais se tomaram os professores dessa geração, escolhem desvalorizar milhares de anos de conhecimento humano sobre como adquirir virtudes, descartando-o como antiquado, “sem relevância” ou até “opressivo”. Eles tiveram tanto sucesso que até a palavra “virtude” parece desatualizada, e aquele que a usa aparenta ser anacronicamente moralista e presunçoso.

O estudo da virtude não é exatamente o mesmo que o da moral (certo e errado, bem e mal). Aristóteles definiu as virtudes como simples formas de comportamento mais favoráveis à felicidade na vida. O vício foi definido como formas de comportamento menos favoráveis à felicidade. Ele observou que as virtudes sempre almejam o equilíbrio e evitam os extremos dos vícios. Aristóteles estudou virtudes e vícios em seu livro Ética a Nicô; naco. Foi um livro baseado em experiência e observação, não em conjecturas, sobre o tipo de felicidade que era possível para os seres humanos. Cultivar o julgamento da diferença entre virtude e vício é o princípio da sabedoria, algo que nunca pode estar desatualizado.

Em contraste a isso, nossos relativistas modernos começam por asseverar que fazer julgamentos sobre o modo de viver é impossível, pois não há um bem real e uma virtude verdadeira (uma vez que ambos são relativos). Desse modo, o mais próximo da “virtude” é a “tolerância”. Apenas a tolerância fornecerá a coesão social entre grupos diferentes e nos prevenirá de causar danos uns aos outros. No Facebook e em outras formas de mídia social, portanto, você sinaliza sua assim chamada virtude dizendo a todos o quão tolerante, aberto e compassivo você é, e espera que as curtidas se acumulem. (Deixando de lado o fato de que dizer às pessoas que você é virtuoso não é uma virtude, é autopromoção. Sinalizar a virtude não é virtude. Sinalizar a virtude é, muito possivelmente, nosso vício mais comum.)

Intolerância com o ponto de vista dos outros (não importa quão ignorantes ou incoerentes eles possam ser) não é simplesmente errado; em um mundo em que não há certo e errado, é ainda pior: é um sinal de que você é desagradavelmente grosseiro ou, possivelmente, perigoso.

Mas o que acontece é que muitas pessoas não conseguem tolerar o vácuo — o caos — inerente à vida, mas que ficou pior por esse relativismo moral; elas não conseguem viver sem uma bússola moral, sem um ideal pelo qual guiar suas vidas. (Para os relativistas, os ideais também são valores e, como todos os valores, meramente “relativos”, e dificilmente vale a pena se sacrificar por eles.) Então, ao lado do relativismo, encontramos a difusão do niilismo e do desespero, e o oposto do relativismo moral: a certeza cega oferecida pelas ideologias que alegam ter uma resposta para tudo.

E, assim, chegamos ao segundo ensinamento com o qual os millenials têm sido bombardeados. Eles se inscrevem em cursos de humanidades para estudar os maiores livros já escritos. Mas não recebem os livros; em vez disso, recebem ataques ideológicos contra os livros baseados em uma simplificação aterrorizante. Onde o relativista está repleto de incerteza, o ideólogo é o oposto. Ele é superpreconceituoso e crítico, sempre sabe o que está errado nos outros e como resolver. Às vezes parece que as únicas pessoas dispostas a dar conselhos em uma sociedade relativista são as que têm menos a oferecer.

O relativismo moral moderno tem muitas fontes. À medida que nós, no Ocidente, aprendemos mais a história, entendemos que épocas diferentes têm códigos morais específicos. Ao viajarmos pelos mares e explorarmos o globo, aprendemos sobre tribos remotas em continentes distintos cujos códigos morais faziam sentido em relação à, ou dentro da, estrutura de suas sociedades. A ciência também contribuiu ao atacar a visão religiosa do mundo e, assim, enfraquecer as bases religiosas para a ética e as regras. A ciência social materialista deu a entender que poderíamos dividir o mundo em fatos (que todos poderiam observar, objetivos e “reais”) e valores (subjetivos e pessoais). Então, poderíamos primeiramente concordar com os fatos e talvez, um dia, desenvolver um código de ética (que ainda estamos esperando). Além do mais, ao sugerir que os valores tinham uma realidade menor do que os fatos, a ciência contribuiu ainda de outra forma para o relativismo moral, pois tratou o “valor” como secundário. (Mas a ideia de que podemos separar fatos e valores facilmente foi e ainda é ingênua; de certa forma, os valores de cada um determinarão a que prestarão atenção e o que contará como fato.)

A ideia de que sociedades distintas tinham regras e morais diferentes era conhecida no mundo antigo também, e é interessante comparar sua resposta a essa percepção com a resposta moderna (relativismo, niilismo e ideologia). Quando os gregos antigos velejaram para a Índia e outros lugares, também descobriram que regras, morais e costumes diferiam em cada local, e viram que a explicação para o que é certo e errado era geralmente enraizada em alguma autoridade ancestral. A resposta grega não foi o desespero, mas uma nova invenção: a filosofia.

Sócrates, reagindo às incertezas alimentadas pela percepção desses códigos morais conflituosos, decidiu que, em vez de se tornar niilista, relativista ou ideologista, devotaria sua vida à busca de uma sabedoria que pudesse explicar essas diferenças, ou seja, ajudou a inventar a filosofia. Ele passou sua vida fazendo perguntas desconcertantes e fundamentais, tais como “O que é a virtude?”, “Como alguém pode viver uma vida boa?” e ainda “O que é justiça?”, e observou abordagens diferentes perguntando o que parecia ser o mais coerente e próximo da natureza humana. Esses são os tipos de perguntas que acredito que inspiraram este livro.

Para os antigos, a descoberta de que pessoas diferentes têm ideias particulares sobre como viver não os paralisou; ela aprofundou sua compreensão da humanidade e levou alguns às conversas mais satisfatórias que os seres humanos já tiveram sobre como a vida pode ser vivida.

Aristóteles, de forma similar, em vez de se desesperar com essas diferenças nos códigos morais, argumentou que embora regras, leis e costumes específicos variem de lugar para lugar, o que não varia é que em todos os lugares os seres humanos, por sua natureza, possuem uma inclinação para criar regras, leis e costumes. Colocando isso em termos modernos, parece que nós, seres humanos, somos, por algum tipo de dom biológico, tão intrinsecamente preocupados com a moralidade que criamos uma estrutura de leis e regras onde quer que estejamos. A ideia de que a vida humana pode ser livre de preocupações morais é fantasiosa.

Todos somos criadores de regras. E, dado que somos animais morais, qual deve ser o efeito de nosso relativismo moderno simplista sobre nós? Significa que nos limitamos ao fingirmos ser algo que não somos. É uma máscara, mas estranha, pois ela engana principalmente aquele que a veste. Risssssque com uma chave a Mercedes do professor relativista pós-moderno mais inteligente e verá como a máscara do relativismo (com sua pretensão de que não pode haver certo nem errado) e o manto da tolerância radical cairão rapidamente.

Uma vez que ainda não temos uma ética baseada na ciência moderna, Jordan não tenta desenvolver suas regras jogando tudo pelo ralo — não dispensa milhares de anos de sabedoria como mera superstição e ignora nossos maiores feitos morais. É muito melhor integrar o melhor do que estamos aprendendo agora com os livros que os seres humanos consideraram adequados preservar ao longo dos milênios e com as histórias que sobreviveram, contra todas as probabilidades, à tendência do tempo em apagá-las.

Ele está fazendo o que guias sensatos sempre fizeram: ele não alega que a sabedoria humana começa nele mesmo; mas, em vez disso, recorre primeiramente aos próprios guias. E embora os temas neste livro sejam sérios, Jordan é sempre muito divertido ao abordá-los com um toque de leveza, como os títulos dos capítulos demonstram. Ele não tem pretensões de ser exaustivo e, às vezes, os capítulos consistem em discussões abrangentes sobre a nossa psicologia, como ele a compreende.

Então, por que não intitular o livro de “diretrizes”, um termo muito mais descontraído, amigável e menos rígido do que “regras”?

Porque estas são, de fato, regras. E a principal regra é que você deve assumir a responsabilidade por sua própria vida. Ponto-final.

Alguém pode pensar que uma geração que ouviu incessantemente dos seus professores mais ligados à ideologia sobre direitos, direitos e mais direitos que lhe pertencem, oporia-se a ouvir que é melhor focar-se na aceitação das responsabilidades. No entanto, essa geração de muitos que foram criados em famílias pequenas por pais superprotetores em parquinhos com o chão macio e depois ensinados em universidades com “espaços seguros”, que não precisa ouvir coisas que não queira — educada para ter aversão ao risco —, tem agora, em seu meio, milhões que se sentem entorpecidos por essa subestimação da sua resiliência potencial e que abraçaram a mensagem de Jordan de que cada indivíduo tem uma responsabilidade fundamental a assumir; de que para viver uma vida plena é preciso primeiro colocar a própria casa em ordem e, apenas então, será possível sensatamente pretender assumir responsabilidades maiores. A extensão dessa reação frequentemente levou nós dois às lágrimas.

Às vezes essas regras são exigentes. Elas demandam que você execute um processo incremental que, ao longo do tempo, vai levá-lo a um novo limite. Isso exige, como falei, aventurar-se no desconhecido. Desenvolver-se além das barreiras do seu eu atual requer uma escolha cuidadosa de ideais e a busca deles: ideais que estão lá em cima, acima de você, superiores a você — e que nem sempre você terá certeza se pode alcançar.

Mas, se não é certo que nossos ideais são atingíveis, por que nos preocupar tentando alcançá-los, para começar? Porque se você não tentar fazê-lo é certo que nunca sentirá que sua vida tem um sentido.

E talvez porque, por mais desconhecido e estranho que possa parecer, na parte mais profunda de nossa psique, todos nós queremos ser julgados.

Dr. Norman Doidge, psiquiatra e autor de O cérebro que se transforma


[*] Alguns argumentam — equivocadamente — que Freud (várias vezes mencionado nestas páginas) contribuiu para nosso anseio atual por cultura, escolas e instituições “livres de julgamentos de valor”. É fato que ele recomendou que os psicanalistas fossem tolerantes, empáticos e não emitissem julgamentos críticos ou moralistas ao ouvir seus pacientes. Mas isso foi com a intenção exclusiva de ajudar os pacientes a se sentirem confortáveis ao serem totalmente honestos, e não menosprezar seus problemas. Isso encorajava a autorreflexão e lhes permitia explorar sentimentos, desejos e até impulsos antissociais inapropriados até então rechaçados. Isso também permitia — e essa foi a jogada de mestre — que descobrissem o próprio consciente inconsciente (e seus julgamentos), sua rigorosa autocrítica de seus “lapsos” e a própria culpa inconsciente, que frequentemente escondiam de si mesmos, mas que muitas vezes formavam a base de sua baixa autoestima, depressão e ansiedade. Na verdade, Freud demonstrou que somos, ao mesmo tempo, mais imorais e mais morais do que nos damos conta. Esse tipo de “ausência de juízo de valor”, na terapia, é uma técnica ou tática poderosa e libertadora — uma atitude ideal quando você quer entender melhor a si mesmo. Mas Freud nunca afirmou (como fazem alguns que pretendem que todas as culturas se tornem uma grande sessão de terapia em grupo) que alguém consegue viver a vida inteira sem nunca fazer julgamentos ou sem moralidade. De fato, seu argumento em A civilização e os seus descontentamentos é de que a civilização apenas surge quando algumas regras restritivas e a moralidade estão presentes.



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