Como em uma reunião de recortes de sua vida, um neto reconstitui as memórias que guarda do avô, seus ensinamentos e a maneira como ele provocava sua curiosidade na investigação dos sentimentos das pessoas, como um detetive de interiores. Este é um pequeno conto de Valter Hugo Mãe que, a partir da perspectiva infantil, examina o que seriam as mais belas coisas do mundo. Com ilustrações de Nino Cais, projeto gráfico e acabamento especial, este livro contém ainda uma nota do autor, em que conta um pouco da sua relação com seu avô. O texto de quarta-capa é assinado pela escritora e imortal da Academia Brasileira de Letras Ana Maria Machado e pelo escritor e dramaturgo Walcyr Carrasco.
Editora: Biblioteca Azul; 1ª edição (5 junho 2019); Páginas: 48 páginas; ISBN-13: 978-8525068323; ASIN: B07S9HJPB2
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Sumário
As mais belas coisas do mundo
Nota do autor
Sobre
o autor
Créditos
Este livro é dedicado aos meus avós,
António Alves e Maria dos Anjos Rodrigues,
Guilhermina Pimenta e Casimiro Lemos.
O meu avô sempre dizia que o melhor da vida haveria de ser ainda um mistério e que o importante era seguir procurando. Estar vivo é procurar, explicava. Quase usava lupas e binóculos, mapas e ferramentas de escavação, igual a um detective cheio de trabalho e talentos. Tinha o ar de um caçador de tesouros e, de todo o modo, os seus olhos reluziam de uma riqueza profunda. Percebíamos isso no seu abraço. Eu dizia: dentro do abraço do avô. Porque ele se tornava uma casa inteira e acolhia. Abraçar assim, talvez porque sou magro e ainda pequeno, é para mim um mistério tremendo.
Eu sei que ele queria chamar a atenção para a importância de aprender. Explicava que aprender é mudar de conduta, fazer melhor. Quem sabe melhor e continua a cometer o mesmo erro não aprendeu nada, apenas acedeu à informação. Ele pensava que dispomos de informação suficiente para termos uma conduta mais cuidada. Elogiava insistentemente o cuidado.
Era um detective de interiores, queria dizer, inspeccionava sobretudo sentimentos. Quando perguntei porquê, ele respondeu que só assim se fala verdadeiramente acerca da felicidade. Para estudar o coração das pessoas é preciso um cuidado cirúrgico.
Estava constantemente a pedir-me que prestasse atenção. Se prestares atenção vês corações e podes tirar medidas à felicidade. Como se houvesse uma fita métrica para isso.
Propunha que desvendasse adivinhas e dilemas. Propunha que desvendasse labirínticas lógicas. Prometia um novo livro ou um caderno com marcadores amarelos e vermelhos, os meus favoritos. Prometia que, se eu descobrisse cada resposta, me daria outro abraço ainda mais apertado e sempre mais amigo. Por melhores que fossem os cadernos, o orgulho que sentia naqueles abraços era a vitória, eles eram a fita-métrica da sua amizade por mim.
De cada vez que a nossa cabeça resolve um problema aumentamos de tamanho. Podemos chegar a ser gigantes, cheios de lonjuras por dentro, dimensões distintas, países inteiros de ideias e coisas imaginárias.
fim da amostra…