Livro ‘A Inconveniente Loja de Conveniência 2’ por Kim Ho-yeon

A inconveniente loja de conveniência 2, de Kim Ho-yeon, traz a história de Seon-suk Oh, que busca um novo atendente acolhedor em meio à pandemia, destacando empatia e resiliência.

A inconveniente loja de conveniência 2, de Kim Ho-yeon, é uma sequência reconfortante que explora o poder da gentileza e da resiliência em meio à pandemia de Covid-19. Cerca de um ano e meio após a saída de Dok-go, a gerente Seon-suk Oh precisa preencher a vaga do turno da noite enquanto lida com o novo chefe, Min-shik Kang, que deseja vender a loja. Persistente, a senhora Oh acredita que a Always é mais do que uma simples loja, oferecendo consolo a seus frequentadores. Geun-bae Hwang, ou Geum-bo Hong, surge como o atendente ideal: acolhedor e divertido, ele aos poucos conquista a todos. O livro mistura personagens novos e antigos, evidenciando dores e celebrações comuns em tempos difíceis, com a sensibilidade de Kim Ho-yeon em criar uma narrativa encorajadora e calorosa sobre empatia.

Editora: ‎Bertrand Brasil; 1ª edição (14 outubro 2024); Páginas: ‎336 páginas; ISBN-13: 978-6558382935; ASIN: B0DFMWBRMW

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Biografia do autor: Kim Ho-yeon, nascido em 1974 na Coreia do Sul, é escritor, roteirista e ilustrador premiado. Desde seu romance de estreia Mangwon-dong Brothers, ganhou prêmios como o World Literary Award (2013) e o Book of the Year Award (Yes24, 2022). Seu livro A inconveniente loja de conveniência foi o mais vendido na Coreia do Sul em 2022, com mais de 1 milhão de cópias. Instagram @mangwonbrothers

Parte I

A gerente Seon-suk Oh

As pessoas não paravam de encarar Seon-suk, e foi então que ela percebeu que tinha saído para trabalhar sem máscara. Voltou correndo para casa e pegou a máscara, que estava pendurada em um gancho ao lado da porta. Mesmo após tê-la deixado ali para não esquecer, Seon-suk vivia saindo de casa sem ela… Não conseguia se habituar à bendita máscara, não importava quantas vezes a usasse.

Ela também não conseguia se adaptar de jeito nenhum à pandemia de Covid-19. Apesar de serem animais adaptáveis, dessa vez não havia nada que os humanos pudessem fazer; a vacina parecia pouco confiável e os tratamentos eram incertos. Fosse pelo fato de ser um vírus mutante ou não, infecções de nomes estranhos continuavam a surgir após a vacinação e, com as pessoas sem saberem como agir, a ordem era tomar uma vacina diferente. Pensar que talvez fosse necessário tomar uma vacina de outra marca, que tinha efeitos colaterais e era um risco para os idosos, causava ainda mais angústia. Em um mundo estremecido pelo vírus, cidadãos comuns que nem Seon-suk não conseguiam dançar conforme a música e ficavam perdidos, sem saber o que fazer.

A caminhada da sua casa até a loja de conveniência era de pouco mais de quinhentos metros, e mesmo assim ela ficou sem fôlego. Em pleno verão, era difícil até para respirar usando máscara no calor que fazia e, para Seon-suk, só o ato de sair de casa já era inconveniente. Ela morria de inveja de Yepi e Kami, seus cachorrinhos, que podiam andar por aí sem máscara. Mas, de qualquer forma, naquele dia ela precisaria ficar no trabalho até a noite, então talvez não conseguisse levar os dois para passear.

Tlim. Ela abriu a porta de vidro cheia de panfletos de promoções, anúncios de vagas de emprego e avisos de uso obrigatório de máscara, e entrou. Estava fresco lá dentro. Só depois de chegar ao trabalho, na loja de conveniência Always, ela pôde soltar um longo suspiro. Seon-suk deu um sorrisinho, desfrutando do alívio que não sentia nem quando administrava um bar e choperia. Por que será? Por estar trabalhando ali havia bastante tempo? Por ter se acostumado? Será que não era por ela ter se tornado gerente? Para um chefe, o estresse sob a pressão das vendas e do funcionamento da empresa era imenso. E um emprego de meio período significava um salário mais baixo e menos estabilidade, então não era o ideal. Já o cargo de gerente vinha com um senso de responsabilidade e, apesar de não ser como o cargo de chefia, era uma posição mais estável e com um salário mais alto em comparação a um trabalho de meio período.

Acima de tudo, Seon-suk trabalhava ali havia muito tempo — a primeira loja de conveniência Always em Cheongpa-dong! Agora havia lojas de franquia em todos os bairros, disputando entre si. Mas o número de estabelecimentos da Always vinha diminuindo, e, quando a loja em frente à Universidade Feminina Sookmyung fechou no início do ano, a unidade em que Seon-suk trabalhava se tornou a única loja de conveniência Always em Cheongpa-dong.

Era por isso que o dia a dia na loja tinha melhorado? Não, estava longe de ser isso. Com a matriz perdendo força, não tinha salvação para aquele lugar. Ao contrário das lojas de conveniência de franquia bem-sucedidas, que visavam mais a artigos em promoção e produtos próprios mais baratos, ali até o desconto das cervejas havia diminuído e, não muito tempo antes, mesmo os clientes regulares da promoção “quatro latas por dez mil wons” tinham sumido. Perderam também o admirável cliente que costumava comprar alimentos frescos, tipo sanduíches e hambúrgueres, próximos da validade, além das quatro cervejas e dos aperitivos de sempre, quando dava uma passadinha ali na volta do trabalho.

Antes de sumir, o homem tinha ido procurar a cerveja da mesma marca da farinha de trigo e a da mesma marca da graxa de sapato e, no fim das contas, acabou perguntando até sobre a cerveja da mesma marca do caracol marinho enlatado. Seon-suk nem sabia que esse tipo de coisa existia e, mesmo se soubesse, não teria condições para isso, então só balançou a cabeça em negativa, meio atrapalhada. Por fim, o homem murmurou um “Ah, que pena” e saiu da loja. Depois disso, ela não o viu mais. Diante da situação, Seon-suk se viu em uma encruzilhada,sem saber se deveria pedir essas cervejas de marcas diferentes, e resolveu conversar com o filho.

— Que inusitado… É bom para colocar nas redes sociais. Ouvi dizer que são gostosas.

— Você já provou?

— Mãe, eu gosto é de soju. E outra… esse tipo de coisa só faz sucesso no começo. Não esquenta a cabeça com isso.

As palavras do filho a reconfortaram. Ela ficou devendo ao entusiasta de cerveja, mas era impossível agradar todo mundo; afinal, era tão difícil assim se conformar com o que tinha? Além do mais, não diziam que aquela era uma loja de conveniência inconveniente? Que se dane, então! Em vez de se preocupar, Seon-suk decidiu só dar o melhor de si para atender os clientes que iam até lá todos os dias.

Seria essa a razão de ela gostar daquele lugar? Ali era parecido com a sua vida: medíocre e maçante. Uma coisinha mal administrada, com uma situação financeira sofrível, idêntica à vida de privações que Seon-suk Oh levava, se sustentando sabe-se lá como.

Assim que ela terminou de verificar o caixa para começar a trabalhar, o senhor Kwak apareceu, usando uma camisa polo e sem o colete do uniforme. Seu olhar cansado por trás da máscara revelava um constrangimento que se destacava em suas feições. Isso não era do feitio dele, que estava sempre com a mesma expressão séria, o que deixou Seon-suk nervosa.

— Gerente Oh, posso falar com a senhora um momentinho?

Geralmente ele dava respostas curtas mesmo em conversas corriqueiras, a ponto de levantar a suspeita de que estava se escondendo atrás da máscara… então ela nem precisava escutá-lo para saber o que estava por vir. Seon-suk se obrigou a disfarçar a angústia e encarou Kwak.

— Lógico. Pois não?

— Desculpa, mas… estou pedindo demissão. Só vou ficar até a próxima quinta-feira, daqui a uma semana.

Era isso. Tinha chegado a hora. Havia uns dias que tinha algo errado, um clima estranho que surgiu depois que ele havia pedido folga.

— Conseguiu um novo emprego, senhor Kwak? — perguntou ela, genuinamente preocupada.

Durante mais de um ano, Kwak havia tomado conta da loja à noite; mas, por causa da idade e de sua capacitação, ela havia considerado se ele não teria mais facilidade com outro tipo de trabalho. De vez em quando ele errava o troco, além de confundir os produtos em promoção, que mudavam a cada mês, e ainda não saber usar direito as funcionalidades extras do sistema POS. Porém, se tinha uma coisa em que ele era bom, era em pegar os ladrõezinhos, e seus olhos de águia, que já tinham flagrado três pessoas furtando mercadorias, a deixavam satisfeita — era ótimo que ele já tivesse sido detetive.

— Consegui, sim. Abriu uma vaga de segurança em outra cidade, então vou para lá.

— Onde?

— Em Gwangju. Minha cidade natal.

— O senhor conseguiu a vaga por indicação?

— No meu dia de folga, fui a uma festa de família lá.

Naquele dia, encontrei uns velhos amigos que não via há muito tempo, e descobri que um deles é proprietário de um prédio enorme. Ele estava procurando um novo segurança e, como eu disse que trabalhava em uma loja de conveniência em Seul, na hora ele me chamou para trabalhar lá. Depois de refletir bastante, decidi resolver as coisas em Seul e voltar para Gwangju. Só posso ficar até semana que vem, então… Peço desculpa por falar em cima da hora.

Mais do que por estar em cima da hora, Seon-suk ficou irritada com a eloquência dele. Homens ignorantes. Nunca diziam nada em situações apropriadas para se expressarem, então era óbvio que não sabiam resolver nada direito. Na verdade, o pior era saber que o senhor Kwak não era diferente. O mesmo valia para o funcionário do período da tarde. O jovem inflexível, que trabalhava meio período havia quatro meses enquanto esperava pelo alistamento militar, era igualzinho. Lógico que uma gerente falastrona e ríspida na casa dos cinquenta não combinaria tão facilmente com eles.

— Não precisa se desculpar. Enfim… pelo visto vou ter que encontrar alguém logo. Vou falar com o chefe e anunciar a vaga. — Obrigado pela compreensão.

Depois de fazer uma reverência, o senhor Kwak saiu do estabelecimento.

Anunciar a vaga. Encontrar outra pessoa. Naquele momento, suas preocupações só se multiplicaram. Ela já estava procurando alguém para trabalhar aos finais de semana, e agora sua cabeça doía ao pensar que precisaria de alguém para trabalhar à noite durante a semana. Foi um balde de água fria, logo no início do dia.

Até o horário do almoço, ela ficou atendendo os clientes, verificando a data de validade dos produtos, repondo os que estavam acabando, e inspecionando os produtos frescos em estoque e os colocando nas prateleiras. Quando conseguiu um tempinho para tomar uma caixa de leite e comer um sanduíche que tinha acabado de passar da validade, ela se deu conta de que já era uma hora da tarde. A essa altura o chefe já devia ter acordado.

Seon-suk pegou o celular e deu uma olhada nas chamadas recentes, então clicou no número de telefone onde se lia “Filho da senhora Yeong-sook”. Ela ficava enrolando para alterar o nome para “Chefe Kang”, pois não queria ter nada a ver com aquele patife.

Ela se irritou com a demora dele para atender. Mas no último segundo, como se tivesse adivinhado, ele enfim a atendeu.

— Que foi? Achou alguém para trabalhar aos finais de semana?

— Não. Pelo contrário! O senhor Kwak se demitiu. Por uma fração de segundo, ela pensou ter escutado um suspiro.

— Quanto ele está pedindo? — perguntou o chefe Kang, curto e grosso. — Aquele velhote não me fala nada mesmo…

— Hã? Ele me disse que quer sair…

— Olha, tia, ele está fazendo cena porque quer mais dinheiro. Estava reclamando por estar trabalhando na loja há mais de um ano e o salário não ter aumentado. É só dar um aumento para ele que esse papo de demissão acaba.

— A situação é outra. Ele arrumou um emprego de segurança em Gwangju, a cidade natal dele, e me pediu que resolvesse as coisas depressa.

— Ah, que historinha pra boi dormir! A senhora é ingênua demais. Deixa que eu ligo para o senhor Kwak. Que droga…

O chefe Kang desligou antes que Seon-suk pudesse dizer mais alguma coisa. Ela tinha odiado tudo na interação, desde a voz grogue dele ao telefone até o desdém pela conversa entre ela e o senhor Kwak. A atitude do senhor Kwak de falar com ela cara a cara tinha sido séria e respeitosa. Então o que levou aquele canalha a pensar que o senhor Kwak estava agindo como um tratante? Bem, um patife devia reconhecer outro… Ele era mesmo patético.

Chefe Kang. Filho da senhora Yeong-sook. Ou, então, Min-shik.

Desde aquele dia na igreja, havia mais de trinta anos, quando Seon-suk conheceu o filho malandro da senhora Yeong-sook, ela o achou desleixado, mas não imaginava que ele iria se tornar um encostado. O problema era que agora ele administrava a loja.

Um moleque sem responsabilidade nenhuma, que não fazia a menor ideia de como administrar nada e só se interessava pelos lucros da loja. Não gostava de gerenciar os pedidos nem de supervisionar os funcionários, mas precisava de alguém para fazer isso, então tinha promovido Seon-suk a gerente. Min-shik dizia que uma loja de conveniência deveria funcionar no automático e basicamente pediu que Seon-suk cuidasse de tudo sozinha. Apesar disso, ficou falando sobre como as finanças da loja estavam indo mal e sendo mesquinho com o salário dela, então ela recebeu um mísero aumento de 400 mil wons e só ficou mais sobrecarregada com a gestão dos pedidos e a supervisão dos funcionários.

Porém, não havia como recusar, pois ela não podia falhar com a senhora Yeong-sook. Seon-suk não conseguia se esquecer do brilho no olhar da chefe enquanto segurava suas mãos e pedia ajuda com a loja e com Min-shik.

O funcionário da tarde, Jung, pediu folga naquele dia, e ela não tinha encontrado ninguém para substituí-lo, então teve que tomar conta da loja até anoitecer. Quando os clientes que estavam saindo do trabalho começaram a aparecer, o cansaço bateu e ela tomou duas latas de energético, coisa que não gostava de fazer.

Nesse momento, o senhor Kwak chegou. Seon-suk deu uma olhada no relógio. Ele estava duas horas adiantado. Segundo Kwak, ele soube que Jung tiraria o dia de folga e achou que eles deveriam revezar o expediente, então chegou mais cedo.

Apesar de estar um tanto agradecida, Seon-suk desdenhou internamente daquele homem chato e entediante. Se era para ser assim, então ela preferia que ele tivesse avisado antes que chegaria mais cedo! Seria ótimo se ele fosse um pouco mais bem-humorado e descontraído… Ela até pensou que a família do homem devia estar frustrada com ele, mas, quando lembrou do próprio marido, que tinha ido embora, seu desdém se transformou em um suspiro. Droga…

Era em momentos como aquele que ela preferia o golden retriever. Aquele homem que trabalhava no período noturno e saíra não muito tempo depois que a Covid-19 havia estourado. Por onde ele estaria? Será que estava bem? A curiosidade tomou conta dela por um instante, mas, de tão cansada e faminta que estava, ela deixou isso de lado e se preparou para ir embora.

— O chefe Kang aprovou minha saída — informou Kwak no momento em que ela saía do depósito e tirava o colete do uniforme.

Só então ela se lembrou da conversa deles pela manhã. Com o olhar cheio de curiosidade, Seon-suk se aproximou de Kwak.

Continua…


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