Livro ‘Carpinejar’ por Fabrício Carpinejar

O retorno de Carpinejar para a poesia depois de cinco anos. Um livro sem título, sem prefácio, sem abas de apresentação, sem fiadores, sem notas biográficas sobre o autor, sem adornos: só poemas falando diretamente com o leitor, só com o essencial da vida. Despojado, livre, feito para o despojamento, contra as aparências e as fachadas, valorizando unicamente o que está escrito. Assim como uma carta, em que reina o segredo entre o remetente e o destinatário.
Capa comum : 128 páginas
ISBN-10 : 6558380072
ISBN-13 : 978-6558380078
Dimensões : 13.5 x 0.5 x 21 cm
Editora : Bertrand Brasil; 1ª edição (9 dezembro 2020)
Idioma: Português

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Leia trecho do livro

No cemitério,
cuidava para não pisar
nos mortos dos outros.

Não há como renunciar a mortalidade,
ainda que o pensamento seja infinito.
Assim como os demônios
jamais cortarão as suas unhas.
Assim como os anjos
jamais podarão as suas asas.

Os cabelos de muitos meses,
cultivados com vaidade,
serão arrastados com pressa
pela vassoura da barbearia.

Postos na pá sem distinção,
como mechas de um único homem.

No chão, nada mais nos pertence.

Judas: o Cristo de Cristo,
o crucificado do crucificado.

Desejo que a minha morte
coincida
com a minha morte.

Que eu não seja levado
para o fundo das mágoas
antes de ser levado
para o fundo da terra.

Que a minha morte
não seja mera confirmação,
banal espera.
Que o meu fim seja
realmente inédito.

O poeta é oportunista
das tragédias incompreensíveis.
Nomeia acidentes inomináveis,
chora com lágrimas emprestadas,
agarra-se às fatalidades e aos lutos.
Tem o seu caderninho de fiado,
a sua máquina de fiar comoções,
como quem apanha o grito no ar
e o converte em tecido do próprio sangue.

O poeta é o último carpideiro.
Psicografa vivos, coleciona mortos.
Só na alegria é analfabeto.


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