Com O fim da morte, a aclamada trilogia do autor chinês mais vendido e premiado da ficção científica chega ao fim. Iniciada com O problema dos três corpos e A floresta sombria , esta história se tornou best-sellerdo New York Times e do Wall Street Journal , e foi indicada por personalidades como Barack Obama e Mark Zuckerberg. Neste terceiro volume, meio século se passou desde a Batalha do Fim do Mundo, e a Terra conquistou um frágil acordo para manter os invasores trissolarianos encurralados. Com ele, uma nova era de paz e prosperidade tem início, e Luo Ji ― o homem que elaborou o acordo, agora conhecido como Portador da Espada ― tem que carregar nas costas a vida de duas civilizações...
Capa comum: 584 páginas Editora: Suma; Edição: 1 (12 de junho de 2019) Idioma: Português ISBN-10: 8556510744 ISBN-13: 978-8556510747 Dimensões do produto: 16 x 3,3 x 23 cm Peso de envio: 857 g
Leia trecho do livro
Os nomes chineses são escritos com o sobrenome na frente.
Ye Wenjie
Física cuja família foi perseguida durante a Revolução Cultural. Ela iniciou contato com Trissolaris e precipitou a Crise Trissolariana.
Yang Dong
Física; filha de Ye Wenjie.
Ding Yi
Pesquisador de física teórica e o primeiro ser humano a fazer contato com as gotas trissolarianas; namorado de Yang Dong.
Zhang Beihai
Oficial da Frota Asiática que roubou a nave Seleção Natural durante a Batalha do Fim dos Tempos e, assim, preservou uma centelha de esperança para a humanidade em sua hora mais sombria. Talvez um dos primeiros oficiais a compreender a natureza das batalhas sombrias.
Say
Secretária-geral da ONU durante a Crise Trissolariana.
Manuel Rey Diaz
Barreira; propôs o plano da bomba de hidrogênio gigante como defesa contra os trissolarianos.
Luo Ji
Barreira, descobridor da teoria da floresta sombria; criador da dissuasão por floresta sombria.
TRECHO EXTRAÍDO DO PREFÁCIO DE UM PASSADO ALÉM DO TEMPO
Creio que este relato devesse ser chamado de história; mas, como só posso contar com minhas lembranças, ele carece de rigor.
Nem mesmo seria certo chamá-lo de passado, pois os acontecimentos descritos nestas páginas não ocorreram no passado, não estão acontecendo agora nem acontecerão no futuro.
Não quero registrar os detalhes. Apenas um quadro, para um conto ou uma recordação do passado. Uma quantidade abundante de detalhes já foi preservada. Encerrados em garrafas flutuantes, espero que alcancem o novo universo e persistam nele.
Por isso escrevi apenas um quadro; algum dia, pode ser que com este quadro seja mais fácil preencher todas as lacunas. Evidentemente, essa tarefa não caberá a nós. Só espero que um dia ela chegue para alguém.
Lamento que esse dia não tenha acontecido no passado, não exista no presente nem vá existir no futuro.
Desloco o sol a oeste, e, à medida que o ângulo da luz se altera, as gotas de orvalho nas mudas do campo brilham como se incontáveis olhos se abrissem de repente. Sombreio o sol para que o crepúsculo chegue mais cedo; depois, fico olhando para a minha silhueta no horizonte distante, diante do pôr do sol.
PARTE I
MAIO DE 1453 E.C.
A MORTE DO MAGO
Parando para se recompor, Constantino XI afastou a pilha de mapas da defesa da cidade colocada à sua frente, apertou o roupão roxo em volta do corpo e esperou.
Foi bem a tempo: o tremor aconteceu no momento em que ele imaginou, um terremoto poderoso e violento que parecia brotar das profundezas da terra. Os candelabros de prata vibraram e ressoaram, e flocos de poeira que por mil anos haviam coberto o Grande Palácio se agitaram e caíram na direção das chamas das velas, onde explodiram em pequenas faíscas.
A cada três horas — o tempo necessário para os otomanos recarregarem uma das bombardas monstruosas projetadas pelo engenheiro Orban —, bolas de pedra de quinhentos quilos sacudiam os muros de Constantinopla. Aqueles eram os muros mais fortes do mundo: construídos por Teodósio II no século V, tinham sido reforçados e ampliados em várias ocasiões, e eram o principal motivo por que a corte de Bizâncio sobrevivera a tantos inimigos poderosos.
Mas cada golpe das imensas bolas de pedra cravava buracos na barreira, como mordidas de um gigante invisível. O imperador conseguia imaginar a cena: enquanto os destroços da explosão se espalhavam pelo ar, centenas de soldados e cidadãos corriam até a nova ferida nos muros como um exército de formigas valentes debaixo de um céu coberto de poeira. Preenchiam o vão com o que encontrassem: pedaços retirados de outras construções na cidade, sacas de linho cheias de terra, valiosos tapetes árabes… Ele até imaginava a nuvem de poeira, embebida da luz do pôr do sol, pairando lentamente sobre Constantinopla como um manto dourado.
Nas cinco semanas em que a cidade permanecera sitiada, tais tremores aconteciam sete vezes por dia, a intervalos tão regulares quanto as batidas de um relógio colossal. Era o tempo e o ritmo de outro mundo, o tempo dos pagãos. Comparado a esses tremores, o soar do relógio com a águia de duas cabeças ali no canto, uma representação do tempo da Cristandade, parecia débil.
Os tremores pararam. Depois de um tempo, e com esforço, o imperador Constantino voltou a pensar na realidade à sua frente. Fez um gesto para avisar ao guarda que estava pronto para receber o visitante.
Frantzes, um dos ministros de maior confiança do imperador, entrou seguido por uma figura esbelta e frágil.
— Esta é Helena. — Frantzes deu um passo para o lado, revelando a mulher.
O imperador olhou-a. As nobres de Constantinopla tinham preferência por roupas ornamentadas com elementos decorativos elaborados, mas as plebeias usavam trajes brancos de corte simples e indistinto que cobriam o corpo até os tornozelos. Essa Helena parecia uma mistura das duas coisas. Em vez de uma túnica bordada com filigranas de ouro, ela usava um vestido branco de plebeia coberto por um luxuoso manto; no entanto, em vez do roxo e do vermelho reservados para a nobreza, o manto era tingido de amarelo. Seu rosto era encantador e sensual, trazendo à memória a imagem de uma flor que preferiria apodrecer diante de olhares adoradores a definhar em solidão.
Uma prostituta, provavelmente bastante bem-sucedida.
Ela estava trêmula. Seus olhos permaneceram baixos, mas o imperador percebeu que traziam um brilho fervoroso, indicando um — Você alega ter poderes mágicos? — perguntou o imperador. Ele queria terminar aquilo o mais rápido possível. Frantzes costumava ser meticuloso. Dos cerca de oito mil soldados encarregados da defesa de Constantinopla naquele momento, só uma pequena parcela vinha do exército regulamentar, e cerca de dois mil eram mercenários genoveses. Frantzes tinha sido o responsável por recrutar o restante, aos poucos, entre a população da cidade. Embora o imperador não tivesse nenhum interesse especial por essa sua nova ideia, o histórico do competente ministro lhe garantira pelo menos uma audiência.
— Sim, posso matar o sultão. — A voz plácida de Helena tremulou como fios de seda soprados pela brisa.
Cinco dias antes, diante do palácio, ela exigira ver o imperador. Quando os guardas tentaram dispensá-la, a mulher apresentara um pequeno pacote que os abalou. Não sabiam ao certo o que estavam vendo, mas sabiam que não era algo que ela devesse ter. Em vez de a levarem ao imperador, eles a detiveram e interrogaram a fim de descobrir como havia conseguido o objeto. Sua confissão se confirmara, e então ela fora levada diante de Frantzes.
Frantzes sacou um pequeno embrulho, afastou o tecido de linho e depositou o conteúdo na mesa do imperador.
O olhar do soberano foi tão estupefato quanto o dos soldados cinco dias antes. Mas ele reconheceu imediatamente o que estava diante de seus olhos.
Mais de nove séculos antes, durante o reinado de Justiniano, o Grande, artesãos habilidosos tinham forjado dois cálices de ouro puro, cravejados de pedras preciosas e dotados de um brilho tão fulgurante tesouros em uma câmara secreta entre os alicerces da Hagia Sophia em 537 E.C., quando a grande igreja foi reconstruída.
O brilho do cálice que o imperador conhecia no Grande Palácio havia diminuído com o passar do tempo, mas o que se encontrava à sua frente agora brilhava tão intensamente que parecia ter sido forjado no dia anterior.
A princípio, ninguém acreditara na confissão de Helena, imaginando que ela provavelmente roubara o cálice de um de seus clientes ricos. Embora muitos conhecessem a câmara secreta sob a grande igreja, poucos sabiam sua localização exata. De resto, a câmara estava abrigada em meio a pedras gigantescas nas profundezas dos alicerces, sem acesso por nenhuma porta ou túnel. Devia ser impossível entrar lá sem um esforço de engenharia colossal.
Quatro dias antes, no entanto, o imperador ordenara que os artefatos preciosos da cidade fossem recolhidos para o caso de Constantinopla cair. Na verdade, foi uma medida desesperada, já que ele sabia muito bem que os turcos haviam bloqueado todas as rotas para a cidade, e não seria possível fugir com os tesouros.
Trinta homens precisaram trabalhar sem parar por três dias para entrar na câmara secreta, protegida por pedras tão imensas quanto as das paredes da Grande Pirâmide de Quéops. No meio da câmara havia um enorme sarcófago de pedra lacrado com doze argolas grossas de ferro entrecruzadas. Foi preciso mais um dia para serrar as argolas, até que cinco homens vigiados por muitos guardas finalmente conseguiram levantar a tampa do sarcófago.
Os olhares foram de espanto, não pelos tesouros e objetos sagrados que haviam passado quase mil anos escondidos, mas pelo cacho de uvas, ainda fresco, que tinha sido colocado no alto da pilha.
Cinco dias antes, Helena alegara ter deixado um cacho de uvas no sarcófago, e, tal como ela declarara, metade das uvas tinha sido comida, restando apenas sete.
Os trabalhadores conferiram os tesouros recuperados pela lista encontrada no interior da tampa do sarcófago; estava tudo ali, exceto o cálice. Se o objeto já não tivesse sido apresentado por Helena, e por sua vez ela não tivesse dado aquela declaração, todas as pessoas dentro da câmara teriam sido executadas, ainda que jurassem que a câmara secreta e o sarcófago estavam intactos.
— Como você o retirou? — perguntou o imperador.
O corpo de Helena estremeceu ainda mais. Aparentemente, a magia não lhe proporcionava uma sensação de segurança. Ela encarou o imperador com um olhar aterrorizado e se obrigou a dar uma resposta.
— Aqueles lugares… Eu vejo… Eu vejo… — ela penou para encontrar a palavra certa. — … abertos…
— Pode fazer uma demonstração? Tire algo de dentro de um recipiente fechado.
Helena balançou a cabeça, silenciada pelo pavor; ela lançou um olhar de súplica para Frantzes.
— Ela disse que só pode exercitar sua magia em um lugar específico — declarou Frantzes. — Mas não pode revelar o local, e ninguém pode segui-la. Caso contrário, a magia perderá o poder para sempre.
Helena fez um gesto afirmativo com a cabeça, vigorosamente.
— Na Europa, você já teria sido queimada na fogueira — disse o imperador.
Helena se jogou ao chão e abraçou os joelhos. A pequena silhueta parecia a de uma criança.
— Você sabe matar? — insistiu o imperador.
Mas Helena apenas tremia. Após pedidos persistentes de Frantzes, ela por fim assentiu.
— Certo — disse o imperador para Frantzes. —Teste-a.