Nesse livro, o consagrado psicólogo Dan Ariely uniu forças com o comediante Jeff Kreisler para revelar como as emoções dominam nossa maneira de lidar com o dinheiro e para derrubar as mais consagradas – e equivocadas – premissas das finanças pessoais. Ao explorar diversas questões do dia a dia – dos gastos com o cartão de crédito às armadilhas do orçamento doméstico –, eles mostram como driblar nossos instintos para não cair nas tentações, para economizar, fazer escolhas melhores e gastar com inteligência. Intercalando lições de ordem prática com conselhos bem-humorados, Ariely e Kreisler lançam luz sobre os medos e os desejos inconscientes que costumam estar por trás de nossos hábitos muitas vezes desastrados de consumo. Fascinante e divertido, esse livro oferece as ferramentas para você transformar o dinheiro em um poderoso aliado para uma vida mais próspera, tranquila e prazerosa.
Editora: Editora Sextante (23 maio 2019); Páginas: 342 páginas; ISBN-10: 6555647035; ISBN-13: 978-6555647037; ASIN: B07S93Y1T4
Leia trecho do livro
DESCUBRA COMO AS EMOÇÕES INFLUENCIAM NOSSAS ESCOLHAS FINANCEIRAS E APRENDA A TOMAR DECISÕES MAIS INTELIGENTES.
AO DINHEIRO
Pelas coisas maravilhosas que você faz para nós, pelas coisas terríveis que causa em nossa vida e por tudo mais que nos traz.
Introdução
Em 1975, Bob Eubanks apresentou um programa de auditório chamado The Diamond Head Game, em referência ao famoso vulcão de mesmo nome situado no Havaí. O programa trazia uma rodada de prêmios bem peculiar chamada “O Vulcão de Dinheiro”. Os participantes entravam numa cabine de vidro que logo se transformava em um túnel de vento forte, com dinheiro voando por todos os lados. As notas rodopiavam e tremulavam pela cabine enquanto os participantes se esforçavam para agarrar o maior número que conseguissem antes que o tempo se esgotasse. Era divertidíssimo: durante 15 segundos ficava claro que nada no mundo era mais importante do que o dinheiro.
Até certo ponto, estamos todos nessa cabine. Vivemos dentro do Vulcão de Dinheiro de uma forma menos óbvia, mas a verdade é que temos jogado esse jogo por muitos anos, de inúmeras maneiras. A maioria de nós pensa em dinheiro quase o tempo todo: quanto temos, de quanto precisamos, como conseguir mais, como manter o que temos e quanto nossos vizinhos, amigos e colegas recebem, gastam e guardam. Extravagâncias, contas a pagar, oportunidades, liberdade, estresse: o dinheiro afeta todos os aspectos da vida moderna, dos orçamentos familiares à política nacional, das listas de compras às contas de poupança e outros tipos de aplicação.
E há algo novo em que se pensar a cada dia, à medida que o mundo financeiro torna-se mais complexo, que contratamos diferentes tipos de financiamento, empréstimos e seguros e que vivemos mais, passando mais tempo aposentados e nos defrontando com tecnologias financeiras e investimentos cada vez mais complicados.
Pensar muito sobre dinheiro seria ótimo se isso nos ajudasse a tomar decisões melhores. Mas não é o que acontece. A verdade é que tomar más decisões nessa área é algo próprio da natureza humana. Somos Ph.D.s em bagunçar nossas vidas financeiras.
Dito isso, considere as seguintes perguntas:
- Você acha que faz diferença usar cartão de crédito ou dinheiro para pagar suas compras? Afinal, você vai gastar o mesmo valor, certo? Na verdade, estudos mostram que estamos dispostos a gastar mais quando usamos cartão de crédito. O uso do cartão aumenta a nossa tendência a subestimar ou esquecer quanto gastamos.
- Para você, qual seria o melhor negócio: um chaveiro que abre uma porta em dois minutos e cobra R$ 100,00 ou um que leva uma hora e cobra os mesmos R$ 100,00? A maioria das pessoas acha que aquele que leva mais tempo é o melhor, porque trabalha com mais cuidado e custa menos por hora. Mas e se o chaveiro que levou mais tempo teve que tentar várias vezes, quebrou um monte de peças ou ferramentas antes de conseguir e, por isso, acabou cobrando R$ 120,00? Surpreendentemente, a maioria das pessoas ainda acha que usar esse chaveiro é mais vantajoso do que aquele mais rápido, embora tudo que ele faça seja gastar uma hora do nosso tempo com sua incompetência.
- Você acha que estamos poupando o suficiente para quando nos aposentarmos? Temos noção, ainda que vagamente, de quando vamos parar de trabalhar, de quanto teremos recebido e poupado, de quanto nossos investimentos terão rendido e quais serão nossas despesas para o número exato de anos que viveremos depois? Não? Ficamos tão assustados com o planejamento da aposentadoria que, de modo geral, poupamos menos de 10% do que precisamos, não temos confiança de que estejamos guardando o bastante e acreditamos que vamos ter que trabalhar até os 80 anos, ainda que nossa expectativa de vida seja menor. Bem, aí está um jeito de reduzir as despesas na aposentadoria: nunca se aposente.
- Você acha que somos espertos quando o assunto é o gerenciamento do nosso tempo? Ou na verdade passamos mais tempo correndo atrás de um posto de gasolina que cobre alguns centavos a menos do que tentando achar um financiamento imobiliário com taxas mais baixas?
Pensar em dinheiro não nos ajuda a tomar boas decisões financeiras e, além disso, o simples fato de pensar em dinheiro nos modifica de modo profundo e inquietante. Nos Estados Unidos, o dinheiro é o maior motivo de divórcios e a causa número um de estresse. No Brasil, o dinheiro também é uma das principais causas de estresse, juntamente com o medo da violência e do desemprego. É comprovado que somos piores em resolver qualquer tipo de problema quando estamos passando por complicações financeiras.4 Uma série de estudos mostrou que os mais ricos, particularmente quando lembrados de que são ricos, costumam agir de forma menos ética do que as pessoas com renda mediana, ao passo que outro estudo constatou que, só de verem imagens de dinheiro, as pessoas ficam mais propensas a roubar do lugar onde trabalham, a contratar um colega de caráter duvidoso ou a mentir para obter vantagem. Pensar em dinheiro literalmente mexe com a nossa cabeça.
Dada a importância do dinheiro – para nossa vida, para a economia e para a sociedade – e dados os desafios de pensar sobre ele de forma racional, o que podemos fazer para melhorar nossa forma de pensar? A resposta padrão para essa pergunta costuma ser “educação financeira”. Infelizmente, lições de educação financeira, à semelhança daquelas sobre como comprar um carro ou obter um financiamento imobiliário, tendem a ser esquecidas rapidamente, com impacto de longo prazo quase nulo sobre as nossas ações.
Assim sendo, este livro não tem a intenção de “educar financeiramente” ou lhe dizer o que fazer com seu dinheiro cada vez que abrir a carteira. Em vez disso, vamos explorar alguns dos erros mais comuns que cometemos em relação ao dinheiro e, mais importante, por que os cometemos. Dessa forma, quando enfrentarmos nossa próxima decisão financeira, talvez sejamos mais capazes de entender as forças em jogo e de fazer escolhas melhores. Ou ao menos de fazer escolhas com base em mais informação.
Vamos lhe apresentar algumas pessoas e compartilhar as histórias delas. Mostraremos o que elas fizeram em determinadas situações. Depois explicaremos o que a ciência nos diz sobre as experiências de cada uma. Algumas dessas histórias são verídicas; outras são, como nos filmes, “baseadas em fatos reais”. Algumas dessas pessoas tomam atitudes razoáveis. Outras são bem menos espertas. Elas podem se enquadrar em alguns estereótipos porque vamos enfatizar, até exagerar, algumas dessas características para realçar certos comportamentos comuns. Esperamos que todos reconheçam a humanidade, os erros e a promessa em cada uma dessas histórias e entendam como elas se refletem em nossa vida.
Este livro revela como pensamos sobre dinheiro e os erros que cometemos ao pensar nele. Ele discute as lacunas entre a nossa compreensão consciente de como o dinheiro funciona, como realmente o usamos e como deveríamos pensar sobre ele antes de usá-lo. E apresenta os desafios que enfrentamos ao raciocinar sobre dinheiro e os erros mais comuns que cometemos ao gastá-lo.
Você saberá gastar o seu dinheiro com mais sabedoria depois de ler este livro? Com certeza. Talvez. Um pouco. Provavelmente.
No mínimo, acreditamos que revelar as forças complexas por trás das decisões financeiras pode melhorar a relação com as nossas finanças. Acreditamos também que, entendendo o impacto do dinheiro sobre nosso pensamento, seremos capazes de tomar melhores decisões não financeiras. Por quê? Porque nossas decisões em relação a dinheiro envolvem mais do que apenas dinheiro. As mesmas forças que moldam nossa realidade nessa área também influenciam a maneira como valorizamos o que é importante no resto de nossa vida: como passamos nosso tempo, gerenciamos nossa carreira, aceitamos outras pessoas, desenvolvemos relacionamentos, ficamos felizes e, enfim, como entendemos o mundo à nossa volta.
Em termos mais simples, este livro vai fazer com que tudo melhore. Não é um excelente custo-benefício?
PARTE I
O QUE É O DINHEIRO?
George Jones precisa relaxar. O trabalho é estressante, as crianças estão brigando o tempo todo e o dinheiro anda apertado. Assim, numa viagem a trabalho para Las Vegas, ele vai direto para um cassino. Estaciona, de graça, no final de uma rua movimentada e entra distraidamente, de cabeça baixa, no universo paralelo do cassino.
O som o desperta do seu estupor: música dos anos 1980 e barulho de caixas registradoras misturados ao tilintar de moedas e ao retinir de mil máquinas caça-níqueis. Ele não sabe há quanto tempo está no cassino. Não há relógios, mas, a julgar pelas pessoas mais velhas curvadas em frente às máquinas, pode já ter sido uma vida inteira. Foram provavelmente cinco minutos. Talvez não esteja longe da entrada, mas ele também não consegue ver a entrada… ou a saída… ou portas, janelas, corredores ou quaisquer outros meios de se mandar dali. Apenas luzes cintilantes, garçonetes em trajes sumários levando bebidas e pessoas que estão ou em êxtase ou sofrendo… mas nunca nada entre essas duas situações.
Máquinas caça-níqueis? Claro, por que não tentar? Na primeira tentativa, por pouco não ganha uma bolada. Assim, ele passa 15 minutos colocando mais notas na máquina para recuperar o dinheiro perdido. Ele não consegue ganhar, mas quase acerta algumas vezes.
Depois que a carteira fica livre das notas de valor mais baixo, George saca US$ 200,00 num caixa eletrônico – sem se preocupar com a tarifa de US$ 3,50 porque vai recuperá-la na primeira mão vencedora – e senta-se à mesa de blackjack, também conhecido como Vinte e Um. Em troca de 10 notas novinhas de US$ 20,00, a crupiê lhe dá uma pilha brilhante de fichas de plástico vermelhas. Elas ostentam uma foto do cassino, com algumas penas, um arco e também uma tenda indígena. Cada uma vale US$ 5,00, mas elas não se parecem nada com dinheiro. Parecem brinquedos. George as manuseia, brinca com elas na mesa, observa as pilhas dos outros oscilarem e cobiça o estoque multicolorido da crupiê.
Uma garçonete bonita e simpática leva algumas bebidas de cortesia para George. De graça! Que ótimo negócio! Ele já está levando vantagem. Então dá de gorjeta para ela uma pequena ficha de plástico. George aposta. George se diverte.
George sente um pouco do inverso da diversão. Ele ganha um pouco, perde mais. Às vezes, quando as chances parecem estar a seu favor, dobra a aposta, arriscando quatro fichas em vez de duas, seis em vez de três. Acaba perdendo os US$ 200,00. De algum modo evita repetir as façanhas dos seus colegas de mesa de acumularem pilhas gigantes de fichas num minuto para logo depois estenderem bolos de notas para comprar mais um monte de fichas novas. Alguns deles estão de bom humor, outros ficam irados quando erram a mão, mas nenhum parece do tipo que pode se dar ao luxo de perder US$ 500,00 ou US$ 1.000,00 em uma hora. Mesmo assim, isso se repete, de novo e de novo e de novo.
Naquela mesma manhã, George tinha deixado de tomar café na lanchonete porque poderia economizar US$ 4,00 usando a cafeteira do quarto do hotel. Mas na mesma noite ele se desfez de 40 fichas de US$ 5,00 sem pestanejar. Sério, deu até uma ficha à garçonete por ser tão legal!
O QUE ESTÁ ACONTECENDO AQUI?
Os cassinos aperfeiçoaram a arte de tomar nosso dinheiro, portanto é um pouco injusto da nossa parte começar por esse exemplo. Mesmo assim, a experiência de George nos dá um vislumbre rápido e claro de alguns dos erros psicológicos que cometemos, mesmo em ambientes menos maliciosos.
Eis alguns fatores em jogo sob as luzes deslumbrantes do salão do cassino. Examinaremos cada um deles com mais detalhes nos capítulos seguintes:
Contabilidade mental. George está preocupado com as finanças dele – como mostra sua decisão de economizar dinheiro no café da manhã –, mas gasta tranquilamente US$ 200,00 no cassino. Essa contradição ocorre, em parte, porque ele coloca aquele cassino em uma “conta mental” diferente daquela do café. Ao pegar seu dinheiro e converter em fichas de plástico, abre um fundo de “entretenimento”, enquanto seu outro gasto é considerado algo como “despesas diárias”. Esse truque o ajuda a se sentir de modo diferente em relação a cada um dos dois tipos de despesa, mas ambos os modos fazem realmente parte de uma só conta: “o dinheiro do George”.
O preço do que é grátis. George fica empolgado por estacionar de graça e ganhar bebidas de cortesia. Certo, ele não está pagando por isso diretamente, mas essas coisas “grátis” deixam George de bom humor no cassino e prejudicam seu julgamento. Esses itens “gratuitos” na verdade caracterizam um alto preço a se pagar. Existe um ditado que diz que as melhores coisas da vida são de graça. Pode ser. Mas o que parece grátis muitas vezes acaba nos custando caro de formas que a gente nem imagina.
Relatividade. Aquela gorjeta de US$ 5,00 que George deu à garçonete – por uma bebida grátis – e a tarifa de US$ 3,50 no caixa eletrônico não parecem altas comparadas com as pilhas de fichas que o cercam na mesa de blackjack ou os US$ 200,00 que ele sacou no caixa eletrônico. Aquelas são quantias relativamente baixas, e por pensar nelas em termos relativos, fica mais fácil para ele ir em frente e gastar. No início do dia, porém, os US$ 4,00 do cafezinho, comparados com o café grátis no quarto do hotel, pareciam um gasto relativamente alto.
Expectativas. Cercado pelos sinais e sons do dinheiro – máquinas caça-níqueis, luzes brilhantes, símbolos de dólar espalhados pelo ambiente –, George imagina que é James Bond, o agente 007, charmoso e fatal, vencendo contra todas as chances os supervilões à mesa de jogo.
Autocontrole. Jogar, é claro, é um problema sério – um vício até – para muitas pessoas. Para nosso objetivo neste livro, porém, podemos simplesmente dizer que George, influenciado pelo estresse e pelo ambiente, pelos funcionários simpáticos e pelas oportunidades “fáceis”, sente dificuldade em resistir à tentação de apostar por impulso em vez de pensar nos benefícios a longo prazo de dispor desses US$ 200,00 a mais quando se aposentar.
Todas essas situações podem parecer exclusivas de um cassino, mas na verdade o mundo “real” é bem mais parecido com um cassino do que gostaríamos de admitir: afinal, em 2016, os Estados Unidos elegeram um dono de cassino como presidente. Embora nem todos aliviem o estresse apostando, enfrentamos desafios de tomada de decisões semelhantes em termos de contabilidade mental, gratuidade, dor do pagamento, relatividade, autocontrole e mais. Os erros que George comete no cassino acontecem em muitos aspectos do nosso cotidiano. Esses equívocos estão fundamentalmente enraizados em nossa má interpretação básica da natureza do dinheiro.
Embora a maioria de nós acredite ter uma noção razoável sobre esse assunto, a verdade surpreendente é que não entendemos o que o dinheiro é e o que faz a nosso favor – e, mais surpreendentemente, o que ele causa em nós.