Leia trecho do livro Desenfreados de Kelly M.

Desenfreados, de Kelly M., apresenta Ryen Rodríguez, uma jovem doce e inocente que sempre foi apaixonada por Kellan Royal, o melhor amigo de seu irmão mais velho. Quatro anos mais velho e misterioso, Kellan sempre a manteve à distância com sua indiferença cruel, determinado a protegê-la de si mesmo e do mundo sombrio que ele habitava. Após uma tragédia devastadora, Ryen retorna à cidade cinco anos depois, completamente transformada. Agora fria e atormentada por um passado manchado pela culpa, ela carrega um segredo obscuro.

Kellan, com sua personalidade sarcástica e marcada por traços sociopatas, não permitirá que Ryen fuja. Ele está disposto a descobrir todos os segredos que ela esconde e não poupará esforços para isso. A escrita de Kelly M., paraibana apaixonada por Dark Romance, cativa com personagens intensos e narrativas repletas de emoções extremas, levando o leitor a sentir uma montanha-russa de sensações a cada capítulo.

Capítulo 1

“Bem-vindos ao meu lado sombrio”
Neoni – Darkside

Ryen Rodríguez

Miami, Flórida.
Cinco anos atrás.

Entre bons sonhos e uma cama confortável, meu sono estava incrível. Mas isso foi bem antes de o idiota que eu chamo de irmão pular em cima de mim como se ele não pesasse absolutamente nada. Foram um susto e um impacto tão grande que meus olhos se arregalaram.

— Acorda! — Raphael gritou, deitado sobre minhas costas.

Rangi os dentes e virei meu rosto o máximo que eu consegui para olhá-lo.

— Sai de cima de mim, seu idiota! — Tentei me debater debaixo de seu corpo pesado, mas apenas soltei um gritinho frustrado por não conseguir — Você pesa uma tonelada!

Ele pareceu ignorar o que disse, já que envolveu meu quadril com suas pernas e agarrou meus ombros. Seu cabelo levemente comprido roçou a minha bochecha e eu revirei meus olhos.

— Você acordou muito mal-humorada, hermanita — debochou, soltando o peso do seu corpo sobre mim.

Tornei a me debater debaixo dele, mas na real? Seria melhor desistir de vez.

— Claro, até porque eu amo acordar com alguém pulando em cima de mim! — grunhi. — Sai daqui, Raphael!

Meu irmão mordeu minha bochecha e eu fiz uma careta de dor, sentindo-o se levantar. Foi como se o ar voltasse para os meus pulmões, então rapidamente me sentei no colchão e me virei, o vendo em pé ao lado da minha cama, sem camisa e com uma calça de moletom caindo em seus quadris. Seu cabelo preto estava bagunçado e o rosto evidenciava que ele tinha acabado de acordar.

— Qual a droga do seu problema? — Passei as mãos por meu cabelo, tirando do rosto alguns fios que escaparam da minha longa trança.

— Não posso mais acordar a minha irmãzinha? — Ele pôs a mão sobre o peito nu, fingindo estar magoado. Falso.

Me ajoelhei na cama, o lençol escorregando das minhas pernas. Arqueei uma sobrancelha.

— Pulando em cima de mim? P

assando a língua pelo piercing no lado direito de seu lábio inferior, Raphael sorriu.

— Eu sou bem original.

— Você é bem idiota, isso sim. — Fiz uma careta, sentindo minhas costas doerem.

Raphael estreitou os olhos escuros na minha direção, cruzando os braços.

— Sabe, você não deveria me respeitar? — ele perguntou, caminhando na minha direção — Isso de irmão mais velho e blá-blá-blá. Uma merda assim.

Sorri minimamente.

— Me poupe, Raphael — desdenhei — Ninguém te respeita.

Ele se debruçou sobre a cama e tentou me agarrar, mas me joguei para trás e rastejei até minhas costas baterem na cabeceira da cama. Dei risada.

— Você é uma peste. Da próxima vez eu deixo você perder a aula.

— Até parece, sou eu que sempre te acordo.

Meu irmão revirou os olhos, com um sorriso no rosto, e os mirou em mim.

— Vá tomar banho — ordenou. — Kellan vem nos buscar em quarenta minutos.

Um sorriso largo tomou conta do meu rosto e não consegui esconder minha alegria ao escutar isso. Mais especificamente, o nome dele.

— O Kellan? — perguntei, só para ter certeza.

— Uhum — meu irmão murmurou e me olhou desconfiado. — Que sorrisinho idiota é esse?

Rapidamente desfiz minha expressão de felicidade, erguendo minhas sobrancelhas e me fazendo de desentendida.

— Que sorrisinho?

— Não tente me fazer de palhaço, Ryen, eu não sou burro — Rapha pôs as mãos na cintura.

— Não?

Ele deu um passo em minha direção e eu sorri, erguendo as mãos para que ele ficasse onde estava.

— Brincadeira, brincadeira!

Rapha parou no lugar, mas sei que ele poderia muito bem ter avançado se quisesse.

— Agora, vá tomar banho e se arrumar — ele mandou, caminhando em direção à porta do meu quarto. — Você está parecendo uma bruxa.

Abri a boca, em choque, e ergui um dos meus travesseiros, o arremessando em sua cabeça. Rapha riu e girou a maçaneta, correndo para fora do meu quarto.

Agora sozinha na enorme suíte, pulei da cama e, descalça, corri para o banheiro. Tirei meu pijama e o joguei no chão, indo para debaixo do chuveiro — embora tenha banheira.

Não quero me atrasar, mesmo eu não gostando de estudar no meu colégio. Aquele é um lugar no qual eu nunca mais pisaria se dependesse apenas de mim.

Após lavar meu cabelo e meu corpo, desliguei o chuveiro, me enrolei no roupão branco pendurado perto da grande pia, saí do banheiro e caminhei até meu closet. Retirei de dentro dele o uniforme do colégio e coloquei sobre minha cama.

A vestimenta era composta por blazer preto, camisa social branca e saia vermelha xadrez que ia até abaixo dos meus joelhos. Após me vestir, desfiz minha trança e penteei meu cabelo, colocando uma tiara vermelha, dentre as muitas em meu closet, para segurar a franja. Então, fui procurar meus sapatos.

Após calçá-los, parei na frente do espelho. Sorri diante da minha imagem e passei as mãos sobre a saia, satisfeita com o resultado. Não que eu estivesse diferente de todos os dias, mas gosto de me arrumar.

Saí do meu quarto e andei pelos corredores da casa, descendo as escadas correndo. Passei pela sala de estar, entrei na de jantar e encontrei meu irmão e minha mãe tomando café da manhã, sentados à mesa, um de frente para o outro.

Por favor, eu esperava que pelo menos hoje eles não tivessem começado o dia brigando.

— Bom dia! — eu disse, com um sorriso, atravessando a sala e me sentando ao lado de Raphael.

— Bom dia, querida — Mamãe sorriu.

Rapha olhou para mim, a boca cheia de torrada com geleia.

— Fecha a boca, eu estou vendo o fundo da sua garganta — impliquei.

— Então fecha os olhos — ele respondeu, assim que engoliu a comida.

Revirei os olhos e estiquei o braço para pegar uma torrada e a geleia de framboesa. Uma das funcionárias pôs uma jarra de suco em minha frente; sorri em agradecimento.

— Que milagre você ter descido depois do Raphael — Mamãe me olhou.

— Dessa vez ele que me acordou. De uma maneira bem carinhosa, na verdade — debochei, olhando para ele.

Meu irmão piscou um de seus olhos claros para mim.

— Sempre que quiser, hermanita — ele sorriu de lado.

Mesmo que eu tenha revirado os olhos mais uma vez, não consegui conter o sorriso que brotou em meus lábios. Idiota.

— Bom dia, família.

A tensão percorreu meu corpo rapidamente ao escutar a voz que três meses atrás passou a ser mais do que habitual nesta mansão. Callum Spencer — agora Callum Rodríguez — é o meu padrasto. Marido da minha mãe há pouco mais de quatro meses, ele a encantou com seus vinte e sete anos, seus olhos verdes e seu cabelo loiro. Sim, ele é quinze anos mais novo que a minha mãe e aparentemente era um escultor medíocre e sem talento — como Rapha gostava de dizer.

Eu tinha pouca informação sobre Callum, mas sabia que antes de conhecer nossa mãe, ele tentava vender as esculturas que fazia. Não tinha ideia de qual era seu estilo, mas mamãe jurava que o marido era imensamente talentoso.

— Bom dia, amor — ela sorriu, jogando a cabeça para trás para ganhar um beijo.

Pelo canto do olho, vi Raphael revirar os olhos, voltando a comer e fingindo que Callum não estava presente. Por um momento troquei um olhar com meu padrasto, quando ele se sentou ao lado da minha mãe, mas desviei os olhos rápido, focando em minha torrada.

Estiquei minha mão para pegar a jarra de suco e coloquei um pouco no copo.

— Recebi mais uma reclamação sua, Raphael — Mamãe disse; e olhei para ela.

E lá vamos nós.

— Estranho seria se não recebesse — meu irmão murmurou, de maneira despreocupada, pegando mais uma torrada.

— Você acha que pago o melhor colégio de Miami para você ficar fazendo vandalismo dentro dele? — Rapha deu um suspiro de irritação.

— Você fala como se eu tivesse jogado uma bomba naquela porra ou algo assim. Não vamos exagerar.

Senti os olhos de Callum em mim, e não precisei nem olhar em sua direção para saber que ele estava me encarando. Abaixei a cabeça e coloquei a torrada em meu prato, fingindo estar mexendo na saia do meu uniforme. Por favor, olhe para outro lugar.

— Não fale palavrão, você sabe que eu odeio! — nossa mãe se enfureceu.

— O que é que eu faço que você não odeia, não é mesmo? — Rapha debochou dela, mas então mudou seu foco para o nosso padrasto. — Callum, você sofre de algum problema de visão?

— Não, por quê? — Callum perguntou.

— Então por que está olhando para a mesma pessoa desde que se sentou à porra dessa mesa? — Meu irmão perguntou, entre dentes. — Quer uma foto da minha irmã?

Então não é coisa da minha cabeça.

— Estou achando sua irmã um pouco quieta hoje — Callum falou. — Algum problema, Ryen?

Sem ter como escapar, ergui lentamente o meu olhar para o marido da minha mãe, encontrando o dele cheio de um verde vivo.

— Não, estou apenas com um pouco de sono — respondi, minha voz sendo apenas um sussurro.

— E por que não fica em casa e dorme mais? — ele sorriu. E eu odiei.

— Não, de filho vagabundo já me basta um — Mamãe suspirou.

Não a responda, Rapha. Não a responda.

— Ouvi dizer que os filhos se inspiram nos pais — meu irmão retrucou, pegando seu copo de suco. O vi arquear uma sobrancelha em direção a ela. — Você não trabalhava enquanto nosso pai era vivo. E também não tem diploma de nada.

Fechei meus olhos com força. Ah, não.

Minha mãe fez menção de se levantar da mesa, mas Callum segurou seu braço, a trazendo de volta para a cadeira. —

Não, Victoria. Ele é apenas uma criança — ele disse, e então sorriu. — Não sabe o que faz ou diz.

— E de criança ela entende, Callum — meu irmão o olhou, o sorriso carregado de veneno. — Até se casou com você.

— Raphael — eu o chamei.

Não é que eu não concordasse com meu irmão. Mas o dia mal começou, e eu não estava a fim de ver eles brigarem tão cedo. Ainda mais por causa daquele homem.

— Eu estou mentindo, Ryen? — Rapha me olhou, e apontou para Callum. — Como ela espera que eu veja nesse cara uma figura paterna?

Nossa mãe, antes de casar com Callum, o namorou por dois anos. E nesse ínterim meu irmão nunca escondeu que não gostava dele. Eu me sentia da mesma maneira, mas nossa mãe estava sozinha há tanto tempo que não vi por que em ir contra sua felicidade. Mesmo que fosse ao lado desse… desse cara.

— Eu não quero roubar o lugar de seu pai — Callum respondeu.

— Nem… se… quisesse — meu irmão rebateu, pausadamente.

Minha mãe se levantou de sua cadeira de maneira brusca dessa vez, pegando todos nós desprevenidos.

— Já basta, Raphael — ela disse, em tom irritado.

Rapha também se levantou, e ergueu o queixo para ela. Ele apontou um dedo na direção de Callum mais uma vez.

— Não é o caso, mas mesmo que esse cara tivesse todo o sangue mexicano do mundo nas veias, ele nunca, escute bem, nunca — meu irmão manteve os olhos castanhos nela — vai ser um Rodríguez e jamais vai ter nem a metade do caráter que nosso pai teve.

Apertei a barra da minha saia, os nós dos meus dedos chegando a ficar brancos por causa da força que fiz. Minha mãe e meu irmão permaneceram se encarando, apenas a raiva faiscando nos olhos dos dois, criando um clima de tensão e desconforto na sala.

Uma buzina soou do lado de fora e Raphael quebrou o olhar com mamãe e o estabeleceu comigo.

— Kellan chegou, vamos — ele me chamou, saindo da frente de sua cadeira e a contornando.

Procurei minha mochila aos meus pés e bati em minha testa quando não a achei.

— Eu a esqueci no meu quarto — fiz uma careta.

— Suba e pegue, estou te esperando no carro do Kellan — meu irmão disse, saindo da sala.

Ele nem se deu o trabalho de se despedir da nossa mãe. Sequer olhou para ela, e talvez tenha sido melhor assim.

Me levantei da minha cadeira e contornei a mesa, indo em direção a mamãe, que ainda estava em pé.

— Tchau, mamãe — beijei sua bochecha, a abraçando.

— Tchau, boa aula — ela sorriu.

Comecei a me preparar para subir até meu quarto, mas a voz de meu padrasto me parou.

— Eu também não ganho um abraço, Ryen? — ele perguntou.

Respirei fundo e me virei para ele, o vendo se levantar. Ele abriu os braços, e de maneira vacilante caminhei lentamente até ele, minhas mãos apertadas em punhos.

No momento em que cheguei perto de Callum, seus braços me envolveram e ele me puxou contra si. Uma de suas mãos foi para o meu cabelo e ele o acariciou. Senti como se pudesse vomitar todo o meu café da manhã apenas com esse simples gesto.

— Boa aula, Ryen — ele disse, a voz mansa.

Quando seu abraço se tornou insuportável para mim, me esquivei com dificuldade e sorri forçadamente para a minha mãe antes de correr para fora da sala de jantar. Atravessei os corredores e subi as escadas depressa, sentindo a tensão em minhas costas aliviar.

Não consigo aceitá-lo. Não consigo aceitar Callum de jeito nenhum. Meu pai morreu quando eu tinha cinco anos e Raphael tinha acabado de fazer oito. Seu nome era Álvaro Rodríguez e ele adorava participar de rachas de carro, foi assim que ele morreu. Mesmo após virar pai, nunca deixou de correr. Ele e o pai de Kellan, na verdade. Eles eram amigos de infância.

Me lembro pouco dele, mas tenho memórias o suficiente para saber que era um bom pai. Ele era sócio do pai de Kellan, o melhor amigo do meu irmão. Eram donos da maior empresa de café da Flórida. E desde a sua morte foi mamãe que assumiu os negócios da nossa família.

Quanto a Callum, mamãe o conheceu em um bar. Além de vender estátuas, ele era garçom. Hoje em dia são casados, mas Rapha diz que ele é apenas uma sanguessuga atrás de uma velha para bancá-lo.

Peguei minha mochila no quarto e corri o mais rápido que pude até as escadas. Enquanto descia escutei a buzina soar, sinalizando a impaciência de Kellan e Raphael. Principalmente a de Kellan.

Abri a enorme porta de entrada da mansão e corri até a BMW vermelha de Kellan, vendo a porta de trás se abrir para mim. Entrei no carro e coloquei minha mochila sobre minhas coxas, sentindo minha respiração acelerada pela corrida. Arrumei minha tiara e olhei timidamente na direção dele.

— Por que demorou tanto? — Kellan me olhou pelo retrovisor, a voz grossa e rouca arrepiando os cabelos de minha nuca.

Ele tem o queixo marcado e incríveis olhos azuis que são tão claros que parecem cinzas. O cabelo preto lhe dá um ar de bad boy e, cá entre nós, ele tem todas as qualidades podres de um. Ele tem exatamente 1 metro e 89 centímetros de altura, o que me faz pequena perto dele, mesmo com os meus 1 metro e 65 centímetros —, mas sei que ainda vou crescer mais.

Tenho uma queda por ele desde que me conheço por gente. O que começou com uma admiração, aos meus dez anos se tornou uma paixão não correspondida. E agora que estou com quase quinze e ele com dezenove, percebo que tudo não passa de um sonho de consumo distante. Mas isso infelizmente não me faz menos apaixonada.

— Ela esqueceu a mochila e teve que subir pra pegar — Raphael piscou um olho para mim e sorriu. — Apenas se atrasou um pouco. — Quando é que ela não se atrasa… — Kellan murmurou, com sarcasmo, dando partida no carro. Franzi a testa.

Enquanto ele nos levava para além dos portões de minha mansão, deixei meu corpo se afundar no banco e cruzei meus braços, olhando para fora com uma carranca no rosto.

Esqueci de mencionar que Kellan também é o maior babaca que eu conheço.


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