A HQ que inspirou a série da Netflix. Joe Hill, aclamado autor best-seller do New York Times (A estrada da noite), continua sua sombria história indicada ao prêmio Eisner: Locke & Key. As crianças Locke se acostumaram com a miríade de chaves mágicas descoberta na casa ancestral da família, Keyhouse. Elas também se acostumaram à tragédia. Mas podem não estar preparadas para quão perto o perigo espreita cada um de seus movimentos enquanto Lucas Caravaggio, conhecido como Zack Wells, continua sua busca implacável pela chave da Porta Negra. Novas chaves e velhos espectros se juntam à história conforme a inocência é perdida e a determinação é forjada em “Locke & Key: Chaves do Reino”, de Joe Hill e Gabriel Rodriguez.
Editora: Geektopia; 1ª edição (31 março 2021) Páginas: 154 páginas ISBN-10: 655561059X ISBN-13: 978-6555610598 B08WHRT556
Biografia do autor: JOE HILL já ganhou diversos prêmios por seus contos, incluindo dois Bram Stoker, o mais importante da literatura de horror. Joe Hill nasceu no Maine, Estados Unidos. Best-seller do The New York Times, é autor de diversos livros, entre eles Tempo estranho. É também ganhador do Eisner pela série de quadrinhos Locke & Key, adaptada pela Netflix. Atualmente, Hill mora na Nova Inglaterra com a esposa e os filhos.
Leia trecho do livro
Introdução
A PROPOSTA DESTE LIVRO É tratar de diversos temas de uma só vez. É uma introdução ao que chamamos de música clássica, suas principais figuras, sua influência e seus principais períodos. Pretende ser um incentivo aos que desejam compreender esse tipo de música e as pessoas que a compõem e executam, uma referência básica para fatos e tendências, um compêndio de pequenas biografias de compositores importantes e uma análise da presença de sentimentos universais na música: amor, esperança, exaltação, desespero. Mais ainda, todo um catálogo de qualidades que, como seres humanos, vivenciamos e esperamos que se reflitam em nossa arte. Afinal, uma das funções primordiais da arte é nos mostrar a nós mesmos de maneiras comoventes e memoráveis.
Ao contrário das biografias musicais que escrevi, esta não é uma obra de intenção erudita. Ela se fundamenta principalmente numa motivação específica, aquela que me atraiu para a música clássica desde o início e a razão pela qual ainda sou compositor e escritor: prazer e emoção. Quando adolescente, abracei esse tipo de música porque ela mexia comigo; mais do que qualquer outro tipo de música, mais do que a maioria das outras coisas em minha vida, ela me fazia sentir. E ainda faz.
Cheguei a meus doze anos, na década de 1950, ouvindo Elvis e outros cantores populares, como qualquer menino. Depois comecei a tocar trombone na banda da escola e acabei ficando bom nisso, o que fez da música uma atividade mais ou menos diária. Não demorou muito e eu já tentava compor, porque ouvir música me fazia sentir uma ânsia quase dolorosa na boca do estômago, que só amainava quando eu começava a criar. Nesse processo, perdi o interesse em ser como qualquer outra criança. Comecei a descobrir que muitas das músicas pop das quais eu pensava que gostava ficavam entediantes depois de ouvi-las algumas vezes, enquanto muitas peças clássicas pareciam abrir infindáveis perspectivas de sensações e de mistério. Assim, este livro é uma canção de amor à arte que eu amo e à qual dediquei minha vida. Depois disso, veio — e ainda permanece — o fascínio de como a música é feita, em tantas épocas e em tantos lugares. Esse fascínio também é fundamental na percepção de como os sons se organizam, tanto pela audição quanto pelas regras, como os instrumentos modulam a música, como as formas musicais a moldam, como emoções são expressas e assim por diante.
Das ocasionais incursões deste livro na técnica musical, espero que o leitor obtenha uma compreensão básica da mecânica da música, pois ela se traduz em arte. Esta obra, portanto, é uma breve história da música em forma de narrativa, uma introdução aos neófitos, uma referência para um repertório familiar. Vai funcionar melhor se você ouvir as músicas durante a leitura. Cada obra que menciono pode ser encontrada no Spotify, ou num serviço similar; as poucas que não estiverem ali podem ser ouvidas e vistas no YouTube (cuja qualidade de som costuma ser terrível, e os desempenhos, por vezes, irregulares). Alguém disse uma vez que escrever sobre música é como dançar sobre arquitetura. Penso que se trata de uma meia verdade, mas as palavras, aqui, farão mais sentido se forem relacionadas com os sons.
Há uma certa ironia permeando estas páginas porque olho para a música, assim como para a totalidade da vida humana e para o grande globo terrestre, com um tom de ironia. Como escritor, sou às vezes acusado de irreverência, o que admito, mas acrescento que minha reverência é maior, profunda e claramente perceptível. Acredito no gênio e acredito em grandeza, embora, assim como amor e compaixão e Deus, sejam qualidades elusivas e indefiníveis. Mas a música é feita por seres humanos e para eles, e uma certa dimensão da existência humana me parece, para falar de um jeito delicado, coisa de doido. Ninguém, inclusive grandes gênios, é imune a isso. Para mencionar alguns exemplos: Isaac Newton, o fundador da ciência moderna, passou grande parte da vida envolvido com alquimia. Franz Schubert, um dos maiores gênios que a música viu nascer, passou muito tempo escrevendo óperas, gênero em que ele não é nada bom. Beethoven, indiscutivelmente brilhante em qualquer aspecto da música, inclusive executando-a e vendendo-a, disse com exatidão sobre si mesmo: “Fora a música, tudo que faço é mal feito e estúpido”.
Como se pode ver, este trabalho terá em certa medida um caráter pessoal, mas não vou ficar preso a minha própria e presumida sabedoria. Ensinei música durante 37 anos, para alunos de onze anos até estudantes de conservatório, e a intenção aqui é ensinar. Minhas biografias de músicos são produto de anos de pesquisa e pensamento. Este livro é o produto de décadas de ensino. Muito do que é apresentado aqui tem sido, durante séculos, de conhecimento comum, tanto em relação aos músicos quanto a seu público. Tenho certo respeito pelo conhecimento comum; ele nunca chega longe o bastante, mas costuma ser comum por uma boa razão. Da mesma forma, a maioria das peças dos compositores sugeridos aqui é familiar aos já iniciados. A Quinta sinfonia de Beethoven pode ser bastante conhecida em alguns aspectos, mas há motivos para ela ter sido tão apreciada durante tanto tempo. (Além do mais, como vou contar, em sua época a Quinta sinfonia foi considerada uma das peças mais estranhas já escritas.)
Alguns de vocês encontrarão aqui pecados de omissão ou de obrigação: “Como ele pôde deixar [ ] de fora?”. Não há o que fazer quanto a isso. Direi que os compositores e as peças recomendadas têm a ver com meu imprevisível e próprio gosto. Não posso afirmar que adoro cada uma delas (já fui louco por algumas; não sou mais), mas respeito todas as peças mencionadas neste livro. Tampouco vocês serão fãs de todas. Quando eu era jovem, fazia questão de nunca desgostar de nada, mas esse feliz abraçar tudo — happy e hippie — já se foi há muito tempo. E se sou um pouquinho esnobe, isso não significa que você também tem de ser. Aconselho meus leitores a receber novos compositores e obras com uma abertura absoluta e esperar que seu próprio gosto se vá formando à medida que se aprofunda mais nesse terreno. Se alguma peça nova o surpreende, ou choca, ou deixa perplexo, sugiro que volte a ela. Certas obras vão se tornar suas favoritas; outras irão aprimorar sua percepção sobre o que é a música e o que ela significa; algumas vão aprimorar sua percepção daquilo que diz respeito a você.
Assim, enquanto aqui e ali eu talvez apresente uma obra, um compositor ou um ponto de vista excêntrico, a maior parte das músicas integra aquilo que nós, com um suspiro, chamamos de “repertório padrão”, porque muitas dessas peças são amadas, e por bons motivos. É a palavra “padrão” que incomoda e irrita, porque não evoca a excitação que essas obras provocam e que era manifesta quando elas foram lançadas. Muito do que hoje é “padrão” ontem foi revolucionário. Ao mesmo tempo, há uma quantidade de obras e compositores menos conhecidos que são maravilhosos, e eu mergulho nesses também. Como exemplo, durante anos executei para amigos o coro final do oratório Jefté, de um compositor barroco relativamente obscuro, Giacomo Carissimi, e os vi de queixo caído — e às vezes com lágrimas nos olhos.
Recomendo não mais que algumas peças de cada compositor, um pacote inicial de obras familiares e algumas outras sugestões no final de cada ensaio. A ideia é que quando uma peça ou um compositor capturar sua atenção, você continue pesquisando mais por conta própria. Da Wikipédia e Amazon e YouTube e Spotify até sites que ainda não aconteceram, a internet é um recurso tremendo para fornecer informação e oferece muita coisa boa para ouvir. Se uma peça que cito aqui conquistar você, compare diferentes execuções dela e busque outras obras do mesmo compositor. Não vou, de modo geral, tratar de ópera, pois isso exigiria um livro inteiro. Mas há um capítulo sobre Richard Wagner e suas óperas porque ele influenciou a música em todos os sentidos. Também evitarei, dentro do possível, citar gravações; isso faria o livro ficar volumoso, e não há como saber quais delas estarão disponíveis daqui a alguns anos. Aqui e ali cito uma gravação por um ou outro motivo, ou porque não consegui resistir. E como regra geral, às vezes menciono gravações para que você fique ciente de como uma execução pode criar uma peça, ou destruí-la. Ser seletivo quanto a intérpretes é tão valioso quanto ser seletivo quanto a compositores e obras.
POR FIM, acredito que a música seja uma linguagem emocional, além das palavras, e por isso não se pode capturar sua essência com elas (embora possa ser útil tentar). Gosto da conclusão da filósofa Suzanne Langer, que chamou a música instrumental de “símbolo não consumado”.
A dimensão do que Langer entende como símbolo é grande demais para entrarmos nisso aqui, mas a ideia básica é que um símbolo é uma história, um quadro, uma pintura, uma imagem, um evento, a que reagimos de um modo emocional complexo e não diretamente informacional. Esta é a diferença entre denotação e conotação. Um sinal de pare num cruzamento denota que devemos parar. Ao mesmo tempo, pode representar todas as coisas ruins que vivem nos dizendo para fazer, que se introduzem em nosso caminho, que tumultuam nossas vidas. Para outra pessoa, um sinal de pare pode suscitar um sentimento confortante de ordem, de contrato social, de necessidade de cautela. Em cada caso existe uma reação diferente às conotações do sinal pare. Em outras palavras, são reações a um símbolo.
Langer percebeu que nossa reação à arte e a muito do que compõe a vida é uma textura de símbolos, mas que a música instrumental, à qual faltam palavras ou uma imagem clara, é uma espécie de página em branco à qual ainda assim reagimos como se fosse um símbolo tangível. A questão de o que é esse símbolo, em cada peça específica, depende em grande parte de nossas próprias respostas. Ou seja, “um símbolo não consumado”.
Subscrevo essa ideia. A questão, no entanto, é que na prática a música é muito, muito mais complicada do que isso. Na maior parte da música vocal, por exemplo, as palavras nos falam do tema e implicam emoções, e a maioria dos compositores quer expressar o sentido emocional e até mesmo físico das palavras (embora às vezes possam compor uma linha melódica que flexibiliza ou mesmo contradiz o sentido das palavras). Numa canção de Schubert, quando a história fica triste, ele costuma mudar o tom de maior para menor; ao mesmo tempo, capta cada imagem do texto, desde uma roda que gira até uma árvore ao vento, e a descreve, visceralmente, com música.
A música, assim, é uma expressão da emoção, uma expressão que é às vezes mais, às vezes menos concreta. Parte dessa resposta é cultural, parte é inata. Afinal, mesmo organismos unicelulares reagem ao som. Suspeito que nossa reação à música começa em nível celular e ressoa ao longo de todo o percurso até nossas mentes e as funções mais elevadas do cérebro. E a parte mais importante de nossa resposta emocional é única a cada um de nós. Às vezes podemos concordar com o quê uma peça musical expressa, mas cada qual preenche os detalhes de modo diferente, e nunca vamos compreender completamente como a música nos comove. O que sentimos com ela é como o que sentimos num pôr do sol. O pôr do sol não contém em si mesmo emoção; é um fenômeno físico que não tem nada a ver conosco. Talvez os dinossauros o tivessem apreciado também. Seja como for, os sentimentos são nossos, alguns deles são universais, para todos os humanos, e alguns são individuais. Em última análise, a fonte dessas reações é matéria de magia e mistério, e assim a música ecoa a magia e o mistério do universo.
TUDO QUE FOI DITO AQUI É um modo de abastecer o tanque.
Continuemos no que será uma jornada histórica ambiciosa, mas espero que também vibrante, partindo mais ou menos do começo.