A Vingança do Mafioso – Livro de Van Ianovack

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Trecho do livro

Nota da Autora

As minhas colegas de trabalho, Mari Cardoso e D.A. Lemoyne que aguentaram cada uma das minhas crises durante o processo de escrita desse livro. Obrigada pelo carinho.

PRÓLOGO | JUAN ÁNGEL

Culiacán — Sinaloa — México
Vinte e um anos atrás…

— Está sendo multo compassivo, Joaquin. É impossível que não ache estranha essa história de Gerónimo se casar com a filha do líder do cartel inimigo.

— Gerónimo quer uma aliança, Calino, apenas isso. Ramirez não tem filho homem e, desde a doença que lhe atingiu as bolas, não teve filho nenhum.

Meu pai exibia um sorriso por baixo do bigode grosso enquanto fumava seu charuto. Era sempre assim, eu tinha de ficar de fora desses assuntos, dizia que ainda era muito garoto. Eu já tinha 14 anos! Alonzo já tinha sua própria arma e era apenas um ano mais velho.

— O que eles estão dizendo?

— Se calar a boca a gente consegue ouvir, idiota. — Ximena era afilhada de meus pais e tinha como esporte implicar com Alonzo, filho de Calixto.

— É conversa de homens, você nem deveria estar aqui.

— Por acaso homens têm um idioma diferente só para eles? Cale a boca, “homem” que gagueja para falar com as chicas! “E-Es h-hermosa.

— Calem a boca!

Os dois! Cheguei mais perto para ouvir o que diziam.

— Calixto, Gerónimo é um Navarro, meu irmão mais velha.

— Que se ressente por sua ascensão.

— Ele não me trairia dessa forma. Deixe de desconfiança, hombre
.

Fazenda Guadalupe — Sinaloa — México
Um mês depois

Hoje era um dia de comemoração, dia de Jesús Malverde. Meu pai já havia banhado a cabeça da imagem com sua garrafa mais cara de whisky e agora tirava o chapéu de minha cabeça e depositava no santo.

As pessoas ao redor gritavam saudando meu pai e Jesus. Estávamos na fazenda e tinha muita gente ao redor. As pessoas adoravam ao meu pai. Ele construiu escolas e hospitais e ajudava famílias pobres também. Todos riam e cantavam.

Até que eu ouvi.

Primeiro um barulho alto, depois um mais baixo ao meu lado. Senti gotas de água molhando meu rosto, mas não estava chovendo. Passei minha mão onde senti molhar e, ao olhá-la, vi sangue nela. Meu pai segurava seu peito e seus olhos muito abertos me fitavam. Mais um barulho alto e depois um mais baixo ao meu lado.

—Padre…

Ele se ajoelhou.

— Deite, Juan. — Falou baixo, sua voz estava fraca, então fiz o que me pedia. Meu pai jogou parte do seu corpo sobre o meu. —Um homem não derrama seu próprio sangue. Se o faz, é um homem amaldiçoado, Juan.

Repetiu as palavras que meu avô sempre dizia a ele. Ele tossiu. Vi sua boca ficar vermelha.

— Pegue minha arma e vá para o forte. Atire em quem entrar no seu caminho. Não confie em ninguém. — Mais tosse com o gorgolejo de sangue. — Apenas em Calixto e sua mãe.

— Eu não quero…

— Vá! É uma ordem!

Suas mãos não seguravam mais minha blusa, estavam moles. Meu pai precisava de ajuda, olhei para o santo coberto de sangue e corri.

CAPITULO 1 | ALMA GODILHO

Las Vegas — Nevada — EUA

As luzes piscavam, as batidas eram sensuais e frequentes. A pista de dança seguia rodeada por mesas redondas contornadas por sofás de um couro marrom macio. Havia narguilés sobre algumas, carreiras de coca sobre as outras e muita bebida.

O lugar era requintado. De onde eu estava, podia enxergar duas ou três celebridades, até mesmo políticos. Estávamos no subsolo do Morrison Resort & Casíno, a passagem ao lugar me foi dada graças ao novo namorado de Rochelle, minha amiga no curso de Artes Plásticas na N.Y. Academy Art.

Rochelle era a típica menina que possuía o mundo aos seus pés, e tendo tudo ao seu alcance, precisava de doses de adrenalina para sentir-se viva, o que nem sempre culminava nas melhores escolhas. E eu sentia que Rúben, o homem atlético de 27 anos, com corpo coberto de tatuagens, cabelo baixo e olhos perspicazes, era uma delas. No fundo a entendia, ela tinha tudo sem ter nada.

Eu, pelo menos, ainda tinha minha Carmen. Minha amiga havia entendido que o fato de Rúben e eu sermos mexicanos nos traria proximidade, entretanto, ele lembrava a parte que gostaria de esquecer — não minha nacionalidade, mas o mundo no qual imaginei que ele vivia assim que o vi. O fato de ter acesso a um lugar como este era apenas uma confirmação.

Rúben era bonito, exibia um sorriso brincalhão com o típico charme latino. Na verdade, se enxergava a quilômetros de distância que era um sul-americano. O blusão colorido dobrado nas mangas, as correntes de ouro que adornavam seu peito e pulsos. As gírias típicas de minha terra natal completavam o pacote. Ele era um problema, dos grandes, e talvez fosse isso que atraía tanto Rochelle.

— Alma! Olhe isso! — Falou empolgada em meu ouvido, e eu apenas balancei a cabeça sorrindo. — Estou louca para conhecer o dono. Juan Ángel é o nome dele. Está solteiro… — Ela me cutucou ao mencionar a última palavra. O nome era latino e prendeu minha atenção, eu já o havia escutado antes. — Você deve conhecer! Ele já saiu em algumas revistas e é mexicano também. Nas fotos não se vê muito dele, parece ser bastante reservado.

— Chelle, eu já expliquei que o fato de sermos latinos não nos põe em um único grupo em que todos se conhecem.

— Eu sei, eu sei.

Chicas, fiquem aqui, avisarei a Juan que chegamos. Peçam o que quiserem, estará tudo por minha conta.

Estávamos no bar em forma de C que fechava o círculo em volta da pista junto com as mesas. Percebi quando Rúben passou duas balas a Rochelle.

— Divirtam-se. — Beijou-a, saindo em seguida.

Antes que as colocasse na boca, eu a impedi.

— Guarde isso, Chefie. Agora.

— Ah, Alma, viemos para nos divertir! — Redarguiu contrariada.

— Eu não quero bancar a amiga chata. Você já é grandinha, e sei que não é a primeira vez que usa uma dessas.

— Com certeza, não. — Sorriu torto erguendo a mão e quase colocando a droga na boca, impedi mais uma vez.

— Porém, estamos longe de casa, em Vegas, com um carinha que você conhece há dois meses. Olhe à sua volta! Nós não conhecemos ninguém aqui! Este lugar não é uma simples boate onde entra quem paga, a moeda aqui é outra.

— É mesmo? E qual é? — Disse petulante.

— O poder! Aqui é um lugar exclusivo, feito para pessoas com poder extravasarem sua verdadeira natureza, aquela que não pode ser fotografada em uma casa noturna comum.

— Está me dizendo que estamos em uma espécie de clube secreto?

Olhei para a mulher de vinte e um anos que acreditava que viver perigosamente era ir até uma boate cara, fazer uso de todos viver perigosamente era ir até uma boate cara, fazer uso de todos os tipos de drogas, fossem elas lícitas ou ilícitas, às escondidas com seus “amigos”.

— Quase isso…

O seu deslumbramento com o que descobria me fez perceber o quão distorcida era sua visão. Ela não sabia o que se escondia debaixo da aura de encantamento deste lugar. Não fazia ideia do quão perigoso era estar aqui. Pelo menos para mim. Notei que olhava fascinada para um ponto e acompanhei o seu olhar.

— Alma, aquele não é…

Inclinou a cabeça, sinalizando para o ator hollywoodiano, famoso por acumular Angels em seu currículo, recebendo sexo oral de um jovem enquanto inalava um pouco mais do pó branco. — Não olhe. — Disfarcei, segurando seu queixo.

— Não encare ninguém aqui. Não interessa se é o papa em alguma cadeira, apenas não olhe. Acredite, você não quer que alguém ache que está aqui para observar.

Rochelle me encarou como se asas ou chifres estivessem nascendo em mim. Ela era minha amiga, mas ainda assim não compartilhava com ela a parte obscura da minha vida. Sempre fui um pouco introspectiva, o preconceito de outras crianças ou de seus pais contribuiu para isso. Bastava ouvir meu nome e sobr-nome para que uma bolha se formasse à minha volta, quase como se existisse uma energia radioativa onde qualquer interação poderia contaminá-los. Aprendi a viver só, a gostar da minha companhia, a me perder entre livros e a valorizar a experiência dos mais velhos. Eu criei uma armadura invisível quando passei a enxergar que a toxicidade não vinha de mim.

— Achei que tivesse sido criada em um colégio católico desde os doze anos. Você parece conhecer bem lugares assim. É uma caixinha de surpresas, Alma Godilho.

De fato, aos doze fui enviada para um colégio católico em solo americano. A pedido de Carmen, Ramirez me enviou para um lugar onde aquele desgraçado não pudesse se aproximar. Ainda assim, nos anos em que passei próximo aos homens asquerosos, consegui perceber e entender como grande parte daquilo funcionava.

Eu não cresci cercada de palavras amorosas ou conforto, o único que tive veio de Carmén, minha babá e amiga de minha mãe, Graziela. Graziela Godilho, a jovem de 19 anos que se apaixonou pelo italiano pertencente à máfia inimiga e teve que lidar sozinha com as consequências dos seus atos — eu fui uma delas. Graziela em uma boa mãe, mas às vezes se perdia em fantasias criadas e alimentadas por um homem, meu pai.

— Não sou uma caixinha de surpresas, apenas ajo com cautela.

Fitou-me ponderando se acreditava no que eu dizia, mas pareceu desistir de qualquer elucidação e virou em direção ao barman.

— Está bem, vamos beber então. O que quer?


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