Nesse livro, Osho delineia os três estágios da liberdade. O primeiro é a “liberdade de”, a liberdade que conquistamos ao vencer restrições impostas por forças externas, como os nossos pais, a sociedade e a religião. O estágio seguinte é a “liberdade para”, uma liberdade positiva que sentimos quando criamos algo ou nos dedicamos a alguma coisa – um relacionamento satisfatório, por exemplo, ou uma visão artística ou humanitária. E, por último, existe a “liberdade pura”, o grau mais elevado e supremo de liberdade. Ela é muito mais do que ser a favor ou contra; é a liberdade de ser o que se é e de viver cada momento como se fosse único. Liberdade levará você a conhecer os grilhões que o amarram e mostrará o caminho para a verdadeira liberdade.
Editora: Cultrix; 1ª edição (14 junho 2005); Páginas: 176 páginas; ISBN-10: 8531608929; ISBN-13: 978-8531608926
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Prefácio
AS TRÊS DIMENSÕES DA LIBERDADE
“A Liberdade é um fenômeno tridimensional. A primeira dimensão é física. Você pode ser fisicamente escravizado; e durante milhares de anos o homem foi vendido em praça pública como qualquer mercadoria. Existiram escravos no mundo inteiro. A eles não se aplicavam os direitos humanos; eles não eram realmente aceitos como seres humanos. Eram considerados subumanos. E ainda se tratam as pessoas como se fossem subumanas. Na índia, existem os Sudras, os intocáveis. Grande parte da índia ainda vive na escravidão; ainda existem regiões do país onde as pessoas não podem receber educação, não podem escolher profissões diferentes das que determinou a tradição cinco mil anos atrás. Acredita-se que o mero ato de tocá-las torna você impuro; é preciso tomar banho imediatamente. Mesmo que você não toque a pessoa, só a sombra dela, mesmo assim você terá de tomar banho.
E no mundo inteiro o corpo da mulher não é considerado como se considera o do homem. Ela não é tão livre quanto ele. Na China, durante séculos o marido teve o direito de matar a mulher sem ser punido, pois a esposa era propriedade dele.”…
“Essa ideia de coletivo tem de ser exterminada; do contrário, de um jeito ou de outro continuaremos a sacrificar o indivíduo. Nós sacrificamos o indivíduo até em nome da religião, nas guerras religiosas. O muçulmano morre numa guerra religiosa sabendo que o seu paraíso está garantido. Ele ouvia do sacerdote, “Se morrer pelo Islã, você vai para o paraíso, gozar de todos os prazeres com os quais você nunca sonhou ou que nem sequer imaginou. E a pessoa que você matou também vai para o paraíso, porque ela foi morta por um muçulmano. É um privilégio para ela, por isso você não precisa se sentir culpado por ter matado um ser humano”. Os cristãos têm as cruzadas um jihad, uma guerra santa — e matam milhares de pessoas, queimam vivos seres humanos. Para quê? Por alguma coletividade — pelo Cristianismo, pelo Budismo, pelo Hinduísmo, pelo comunismo, pelo fascismo, qualquer coisa serve. Pegue qualquer palavra que represente uma coletividade e o indivíduo pode ser sacrificado.
Não há razão nem mesmo para a coletividade existir; bastam os indivíduos. E, se os indivíduos forem livres, forem psicologicamente livres, espiritualmente livres, então o coletivo será naturalmente livre do ponto de vista espiritual. O coletivo é composto de indivíduos, não o contrário. Dizem que o indivíduo é só uma parte do coletivo; isso não é verdade. O indivíduo não é só uma parte do coletivo; o coletivo é só uma palavra simbólica para uma reunião de indivíduos. Eles não são parte de nada; continuam independentes. Continuam organicamente independentes, não se tornam parte de um coletivo.”
Liberdade
“Aceite a responsabilidade por ser como é, com tudo o que você tem de bom e com tudo o que tem de ruim, com tudo o que tem de belo e com tudo o que não é belo. Nessa aceitação, ocorre uma transcendência e a pessoa se torna livre.”
A SOCIEDADE E A LIBERDADE DO INDIVIDUO – UMA ENTREVISTA
As regras sociais parecem ser uma necessidade básica dos seres humanos. No entanto, nenhuma sociedade jamais ajudou o ser humano a se realizar. Você poderia fazer a gentileza de explicar que tipo de relacionamento existe entre os indivíduos e a sociedade e como um pode ajudar o outro a evoluir?
Trata-se de uma pergunta extremamente complexa, mas muito importante também. Na existência como um todo, só o ser humano precisa de regras. Nenhum outro animal precisa. A primeira coisa que é preciso entender é o fato de que existe algo de artificial nas regras. O ser humano precisa de regras porque ele deixou de ser um animal, embora não tenha deixado de ser humano; ele está num limbo. Essa é a necessidade de se ter regras. Se fôssemos um animal, não haveria essa necessidade. Os animais vivem perfeitamente bem sem regras, constituições, leis, tribunais. Se o ser humano se tornar realmente humano — não só no nome, mas na realidade ele não precisará mais de regras. “
“No dia em que ocorreu a revolução, uma mulher, em Moscou, começou a andar no meio da rua. O policial disse, “Isso não está certo. Você não pode andar no meio da rua”. A mulher disse, “Agora somos livres”. Mesmo que você seja livre, terá de seguir as leis de transito; de outro modo, o tráfego ficará impossível. Se os carros e as pessoas andarem por onde quiserem, virarem onde quiserem, não respeitarem os faróis, as pessoas simplesmente se envolverão em acidentes, se matarão. Isso colocará o exército na rua, para fazer com que as pessoas respeitem a lei e sigam pela direita ou pela esquerda, dependendo do que for correto no país, mas ninguém pode andar no meio da rua. Então, sob a mira de um revólver, você terá de seguir as regras. Eu nunca me esqueço dessa mulher, ela é muito simbólica.
Liberdade não significa caos. Liberdade significa mais responsabilidade, tanta responsabilidade que ninguém precisa interferir na sua vida. Você não precisa ser incomodado, o governo não precisa interferir na sua vida, a polícia não precisa interferir na sua vida, as leis nada têm que ver com você você está simplesmente fora do mundo deles.
Esse é o meu ponto de vista se você realmente quer transformar a humanidade, cada indivíduo precisa começar a crescer por si mesmo. E, na verdade, a multidão não precisa de crescimento.
O crescimento é como uma criança se desenvolvendo no útero da mãe. Nenhuma multidão é necessária: a mãe só precisa ser cuidadosa. Um novo ser humano tem de nascer em você. Você tem de se tornar o útero de um novo ser humano. Ninguém saberá disso, e é melhor que ninguém saiba mesmo. Você simplesmente continua…”.
“Depois que os indivíduos estiverem crescendo e todas as comunidades estiverem crescendo lado a lado, a sociedade desaparecerá e, com a sociedade, todos os males que a sociedade criou.
Eu darei um exemplo.
Somente na China um salto extremamente revolucionário foi dado dois mil anos atrás. Naquela época, o paciente tinha de pagar o médico enquanto continuasse saudável. Se ficasse doente, o médico não precisava receber nenhum pagamento. Isso parece muito estranho. Nós pagamos o médico quando estamos doentes e ele nos deixa saudáveis novamente. Mas isso é perigoso, pois faz com que o médico fique dependente da sua doença. A doença se torna interessante para ele: quanto mais pessoas ficam doentes, mais o médico ganha. O seu maior interesse não é mais a saúde, mas a doença. Se todo mundo ficar saudável, o médico será o único que ficará doente!
Eles tiveram uma ideia revolucionária, prática: toda pessoa tem o seu médico e, contanto que essa pessoa fique saudável, o médico é pago todo mês. É dever do médico manter a pessoa saudável — e, naturalmente, é o que ele fará, pois é pago para isso. Se a pessoa cair doente, o médico perde dinheiro. Quando há epidemias, o médico vai à bancarrota. Nos dias de hoje, acontece justamente o contrário.”…
“Liberdade individual e autoridade de um lado e autoritarismo e ditadura do outro impulsionam a vida do homem e as suas inspirações. Por favor, comente sobre isso. “
“Trata-se do mesmo problema, da mesma pergunta, formulada de modo diferente. A sociedade á autoritária; a Igreja é autoritária; o sistema educacional é autoritário. Todos eles dizem, “Tudo o que dizemos está certo e você não precisa questionar nada. Basta que nos siga.
E existem problemas, no sistema educacional, por exemplo. Eu fui aluno, fui professor e sei que, na maior parte da vida, a pessoa é maltratada por pessoas autoritárias nas escolas, nas faculdades e nas universidades. “
“Em todo lugar, então acabando com cargos importantes e substituindo por computadores, pois os computadores são mais confiáveis. Eles só têm memória, não têm inteligência.
O ser humano tem uma certa inteligência, embora reprimida.
O homem que jogou bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki se fosse um computador, não haveria dúvida: no mesmo instante, exatamente no mesmo ponto, a bomba teria sido jogada e ele voltaria. Teria sido um ato simplesmente mecânico. Mas o homem que atirou a bomba, embora a sua inteligência pudesse ter sido destruída, teve de pensar duas vezes antes de cumprir a sua tarefa. Matar centenas de milhares de pessoas que eram absolutamente inocentes, que eram civis, não militares, que não tinham feito mal algum a ninguém seria correto?
Agora, em todos o lugares, todas as armas nucleares estão sob o controle dos computadores, não em mãos humanas. Os computadores travarão a terceira guerra mundial. Os seres humanos serão mortos — essa é outra questão. Os computadores não ligam a mínima se a humanidade sobreviverá ou se será extinta; isso não importa para eles. Mas eles farão um trabalho exato e eficiente como homem nenhum pode fazer. O homem pode hesitar em destruir toda a humanidade. Um pouco de inteligência, só um pouquinho é suficiente para suscitar a pergunta, “O que estou fazendo aqui?”
Todas as nossas instituições, as nossas religiões, são autoritárias. Elas não lhe dizem por quê: “Simplesmente faça isso porque está escrito no livro, porque Jesus disse isso”. Jesus não deu nem sequer uma explicação do porquê aquilo tinha de ser feito; ele não deu nenhum embasamento racional para nenhuma das suas doutrinas. Nem Moisés fez isso, nem Krishna.”
O PROBLEMA DE DEUS
Existe uma frase profética de Friedrich Nietzsche: “Deus está morto e o homem está livre”. Ele teve uma grande clareza de visão. Pouquíssimas pessoas são capazes de entender a profundidade do que ele disse. Trata-se de um marco na história da consciência.
Se existir um Deus, o homem nunca pode ser livre — essa é uma impossibilidade. Deus e a liberdade do homem não podem coexistir, pois o próprio significado de Deus é que ele é o criador; então nós somos reduzidos a marionetes. E, se ele pode nos criar, então pode nos destruir a qualquer momento. Ele nunca pediu para nos criar — ele não é obrigado a pedir para nos destruir. Ele nos cria ou nos destrói por puro capricho. Como você pode ser livre? Você não é livre nem para existir. Nem mesmo para nascer você tem liberdade, nem mesmo para morrer você a tem — e entre essas duas escravidões, você acha que a sua vida pode ser livre?
Deus tem de morrer para que a liberdade do ser humano seja resgatada.
A escolha é clara; não há como entrar num acordo. Com Deus, o homem continuará sendo um escravo e a liberdade, uma palavra vazia. Apenas sem Deus a liberdade começa a fazer sentido.
Mas a afirmação de Nietzsche é só uma parte; ninguém tentou concluí-la. Ela parece completa, mas as aparências enganam.”
A IDEIA DE SINA E DE DESTINO
Não existe nem sina nem destino. Você está apenas tentando jogar a sua responsabilidade sobre algo que não existe. E, como não existe, não pode reagir contra você; não pode dizer, “Por favor, não jogue a responsabilidade em mim!”
Deus é silencioso, você pode jogar qualquer coisa nas costas dele — não há nenhuma resistência, porque não há ninguém para resistir. Com a sina acontece o mesmo. Você falha no amor, falha em outras questões. Dói o fato de você ter falhado. Você precisa de algum tipo de ungüento para o seu coração ferido. A “sina” é um belo ungüento e é de graça. Você não precisa pagar por ele. Você pode dizer, “Que posso fazer? — é o destino”. Sucesso ou fracasso, riqueza ou pobreza, doença ou saúde, vida ou morte — tudo está nas mãos de um poder desconhecido chamado destino. “Eu estou fazendo o melhor que posso, mesmo assim, continuo não conseguindo. Estou seguindo todos os princípios morais que me recomendaram, mesmo assim sou pobre. Vejo todos os tipos de pessoas imorais ficando ricas, subindo cada vez mais, ficando famosas. É o destino.”
Isso lhe dá conforto. Dá a você conforto por não estar alcançando os seus objetivos. Isso também lhe dá o conforto de saber que, se os outros conseguiram, não há nada de mais nisso; foi só porque o destino quis assim. Por um lado, você não precisa se sentir inferior; por outro, a sua inveja gosta da ideia de que a pessoa bem-sucedida é bem-sucedida porque o destino quis assim: “Não tem nada a ver com a pessoa, ela não é superior a mim”. “
“Aristóteles e era tão contra Aristóteles quanto eu, por isso tenho uma certa amizade com Diógenes.
Aristóteles definiu o homem como um animal sem penas que anda sobre duas pernas. O que Diógenes fez? Ele capturou um animal — e existem muitos animais que andam sobre duas pernas, mas que têm penas também, que podem voar. Diógenes capturou um pavão, tirou-lhe todas as penas — e mandou o pavão para Aristóteles com a mensagem: “Aceite, por gentileza, este ser humano de presente.
Esse homem, Diógenes, costumava andar nu porque, ele dizia, “O homem nasceu nu e fica mais fraco porque é protegido pelas roupas”. Em nenhuma parte do planeta, os animais usam roupas — com exceção de alguns cães na Inglaterra. A Inglaterra é um país misterioso. Os cães usam roupas porque um cão nu é anticristão. Você ficará surpreso ao saber que, na Inglaterra vitoriana, toda cadeira de quatro pernas tinha as pernas cobertas, porque eram pernas e não ficava bem olhar para pernas nuas.
Diógenes vivia nu. Ele era um homem forte. Quatro sujeitos que estavam no negócio de raptar pessoas para vendê-las como escravas pensaram, “Essa é uma boa captura, esse homem pode nos render um bom dinheiro. Já vendemos muitos escravos, mas nenhum deles era tão forte, tão belo, tão jovem. Podemos conseguir o preço que quisermos e haverá uma grande disputa no mercado quando colocarmos esse homem no pedestal para venda”. “Mas”, eles pensaram, “é preciso mais de quatro homens para capturá-lo. Ele sozinho pode matar a todos nós.”
Diógenes ouviu o que diziam a respeito dele. Ele estava sentado nas margens do rio, só apreciando a brisa fresca da noite, sob uma árvore e, atrás da árvore, esses quatro planejavam o que fariam. Ele disse, “Não se preocupem. Venham aqui! Não tenham medo de que eu vá matar vocês, eu nunca mataria coisa alguma.”