“Uma Nova Era de Caos” é uma investigação jornalística impactante sobre o governo instável de Donald Trump, escrita por Carol Leonnig e Philip Rucker, repórteres do Washington Post e vencedores do Prêmio Pulitzer. A obra oferece um relato detalhado do tumultuado início do mandato de Trump até as ameaças recentes de impeachment. Com fontes exclusivas e uma pesquisa rigorosa, Leonnig e Rucker revelam como Trump moldou a presidência à sua imagem, desestruturou alianças e levou as instituições dos EUA ao limite. Através de entrevistas inéditas e uma análise profunda, o livro mostra o padrão por trás dos aparentes desastres diários e explora a interferência russa nas eleições de 2016, o trabalho dos advogados de Trump e os bastidores da Casa Branca. É um retrato alarmante e preciso da presidência mais polêmica da história recente dos EUA.
Páginas: 480 páginas; Editora: Objetiva; Edição: 1 (20 de janeiro de 2020); ISBN-10: 854700100X; ISBN-13: 978-8547001001; ASIN: B082P65RWP
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Biografia do autor: Carol Leonnig é uma jornalista investigativa no Washington Post desde 2000. Vencedora do Prêmio Pulitzer em 2015 por reportagens sobre falhas no Serviço Secreto, participou também das investigações premiadas em 2017 sobre a interferência russa nas eleições de 2016 e em 2014 sobre vigilância secreta do governo dos EUA. Além de seu trabalho no Post, contribui com a NBC News e a MSNBC. Philip Rucker é chefe do escritório do Washington Post na Casa Branca, coordenando a cobertura do governo Trump. Venceu o Pulitzer e o George Polk Award pela investigação da interferência russa nas eleições de 2016. É comentarista político para a NBC News e MSNBC e graduado em História pela Universidade Yale.
Leia trecho do livro
Para John, Elise e Molly — vocês são tudo para mim
Para Naomi e Clara Rucker
Nota dos autores
Fazer a cobertura jornalística da presidência de Donald Trump tem sido uma jornada vertiginosa. Histórias surgem a cada hora, todos os dias. A cada evento importante que registrávamos, percebíamos que a história estava se desenrolando diante de nossos olhos e tínhamos poucas chances de fazer um balanço. Sempre surgia mais alguma coisa depois. Então decidimos apertar o pause. Queríamos fazer uma análise mais aprofundada do que nossas reportagens diárias permitiam, entender o que estava acontecendo de fato nos bastidores e avaliar as reverberações para o país.
Este livro é baseado em centenas de horas de entrevistas com mais de duzentas fontes, incluindo funcionários do alto escalão do governo, amigos e conselheiros externos do presidente, além de outras testemunhas dos eventos aqui descritos. A maioria das pessoas que cooperaram com nosso projeto concordou em falar abertamente apenas sob anonimato, fosse para proteger sua carreira no governo ou por temer retaliação do presidente ou de seus aliados. Muitas de nossas fontes relataram suas experiências no background, o que significa que fomos autorizados a usar as informações que nos revelaram contanto que protegêssemos suas identidades. Muitas de nossas entrevistas foram gravadas.
Somos jornalistas objetivos, que procuram compartilhar a verdade com o público. Neste livro, nossa intenção é fornecer a versão mais próxima da verdade que fomos capazes de estabelecer com base em um rigoroso trabalho de reportagem. Reconstruímos cuidadosamente as cenas para revelar o presidente Trump sem filtros, em ação, em vez de dizer aos leitores o que pensar a respeito dele. As cenas reunidas aqui são baseadas em relatos de primeira mão e, sempre que possível, corroboradas por múltiplas fontes e respaldadas por nossa análise de agendas, registros em diários, memorandos internos e outras correspondências entre figuras-chave, bem como gravações de imagens privadas. Os diálogos talvez nem sempre sejam exatos, mas se baseiam nas lembranças dos eventos de várias pessoas e, em muitos casos, em anotações feitas por testemunhas por ocasião dos eventos. Em alguns casos, as fontes discordaram substancialmente acerca dos fatos de determinado episódio, o que, quando necessário, salientamos nestas páginas, reconhecendo que diferentes narradores por vezes se recordam de maneira diferente dos mesmos eventos.
Este livro resulta do prolongamento de nosso trabalho de reportagem para o Washington Post. Dessa forma, alguns dos detalhes de nossa narrativa foram publicados pela primeira vez em matérias que escrevemos para o jornal, ocasionalmente em colaboração com outros colegas. No entanto, em sua grande maioria, as cenas, os diálogos e as citações aparecem pela primeira vez neste livro e se baseiam na extensa investigação jornalística que realizamos exclusivamente para ele.
Para reconstruir episódios que se desenrolaram em público, recorremos a vídeos de eventos, incluindo discursos presidenciais, muitos dos quais estão arquivados no site do canal de TV a cabo C-SPAN. Também contamos com reportagens recentes de uma gama de diferentes publicações. Além disso, utilizamos como fontes os registros oficiais do governo, incluindo o relatório produzido pelo procurador especial Robert S. Mueller III. Na maioria dos casos, complementamos as informações de conhecimento público com nossa própria pesquisa original e autoral. O material garimpado desses relatos recebe os devidos créditos, com uma referência direta no texto ou nas notas finais.
Tentamos entrevistar o presidente Trump para este projeto e entramos em contato com ele pela primeira vez nos estágios iniciais de nossa apuração. Em um telefonema, Trump disse a Philip Rucker que gostaria de se sentar para uma entrevista. “Pode vir. Você vai fazer uma entrevista justa”, disse Trump. Então acrescentou: “Eu vou fazer. Eu vou fazer. Eu vou fazer. Eu gostaria de ter um livro decente. Você é uma pessoa séria. Então, isso é bom”. Nos meses seguintes, à medida que intensificava sua guerra contra a mídia, Trump recusou, por meio de um assessor, a oportunidade de nos conceder uma entrevista e dar sua própria versão dos eventos descritos neste livro.
Prólogo
“Só eu posso consertar as coisas.”
Em 21 de julho de 2016, em Cleveland, ao aceitar a indicação do Partido Republicano para a candidatura à presidência, Donald John Trump falou mais de 4 mil palavras, mas essas seis logo iam se tornar o princípio pelo qual ele iria liderar o país.
Naquela noite, Trump ficou sozinho no centro da Quicken Loans Arena, em um palco elevado que ele mesmo ajudou a projetar. Atrás pairava um gigantesco telão emoldurado em ouro, projetando uma imagem ampliada de Trump junto com 36 bandeiras americanas. Era uma manifestação masculina, com iluminação LED, de sua autoimagem. Seu discurso foi sombrio e distópico. Trump se ofereceu ao povo americano como sua única esperança de renovação e redenção. No passado, outros indicados à corrida presidencial expressaram humildade, exaltaram valores compartilhados e convocaram seus compatriotas a se unir para realizar o que só poderiam alcançar juntos. Trump, ao contrário, falou na primeira pessoa do singular.
“Eu sou sua voz.”
“Eu serei um paladino.
Seu paladino.” “Ninguém conhece o sistema melhor do que eu, e é por isso que só eu posso consertar as coisas.”
Seria fácil demais confundir o primeiro mandato de Trump com o puro e desenfreado caos. Sua presidência seria alimentada pelo solipsismo. Desde o momento em que prestou juramento assegurando defender a Constituição e se empenhar em servir à nação, ele governou em larga medida para proteger a si mesmo e se autopromover. No entanto, no dia a dia, lutando para sobreviver, tentando se manter à tona em meio ao fluxo ininterrupto de notícias, havia um padrão e um significado na desordem. A estrela guia de Trump era a perpetuação de seu próprio poder, mesmo quando isso significou pôr em risco nossa instável democracia. A confiança do povo no governo americano, já debilitada por anos de disfunção política polarizadora, sofreu um golpe baixo.
Dezenas de milhões de americanos estavam zangados, sentindo-se esquecidos pelos burocratas de Washington, ridicularizados pelas elites liberais e humilhados por uma economia global que acelerou para além de suas habilidades e condenou seus filhos a ser a primeira geração de americanos a ter condições de vida piores que as de seus pais. Trump coroou a si mesmo como o defensor dessas pessoas. Ele prometeu “Tornar a América Grande de Novo”, um mantra brilhante, que agrada a todos e é aplicável a diversas situações, através do qual um segmento do país pôde canalizar suas frustrações. Esses americanos imaginaram um país no qual os regulamentos não estrangulam os negócios da família, os impostos não são tão onerosos e empregos bem remunerados são abundantes e seguros. Alguns também recuaram no tempo para relembrar a década de 1950, vislumbrando uma nação mais simples e próspera, em que patriarcas brancos ditavam as regras, mulheres recatadas cuidavam do lar e do círculo familiar e as minorias eram subservientes ou ficavam em silêncio.
O presidente Trump era o incansável pugilista daqueles que queriam Tornar a América Grande de Novo. Ele não se preocupou em selecionar cuidadosamente um grupo de líderes para ajudá-lo a governar. O espalhafatoso promotor de eventos e astro de reality show acreditava ser capaz de administrar o governo dos Estados Unidos da mesma maneira como comandava sua empresa de incorporação imobiliária de uma suíte no 26º andar da Trump Tower, fiando-se em seus próprios instintos para aproveitar oportunidades, avaliar o poderio de concorrentes e derrubar adversários.
No entanto, a temeridade do próprio Trump prejudicou sua capacidade de cumprir suas promessas de campanha. Desde o início, ele compôs grande parte do círculo de influência de sua administração com um punhado de novatos, paus-mandados e puxa-sacos. Essa inexperiência coletiva exacerbou os problemas, desperdiçou capital político e desmoralizou os servidores públicos realmente comprometidos. O valor universal do governo Trump era a lealdade — não ao país, mas ao presidente. Alguns de seus assessores acreditavam que a exigência de Trump por lealdade cega — e sua retaliação àqueles que a negassem — estava lentamente corrompendo o serviço público e colocando à prova os limites da própria democracia.
Dois tipos de pessoas foram trabalhar para o governo: aqueles que pensavam que Trump estava salvando o mundo e aqueles que pensavam que o mundo precisava ser salvo de Trump. Estes últimos, que por vezes se sentiam atraídos pelo charme dele, eram profissionais experientes e capazes, que se acharam na obrigação de emprestar ao presidente sua erudição e seu conhecimento especializado. No entanto, com o passar dos meses, Trump exauriu os “adultos responsáveis” com, de acordo com eles próprios, sua futilidade, falta de decoro e ilegalidade das ideias e diretrizes. Um a um, esses homens e mulheres renunciaram, frustrados, ou foram sumariamente demitidos pelo presidente. Ele engatou um ciclo ininterrupto de traições, rompendo e reparando relacionamentos, de modo a constantemente manter os assessores do governo fora do eixo e garantir assim sua supremacia. Algumas dessas pessoas agora soltam suspiros à distância do presidente que esperavam guiar, com a percepção de que restam menos vozes sábias para atenuar os impulsos de Trump. Lamentam um presidente que estimulava ressentimentos comezinhos, era viciado em assistir à cobertura telejornalística dele mesmo, promovia bajuladores e sucumbia com sofreguidão a deslavadas mentiras.
Trump cumpriu em parte sua promessa de ser uma granada humana, para arrasar e refazer Washington. Ele enfraqueceu o Estado regulador, reforçou a fiscalização das fronteiras e reformou o Judiciário federal, inclusive com duas indicações à Suprema Corte — medidas que eram pautas prioritárias para sua base política conservadora. Trump também transformou a postura comercial da nação, enfraquecendo acordos multilaterais que a seu ver permitiam a países menores tirar vantagem dos Estados Unidos, e forjando novos pactos bilaterais em termos mais favoráveis. Ele herdou do presidente Obama uma economia em crescimento e a manteve funcionando a todo vapor, mesmo quando os economistas previram em meados de 2019 uma possível queda.
Como Trump amiúde faz questão de lembrar a seus críticos, ele tem sido um presidente como nenhum outro. Desafiou o estado de direito e sacudiu alianças estrangeiras, desprezando setenta anos de relações com outras democracias ao mesmo tempo que encorajou ditadores e déspotas. Questionou a própria identidade da nação como um refúgio para pessoas de todas as raças e credos ao não silenciar os supremacistas e fanáticos brancos entre seus seguidores e, vez por outra, empregando sua própria retórica racista. Ele tratou maldosamente subordinados e oficiais militares e ordenou a detenção de famílias de imigrantes. Rompeu limites por razões significativas e insignificantes, nefastas e inócuas. Para ele, tudo o que importava era vencer. O ego de Trump o impediu de fazer julgamentos sensatos e esclarecidos. Ele assumiu a presidência com tanta certeza de que seu conhecimento era o mais completo e seus fatos eram absolutos que ignorou a comprovada competência dos experientes profissionais de carreira nos quais presidentes anteriores haviam confiado. Isso representou uma total rejeição do modelo de governo dos Estados Unidos, o que alguns de seus conselheiros concluíram ter origem em uma profunda insegurança. “Em vez de seu orgulho se basear em tomar uma boa decisão, ele se fundamenta em saber a resposta certa desde o início”, disse um alto funcionário do governo.
Quando os próprios analistas de inteligência de Trump apresentavam-lhe fatos, ele às vezes alegava o ardil de conspirações. O presidente se recusou a reconhecer plenamente que a Rússia tentou ajudá-lo a vencer as eleições de 2016, apesar das evidências conclusivas. Tentou frustrar a investigação do Departamento de Justiça sobre a interferência eleitoral da Rússia, e tentou fazer com que Robert Mueller, nomeado procurador especial, fosse destituído. No entanto, Trump escapou de ser acusado de um crime, apesar da convicção de vários promotores federais de que, se ele fosse qualquer outra pessoa que não um presidente no exercício do cargo, aquilo estaria fadado a acontecer.
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