Acaso ou Destino – Livro por Carlie Ferrer

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Trecho do livro

Confiro a hora no relógio e praguejo baixinho, vou me atrasar de novo. Bianca vai ficar super irritada e espero que Igor ainda não tenha chegado. Tudo culpa da maldita porta do banheiro, que emperrou de novo.

Bianca é minha cunhada, irmã do meu momentaneamente noivo, nosso casamento é em dois meses e moro com ela por enquanto. Seu apartamento é no segundo andar de um prédio de dois andares que não possui portaria, hall de entrada ou interfone. O portão de entrada está sempre aberto e nossa única proteção é mesmo a porta sempre trancada. Mesmo tendo condições de morar em um lugar melhor, ela tem um apego especial pelo apartamento onde seu pai viveu assim que chegou ao Brasil, anos atrás. De forma que não aceita sair dele. Também não é muito boa em administrá-lo, as manutenções estão atrasadas e entre portas emperradas e choques no chuveiro elétrico, temos levado nossas vidas.

Bianca é dois anos mais nova do que eu e, provavelmente, o mais perto que já tive de uma amiga, embora às vezes sinta que ela só me suporta por causa de seu irmão. Não que ela me trate mal, nem nada assim, ela é cordial e legal na maior parte do tempo, mas não é comigo como é com as amigas dela. Tudo bem, posso aceitar isso. Em breve estarei vivendo com meu marido, teremos cinco filhos e terei uma família numerosa e barulhenta para me ocupar.

Chego finalmente à boate e estaciono o carro de Bianca na primeira vaga que encontro. O local está cheio, é sábado à noite, jovens dançam animadamente, outros se pegam animadamente e, absorta em sua bebida enquanto se balança ao ritmo da música, avisto minha cunhada. É aniversário dela hoje, suas amigas também estão aqui e apenas por isso tive que concordar em vir a uma boate. Um ambiente nada familiar a mim.

Igor ainda não chegou quando me aproximo dela. Ela procura pelas amigas ao me ver, mas como não as encontra, resolve falar comigo mesmo.

— Ei, Anna, está vendo aqueles dois ali? Acho que os conheço de algum lugar!

Observo os dois homens próximos a nós que ela citou, um está de costas, tem o porte alto, o cabelo escuro liso bagunçado e um corpo atlético. O outro está de frente, mas não me lembro de tê-lo visto em lugar algum.

— Acho que não os conheço.

— Eles são lindos! — Ela ri e passa a língua pelo canudo da bebida que toma tentando seduzir o rapaz que olha em nossa direção agora.

A música está muito alta, o chão parece vibrar com o som e até quero me mover ao ritmo da música, mas tenho medo de pagar mico. Nunca dançávamos no orfanato onde cresci, temo que ter essa experiência pela primeira vez em público não seja uma boa ideia.

— Há mais deles, um mais lindo do que o outro, de onde eles estão saindo? — Ela me puxa animada para mostrar que agora há mais três homens próximos aos dois por quem ela já babava.

Desvio os olhos à procura de Igor, ele já deveria estar aqui. De repente, um gritinho agudo de Bianca me assusta e ela está rindo por nada e cochichando comigo.

— Não consigo ouvir você! — grito por conta da música alta.

Ela revira os olhos impaciente.

— Eu disse que eles estão olhando para nós duas! Ah, um deles está vindo para cá! Ah, meu Deus, Anna, é ele, é mesmo ele!

— Ele quem?

Olho para frente para entender de quem está falando, quando avisto Igor. Sorrio para ele e no segundo seguinte um homem me pega pela cintura, me puxa de encontro ao seu corpo e sua boca cobre a minha em um beijo de tirar o fôlego.

Não é que eu corresponda ao seu beijo, é que ele domina meus lábios com uma maestria que me deixa sem reação e sua língua faz coisas na minha boca que não podem ser reais. Estou atordoada quando ele me solta e faz uma careta ao observar meu rosto.

O homem que me agarrou é alto demais, tem olhos claros, embora não seja possível identificar a cor deles à pouca luz e um sorriso atrevido que me irrita imediatamente.

— Você não é a Letícia, eu confundi você, me desculpe — diz com tranquilidade, como se não fosse nada demais ter simplesmente me agarrado no meio de tantas pessoas.

— O que você está fazendo? — Escuto Igor gritar antes de puxar o safado pela camisa e tentar acertá-lo com um soco.

O pervertido desvia e acerta Igor de primeira, um golpe no nariz que o joga imediatamente para trás.

— Igor!

Bianca e eu corremos até ele, caído no chão, e o ajudamos a levantar. Tony, o subchefe de Igor e seu melhor amigo, parte para cima do pervertido para revidar a agressão, os amigos do pervertido vêm defendê-lo e, de repente, estamos em uma imensa confusão. Parece que todos os homens da boate resolveram se bater por nada e a noite termina com Igor e o pervertido dividindo as despesas pelas coisas quebradas, eu sendo banida para sempre da boate, mesmo sem entender o motivo, e Igor indo embora emburrado antes que eu consiga explicar que não conheço o pervertido e que ele simplesmente me agarrou.

Tento ligar para Igor enquanto levo Bianca para casa, mas ele não me atende.

— Bianca, você poderia ligar para o seu irmão? Talvez você ele atenda — peço, mas ela sequer olha em minha direção ao responder de má vontade.

— Se ele não te atende é porque não quer falar com você.

— Eu só preciso explicar a ele que eu…

— Você conhece Lucca Baltazi e nem me falou nada! Poxa, Anna Maria! Você me viu babando por ele a noite toda e o beijou na minha frente! E você é noiva do meu irmão! Espero que o Igor termine de vez com você!

— Mas eu não o beijei. Ele me agarrou do nada! — Não vi você protestando. — Você viu o tamanho dele? Eu mal conseguia respirar, imagine me defender!

Ela dá de ombros e liga o som do carro a um volume altíssima deixando claro que não quer mais conversar. E não posso fazer mais nada, já que o carro é dela.

Tento manter a calma e ligar de novo para Igor, mas novamente não tenho resposta. Começo a temer que a vida planejada e certa que tenho agora, que foi tão difícil conquistar, esteja por um fio. E tudo por culpa de um pervertido babaca que sequer sabe diferenciar as mulheres com quem fica.

— Letícia! Era só o que me faltava!

Na manhã seguinte chego mais cedo ao Bella Itália, o restaurante conceituado onde meu noivo é o chef. Ele também é o dono e eu sou a hostess. Ele não está na cozinha, onde deveria, e sim em seu escritório. Bato à porta e não espero uma resposta, entrando em seguida. Ele me observa com um olho e o nariz em tonalidades distintas de roxo. Além de um corte na boca.

— Ah, meu Deus, você está bem?

— O que você acha? Você está satisfeita, Anna? Você me fez de bobo, beijou outro na minha frente, me fez brigar em uma boate por você e ainda pagar a conta! Você acabou comigo de todas as formas possíveis!

— Mas eu não…

— Não quero falar com você!

— Igor, eu não…

— Eu disse que não quero falar! Sou seu patrão, estou ordenando que saia!

Respiro fundo e saio, apenas por enquanto, para que ele se acalme antes de termos uma conversa onde vou explicar toda a verdade a ele. As horas vão passando e em nenhum momento ele olha em minha direção. Sempre que tento me aproximar sou recebida com olhares frios e indiferença. Até que ao final da tarde, entro em sua sala e tranco a porta, jogando a chave no sutiã. Seus olhos estão arregalados e ele não parece nada feliz, mas precisamos ter essa conversa.

— Escuta, você vai me ouvir! Eu não traí você, nunca faria isso. Eu te vi entrar, sorri para você e de repente aquele babaca pervertido me agarrou e me beijou. Assim! Do nada! Eu nunca tinha visto aquele homem antes.

Ele me encara sério, logo, um sorriso debochado surge em seu rosto. Odeio esses sorrisos.

— Você, Anna Maria, quer que eu acredite que Lucca Baltazi beijou você sem ao menos conhecê-la?

— Mas foi o que aconteceu! Depois ele disse que me confundiu com uma tal de Letícia e teve a cara de pau de rir da confusão!

Ele parece começar a ceder e começo a rezar internamente.

— Igor, vamos nos casar em dois meses. Você me conhece, nunca tive família, amigos, não tenho ninguém, você é a única pessoa que tenho na vida, acha mesmo que eu jogaria tudo fora beijando um homem qualquer na frente da sua irmã? Na sua frente?! Eu jamais faria isso! Você precisa acreditar em mim!

Ele se levanta e passa por mim. Sei que quer ceder, mas ainda se sente enganado.

— É que, Anna, se fosse um homem qualquer em uma boate, mas estamos falando de Lucca Baltazi, o famoso Lucca Baltazi. Se ele deu em cima de você naquele lugar… Além do mais, me parece impossível que alguma mulher no país não saiba quem ele é!

— Meu Deus! Mas eu sequer havia visto esse homem até ele me soltar depois de ter me beijado. E mesmo agora quando vocês ficam repetindo o nome dele eu continuo sem saber quem ele é!

— Não quero mais discutir isso com você, abra a porta, preciso começar a preparar o jantar. Conversamos outra hora.

Cedo, porque ele ao menos parece estar me ouvindo, parece estar começando a entender que não fiz nada.

— Vem pegar a chave… — provoco abrindo os dois primeiros botões do uniforme que uso, mas acho que é cedo demais. Ele vem até mim impaciente, enfia a mão em meu sutiã sem o menor cuidado e pega a chave, abrindo a porta e passando por ela em seguida.

Assim que deixo a sala de Igor, apesar de todos os olhares tortos sobre mim aqui no restaurante desde que cheguei de manhã, vou direto pesquisar quem diabos é esse tal Lucca Baltazi, vulgo: pervertido babaca. Digito seu nome no Google e imediatamente milhares de fotos dele pipocam na tela. Muitas sozinho, mas a maioria delas acompanhado de belas mulheres. Passo fotos e mais fotos até perceber que ele não repete mulheres como não repete roupas.

— Um babaca — constato.

— Um babaca — constato.

Além de pervertido e babaca, ele também é milionário. Ele é fundador e dono da Atenas, a maior rede de agências de viagens da América. Ele é grego, nascido na Grécia, mas se mudou para o Brasil ainda criança com os pais. Sua mãe é brasileira e o pai, grego. Atualmente, para qualquer lugar do mundo ou do país que uma pes-soa queira ir, seu primeiro passo é procurar a Atenas. Eles dominam desde as vendas de passagens nas principais companhias do mundo, como reservas em hotéis, pacotes turísticos e canais de viagens na internet.

— Um babaca com sorte — defino melhor.

Biografia do autor: Carlie Ferrer é natural de Belo Horizonte. Descobriu o amor pelas palavras aos seis anos de idade, e aos oito começou a se aventurar em suas próprias histórias. Seu primeiro livro autopublicado foi O Assassino, seguido pela trilogia que figurou entre os mais vendidos da Amazon: Estúpido Desejo, Estúpida Chantagem e Estúpida Proposta. Apaixonada por histórias, quando não está escrevendo, passa seu tempo lendo e se apaixonando a cada novo romance. Atualmente, seus livros podem ser encontrados na plataforma digital Amazon e em seu site: carlieferrer.com.


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