Livro ‘A Quietude é a Chave’ por Ryan Holiday

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Autor de O ego é seu inimigo revela em novo livro como descobrir o potencial e a paz que existem dentro de você. Grandes líderes, pensadores, artistas, atletas e visionários têm uma característica em comum: a capacidade de alcançar a quietude. Cínicos às vezes a confundem com ociosidade e indecisão, mas a verdade é que a quietude é a chave para ter autodomínio, disciplina e foco. É impossível avançar na vida sem ela. A quietude ajuda as pessoas a controlar impulsos, evitar distrações e ter grandes ideias. Sobretudo, permite que encontrem a felicidade e façam a coisa certa. Com base em vários dos maiores pensadores da história — de Confúcio a Sêneca, Marco Aurélio a Thich Nhat Hanh, John Stuart Mill a Nietzsche —, Holiday nos mostra o que é a quietude e como ela pode ser alcançada. Além disso, apresenta figuras célebres que tiraram dela o maior proveito, como Winston Churchill…

Páginas: 288 páginas; Editora: Intrínseca; Edição: 1 (20 de novembro de 2019); ISBN-10: 8551005766; ISBN-13: 978-8551005767; ASIN: B07ZG36K1Q

Leia trecho do livro

A luta é grande; a tarefa, divina — ganhar o conhecimento, a liberdade, a felicidade e a tranquilidade.

— EPITETO

PREFÁCIO

Era o final do século I d.C., e Lúcio Aneu Sêneca, o homem com maior influência de Roma, seu maior dramaturgo vivo e mais sábio filósofo, esforçava-se para trabalhar.

O problema era o barulho que vinha da rua, de estilhaçar os ouvidos e chacoalhar a alma.

Roma sempre fora uma cidade barulhenta — pense no ruído de obras em Nova York —, mas o quarteirão onde Sêneca estava hospedado era uma ensurdecedora cacofonia de perturbações. Atletas se exercitavam no ginásio sob seus aposentos, deixando cair grandes pesos. Um massagista socava as costas de homens velhos e gordos. Nadadores chapinhavam na água. Na entrada do prédio, um batedor de carteiras estava sendo preso e fazendo uma cena. Carruagens estrondeavam sobre as ruas de pedra, enquanto carpinteiros martelavam em oficinas e vendedores apregoavam mercadorias. Crianças riam e brincavam. Cães ladravam.

E, mais do que o ruído do lado de fora da janela, havia o simples fato de que a vida de Sêneca estava desmoronando. Era crise após crise após crise. No estrangeiro, a instabilidade ameaçava suas finanças. Ele estava envelhecendo e podia senti-lo. Tinha sido excluído da política por seus inimigos e, agora em conflito com Nero, poderia facilmente — por mero capricho do imperador — perder a cabeça.

Pela perspectiva de nossa própria vida ocupada, podemos supor que não era o ambiente ideal para se realizar coisa alguma. Desfavorável para se pensar, criar, escrever ou tomar boas decisões. O barulho e as distrações do império eram suficientes “para me fazer odiar minhas próprias faculdades auditivas”, disse Sêneca a um amigo.

Não à toa, este cenário intrigou admiradores por séculos. Como um homem cercado por adversidades e dificuldades consegue manter o controle e ainda encontrar a serenidade para raciocinar com clareza e escrever ensaios incisivos perfeitamente elaborados, alguns naquele mesmo aposento, que iriam chegar a milhões e milhões e tocar em verdades às quais poucos alcançariam?

“Fortaleci meus nervos contra todas aquelas coisas”, explicou Sêneca a esse mesmo amigo, referindo-se ao barulho. “Forço minha mente a se concentrar e impeço-a de se desviar para elementos alheios; tudo lá fora pode ser um tumulto, contanto que não haja nenhuma perturbação aqui dentro.”

Ah, não é isso o que todos desejamos? Que disciplina! Que concentração! Ser capaz de se desligar do ambiente, de exercer suas plenas capacidades a qualquer momento, em qualquer lugar, apesar de todas as dificuldades? Que maravilha isso seria! As coisas que seríamos capazes de realizar! Quão mais felizes seríamos!

Para Sêneca e os demais adeptos da filosofia estoica, se uma pessoa pudesse estabelecer paz dentro de si mesma — se pudesse alcançar apatheia, como a chamavam —, o mundo todo poderia estar caótico e ela ainda seria capaz de pensar bem, trabalhar bem e estar bem. “Podes estar seguro de que estás em paz contigo mesmo”, escreveu Sêneca, “quando nenhum ruído chega a ti, quando nenhuma palavra te arranca de ti, seja ela lisonja ou ameaça, ou meramente um som vazio zumbindo à tua volta com um barulho sem sentido.” Nesse estado, nada podia tocá-la (nem mesmo um imperador transtornado), nenhuma emoção podia perturbá-la, nenhuma ameaça podia interrompê-la e cada instante do momento presente pertenceria a eles.

É uma ideia poderosa que se torna ainda mais transcendente pelo fato extraordinário de que quase todas as outras filosofias do mundo antigo — por mais diferentes ou distantes que fossem — chegaram exatamente à mesma conclusão.

Fosse um aluno aos pés de Confúcio em 500 a.C., um discípulo do antigo filósofo grego Demócrito cem anos mais tarde, ou um ouvinte sentado no jardim de Epicuro uma geração depois, recebera um chamado igualmente enfático para essa imperturbabilidade, serenidade e tranquilidade.

A palavra budista para isso é upekkha. Os muçulmanos chamavam de aslama. Os hebreus, hishtavut. O segundo livro da Bhagavad Gita, o poema épico do guerreiro Arjuna, fala de samatvam, uma “uniformidade da mente — uma paz que é sempre a mesma”. Os gregos, euthymia e hesychia. Os epicuristas, ataraxia . Os cristãos, aequanimitas.

Em português: quietude.

Estar firme enquanto o mundo dá voltas. Agir sem exasperação. Ouvir somente o necessário. Ter a serenidade — exterior e interior — sempre ao alcance.

Ter acesso ao tao e ao logos. A Palavra. O Caminho.

Budismo. Estoicismo. Epicurismo. Cristianismo. Hinduísmo. É quase impossível encontrar uma escola filosófica ou religião que não venere essa paz interior — essa quietude — como o bem mais elevado, a chave para um desempenho de alto nível e uma vida feliz.

E, quando basicamente toda a sabedoria do mundo antigo concorda em algo, só um tolo se recusaria a ouvir.

A QUIETUDE É A CHAVE

INTRODUÇÃO

O chamado para a quietude chega silenciosamente. O mundo moderno não.

Além do estrépito, da tagarelice, da intriga e da rivalidade que eram familiares às pessoas do tempo de Sêneca, temos buzinas de carro, aparelhos de som, toques de celular, notificações de redes sociais, motosserras, aviões.

Nossos problemas pessoais e profissionais parecem igualmente esmagadores. Concorrentes se intrometem em nossa indústria. Nossas mesas vivem cheias de papéis, e nossos e-mails transbordam de mensagens. Estamos sempre acessíveis, assim discussões e novidades nunca estão muito distantes. Os noticiários nos bombardeiam com uma crise após a outra em todas as telas que possuímos — e são muitas. O desgaste do trabalho virou rotina e parece nunca cessar. Somos superalimentados e subnutridos. Superestimulados, sobrecarregados e solitários.

Quem tem o poder de parar? Quem tem tempo para pensar? Há alguém que não seja afetado pelo alarido e pelas disfunções de nosso tempo?

Embora a magnitude e a urgência de nosso esforço sejam modernas, elas estão enraizadas num problema atemporal. De fato, a história mostra que a capacidade de cultivar a quietude e acalmar a agitação dentro de nós, de desacelerar a mente, de compreender nossas emoções e de dominar nossos corpos sempre foi extremamente difícil. “Todos os problemas da humanidade”, disse Blaise Pascal em 1654, “derivam da incapacidade do homem em se manter tranquilo na solidão de um aposento.”

Ao longo da evolução, diferentes espécies, como pássaros e morcegos, desenvolveram adaptações semelhantes para sobreviver. O mesmo pode ser dito das escolas filosóficas separadas por vastos oceanos e séculos de distância. Elas desenvolveram caminhos únicos para o mesmo destino crítico: a quietude requerida para se tornar senhor da própria vida. Para sobreviver e prosperar em todo e qualquer ambiente, por mais barulhento ou agitado que seja.

Por essa razão, a ideia de quietude não é uma tolice da Nova Era nem domínio de monges e sábios, mas de fato desesperadamente necessária para todos nós, quer estejamos gerindo um fundo de cobertura ou jogando no Super Bowl, desbravando um novo campo de pesquisa ou formando uma família. É um caminho possível até a iluminação e a excelência, a grandeza e a felicidade, tanto ao desempenho quanto à presença, para todo tipo de pessoa.

A quietude é o que aponta a flecha do arqueiro. Ela inspira novas ideias. Aguça perspectivas e ilumina conexões. Desacelera a bola para que possamos acertá-la. Gera uma visão, ajuda-nos a resistir às paixões da multidão, cria espaço para a gratidão e o fascínio. A quietude nos permite perseverar. Triunfar. Ela é a chave que liberta as descobertas geniais e permite que nós, pessoas comuns, as compreendamos.

A promessa deste livro é a localização dessa chave… e um chamado não só para alcançar a quietude, mas para irradiá-la como uma estrela — como o Sol — para um mundo que precisa de luz mais do que nunca.

A chave para tudo

Nos primeiros dias da Guerra Civil Americana, havia uma centena de planos concorrentes sobre como assegurar a vitória e quem designar para fazê-lo. Da parte de cada general e a respeito de cada batalha, havia uma quantidade interminável de críticas e paixões perigosas — havia paranoia e medo, ego e arrogância, e muito pouco em matéria de esperança.

Há uma passagem maravilhosa desses primeiros momentos tensos, em que Abraham Lincoln falou para um grupo de generais e políticos em sua sala na Casa Branca. A maioria das pessoas naquela época acreditava que a guerra só poderia ser ganha por meio de batalhas enormes, inevitavelmente sangrentas, nas maiores cidades do país, como Richmond e Nova Orleans e talvez até Washington, D.C.

Lincoln, um homem que aprendeu estratégia militar sozinho por meio da leitura atenta de livros que tomava emprestados da Biblioteca do Congresso, abriu um mapa sobre uma grande mesa e apontou, em vez disso, para Vicksburg, no Mississippi, uma cidadezinha nos recônditos do território sulista. Era uma cidade fortificada no alto das ribanceiras do rio Mississippi, ocupada pelas tropas rebeldes mais resistentes. Ela não só controlava a navegação desse importante canal; também era um ponto de confluência para vários outros afluentes expressivos, bem como para linhas ferroviárias que abasteciam exércitos confederados e enormes fazendas de mão de obra escrava em todo o Sul.

“Vicksburg é a chave”, disse convicto ao grupo, um homem com a certeza de quem estudara tanto um assunto a ponto de conseguir expressá-lo nos termos mais simples. “A guerra nunca poderá ser encerrada até que essa chave esteja em nosso bolso.”

De fato, revelou-se que Lincoln acertara em cheio. Levaria anos, demandaria uma equanimidade e uma paciência incríveis, assim como um compromisso extremo com sua causa, mas a estratégia exposta naquela sala foi o que venceu a guerra e pôs fim à escravidão nos Estados Unidos para sempre. Todas as outras vitórias importantes na Guerra Civil — de Gettysburg até a Marcha ao Mar do general Sherman e a rendição de Lee — tornaram-se possíveis porque, por instrução de Lincoln, Ulysses S. Grant sitiou Vicksburg em 1863 e, ao tomar a cidade, dividiu o Sul em dois e passou a controlar aquele importante canal. De sua maneira ponderada e intuitiva, sem nenhuma pressa ou distração, Lincoln vislumbrou o que escapara a seus próprios assessores e até a seus inimigos, aferrando-se a tal ideia. Porque ele possuía a chave que abriu as portas para a vitória em meio ao rancor e à loucura de todos aqueles primeiros planos concorrentes.

Em nossas vidas, enfrentamos um sem-número de problemas e somos puxados em incontáveis direções por prioridades e crenças concorrentes. No caminho de tudo que esperamos realizar, no âmbito pessoal e no profissional, encontram-se obstáculos e inimigos. Martin Luther King Jr. observou que havia uma violenta guerra civil sendo travada dentro de cada pessoa — entre nossos bons e maus impulsos, entre nossas ambições e nossos princípios, entre nossos potenciais e a dificuldade de atingi-los.

Nessas batalhas, nessa guerra, a quietude é o rio e o entroncamento ferroviário dos quais tanta coisa depende. Ela é a chave…

  • Para pensar com clareza.
  • Para ver todo o tabuleiro de xadrez.
  • Para tomar decisões difíceis.
  • Para controlar nossas emoções.
  • Para identificar as metas corretas.
  • Para lidar com situações de alta pressão.
  • Para conservar relacionamentos.
  • Para formar bons hábitos.
  • Para ser produtivo.
  • Para ter um desempenho físico de alto nível.
  • Para se sentir realizado.
  • Para conquistar momentos de riso e alegria.

A quietude é a chave para, bem, quase tudo.

Para ser um pai ou mãe melhor, um artista melhor, um investidor melhor, um atleta melhor, um cientista melhor, um ser humano melhor. Para desbloquear todo o nosso potencial nesta vida.

Essa quietude pode ser sua

Qualquer pessoa que, concentrada profundamente, tenha sido acometida por um insight ou uma inspiração conhece a quietude. Qualquer pessoa que deu seu melhor em alguma coisa, sentiu orgulho de ter concluído a tarefa e de saber que não deixou absolutamente nada de lado — isso é quietude. Qualquer pessoa que deu um passo à frente sob o escrutínio da multidão e em seguida lançou mão de todas as suas horas de treino para aquela única apresentação — isso é quietude, ainda que envolva movimento ativo. Qualquer pessoa que passou tempo com alguém sábio e especial e o viu resolver em dois segundos o problema que nos atormentara por meses — quietude. Qualquer pessoa que caminhou sozinha à noite por uma rua silenciosa enquanto nevava, e observou como a luz descia suavemente sobre a neve, sentindo-se aquecida pela satisfação de estar viva — isso também é quietude.

Olhar para a página em branco diante de nós e observar as palavras se derramarem numa prosa perfeita, sem saber de onde elas vêm; permanecer sobre a fina areia branca olhando para o oceano, ou em algum outro lugar em meio à natureza, e sentir-se parte de algo maior que si mesmo; uma noite tranquila com um ente querido; a satisfação de ter feito uma boa ação para outra pessoa; sentarmo-nos sozinhos com nossos pensamentos e aproveitar pela primeira vez a capacidade de refletir sobre eles enquanto os pensamos. Quietude.

Sem dúvida há certa inefabilidade nisso de que estamos falando, na expressão da quietude que o poeta Rainer Maria Rilke descreveu como “cheia, completa” onde “todos os aleatórios e aproximados foram silenciados”.

“Embora falemos de alcançar o tao”, disse Lao Tsé certa vez, “não há de fato nada para obter.” Ou para tomar emprestada a resposta de um mestre para um discípulo que perguntou onde poderia encontrar o zen: “Estás à procura de um boi enquanto tu mesmo estás em cima dele.”

Você já vivenciou a quietude antes. Sentiu-a na sua alma. E quer mais dela.

Você precisa de mais dela.

É por isso que o objetivo deste livro é simplesmente mostrar como descobrir e fazer uso da quietude que já possuímos. Ele trata do cultivo e da conexão daquela força poderosa que nos foi dada ao nascer, aquela que se atrofiou em nossas agitadas vidas modernas. Este livro é uma tentativa de responder à questão premente de nosso tempo: se os momentos tranquilos são os melhores, e se tantas pessoas sábias e virtuosas cantaram seus louvores, por que eles são tão raros?

Bem, a resposta é que, embora tenhamos a predisposição natural à quietude, acessá-la não é fácil. Devemos prestar atenção de verdade para ouvi-la falando conosco. E responder ao chamado requer energia e maestria. “Manter a mente sossegada exige uma enorme disciplina que deve ser enfrentada com a maior dedicação da sua vida.”, o finado Garry Shandling lembrou a si mesmo em seu diário enquanto lutava para equilibrar fama, fortuna e problemas de saúde.

As páginas que se seguem contam as histórias e as estratégias de homens e mulheres que eram exatamente como você, que enfrentaram dificuldades como você enfrenta em meio ao ruído e às responsabilidades da vida, mas conseguiram ter sucesso ao encontrar e empregar a quietude. Você ouvirá relatos dos triunfos e provações de John F. Kennedy e Fred Rogers, Anne Frank e a rainha Vitória. Haverá histórias sobre Jesus e Tiger Woods, Sócrates, Napoleão, o compositor John Cage, Sadaharu Oh, Rosanne Cash, Dorothy Day, Buda, Leonardo da Vinci e Marco Aurélio.

Teremos o recurso de poesias e romances, textos filosóficos e pesquisas científicas. Faremos uma incursão por todas as escolas e todas as eras possíveis para encontrar estratégias que nos ajudem a orientar nossos pensamentos, processar nossas emoções e dominar nossos corpos. Para que possamos fazer menos… e fazer mais. Realizar mais, porém precisar menos disso. Sentirmo-nos melhor e sermos melhores ao mesmo tempo.

Para alcançar a quietude, precisaremos nos concentrar em três domínios, a trindade atemporal de mente, alma, corpo — a cabeça, a carne, o coração.

Em cada domínio, buscaremos reduzir os transtornos e perturbações que dificultam a quietude. Pôr termo à guerra que travamos com o mundo e dentro de nós mesmos, e estabelecer no lugar dela uma duradoura paz interior e exterior.

Você sabe que isso é o que você quer — o que você merece. Foi por isso que pegou este livro.

Respondamos então ao chamado juntos. Encontremos a quietude que buscamos — entremos nela.

fim da amostra…


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