Livro ‘Uma Esposa… Por 48 Horas!’ por Josiane Veiga

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Trecho do livro

O vento bateu com força na janela, fazendo o vidro estremecer. O minuano cruzou pelas montanhas da serra gaúcha, anunciando que o inverno seria rigoroso nesse ano.

Suspiro, meu olhar vagando pelo escritório da fazenda, pousando no relógio que marcava dezessete horas.

Estava exausta. Naquele dia, tinha ajudado o veterinário da Fazenda dos Franke a colocar mais um bezerro no mundo. Mais um dos milhares de bezerros que os poderosos pecuaristas do Sul criavam.

Eu vim para essa fazenda quando meus pais faliram sua pequena propriedade em Cruz Alta. Com o aumento dos insumos, plantar milho e criar vacas leiteiras não estava mais dando conta de pagar as contas. Então eles venderam as terras e os animais e se mudaram. Não preparada para ir para a cidade, eu pedi emprego a Afonso, o patriarca dos Franke. Ele me deu o cargo de administradora, mas na verdade eu não passava de uma faz tudo para o verdadeiro administrador: Vitor, seu filho mais velho.

Suspiro, meus olhos pousando no homem que datilografa no teclado do computador, enquanto seus olhos azuis oceano cruzam da tela para o papel claro, anotando custos e preparando a contabilidade.

Vitor está sempre lá. Alheio a realidade. A sua triste realidade.

Eu tinha dezessete anos quando o vi pela primeira vez. Apaixonei-me à primeira vista. Afoguei meus sentimentos porque ele era noivo. Ester estava grávida e mantinha aquela postura aristocrata de dona de tudo. Ela era perfeita e eu era apenas uma coitada, filha de agricultores falidos.

Ester sabia meus sentimentos. Mulheres sempre sabem. E ela sempre debochou do meu amor não correspondido. Eu devia ter ido embora nessa época, mas fiquei porque realmente não tinha para onde ir.

Quando Lucy nasceu, eu me apeguei a menininha, já que a própria Ester estava preocupada demais em tentar ter seu corpo de antes da gravidez de volta. Ela passava horas na academia ou com seu personal trainer.

Quando começaram os boatos de que ela estava traindo o marido, eu não acreditei. Que mulher trairia Vitor? Ele era perfeito. Lindo, trabalhador, educado, gentil…

Fecho meus olhos. O cheiro de sua colônia amadeirada me tomando.

Mas ela traia Vitor. Ester gostava de sexo, e a recente descoberta de um câncer em Lucy deve ter tirado todos os impulsos de Vitor. Quando Lucy faleceu, Vitor se afundou em dor e Ester pediu o divórcio.

Eu sabia que Vitor ainda a amava, mesmo depois de tudo que ela fez. O fato de ele não sair com outras mulheres provava isso.

— O carregamento de gado para o Uruguai sai na próxima semana? — ele me questiona. — Sim — respondo, me aproximando de sua mesa e lhe entregando uma extensa papelada. — Aqui estão todos os documentos de vacina e alfandegários… Ele me encara, mostrando um de seus sorrisos doces.

Ah, Vitor Franke.

Nós nos tornamos melhores amigos. Nem sei como aconteceu, mas aconteceu. De repente passamos a fazer tudo juntos. E o trabalho nos aproximou também.

— Agora que Vicente está morando perto da Casa Grande, você acha que ele vai assumir as responsabilidades sobre os…

— Núbia — ele me cortou. — Meu irmão não vai tomar seu trabalho. Até porque Vicente é um bom administrador, mas não entende nada de gado.

Vicente Franke havia vindo morar com a noiva, Jenifer, nas terras dos Franke há algumas semanas. Eu imaginava que isso podia me afastar de Vitor.

— Núbia — o jeito como ele citava meu nome me acalentava. — O que eu faria sem você?

Ali estava, meu coração batendo tão forte a ponto de provocar dor. Eu me forço a ignorar isso, todavia. Vitor não tem os mesmos sentimentos que eu e não posso me dar ao luxo de achar que…

— Eu vou buscar um café. Quer um pouco?

Ele acena e eu vou até o aparador do escritório, onde uma máquina de cápsula me aguarda.

Escuto o telefone da mesa de Vitor tocar. Sei que Vitor odeia atender telefonemas, então vou até minha mesa e puxo a ligação.

— Sim?

— Oi Núbia.

Meu corpo inteiro enrijece.

Ester?

Eu quase posso visualizá-la diante do meu tom chocado. O sorriso debochado em seu rosto, sua aparência perfeita debruçada sobre o telefone, sua testa criando sulcos de estresse de ter que lidar com uma ninguém como eu.

— Núbia. Por favor, passe para o Vitor.

Eu observo a mesa de Vitor e o vejo completamente focado no trabalho.

— Ele está indisponível no momento. Quer deixar algum recado?

— Eu realmente preciso falar com ele, Núbia.

Ok. Eu não podia fugir disso, nem podia tentar afastar os dois, porque essa decisão era de Vitor. Eu havia estado ao seu lado quando Lucy morreu e quando Ester o abandonou. Mas, mesmo que eu fosse contra ele dar qualquer chance para Ester, essa não era uma decisão minha.

— Vitor — chamei alto e ele ergueu a face na minha direção — É Ester.

Ele assentiu. Eu transferi a ligação e sai da sala para dar privacidade.

Deus… Ele era tão maravilhoso… Por que um cara como ele havia se envolvido com alguém como Ester?

Ah, eu sabia a resposta.

Ela era quente. Gostosa. Corpo malhado, longos cabelos loiros iluminados por horas e horas semanais de salão de beleza. Ela se vestia bem. E devia ser uma coisa na cama.

Me afasto do escritório e vou caminhando em direção a porta de saída. Lá fora, uma enorme escadaria dá a visão das belas montanhas da Serra.

Sento-me num degrau, meu coração balançando em tristeza. Nem sei quanto tempo passou até ouvir o som de uma voz ao fundo.

— Núbia?

O susto me coloca de pé. Encaro Vitor que está atrás de mim com o rosto sóbrio e indecifrável.

Coloco um sorriso enorme e falso no rosto, sem saber se devo perguntar como as coisas com Ester estão indo. —

Precisa de algo? — indago.

Ele acena volvendo em direção ao seu escritório. Eu o sigo. Parece sério e eu estou completamente nervosa para o que quer que esteja acontecendo.

Vitor vai voltar com Ester? Ele não sabe como dizer isso a sua melhor amiga? Ele vai esconder de todos a revoltante situação de que Ester colocou chifres até na sua bunda?

— É um pouco constrangedor…

Seu comentário me dá certeza de que Vitor e Ester estão voltando.

Deus, eles se merecem, mesmo.

Eu escondi minhas lágrimas, meu coração afundando no peito.

Nem sei por que estou tão triste. Mesmo que não fosse com ela, jamais seria comigo.

Entro na sua sala. No segundo em que fecho a porta atrás de mim, Vitor aponta para a cadeira em frente a ele. Isso sinaliza que ele quer falar sério. Talvez se explicar para a melhor amiga o que diabos vai fazer com sua vida.

— Então… falou com Ester?

Vitor se recosta na cadeira e me observa por um longo momento.

— Sim… nós conversamos.

— E?

Seu olhar pesa em mim.

— Pode dizer, Vitor. Você sabe que eu não concordo que volte para ela, mas é sua vida e como sua melhor amiga só me resta respeitar e te apoiar.

Ele abre a boca, fecha. Finalmente, suspira e o som emerge:

— Núbia, preciso que seja minha esposa.


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