Livro ‘A Prometida’ por Kiera Cass

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A autora da série best-seller A Seleção está de volta com um novo universo apaixonante! Compre na pré-venda e ganhe um kit de polaroids exclusivo. Quando o rei Jameson se declara para a Lady Hollis Brite, ela fica radiante. Afinal, a jovem cresceu no castelo de Keresken, competindo com as outras damas da nobreza pela atenção do rei, e agora finalmente poderá provar seu valor. Cheia de ideias e opiniões, logo Hollis percebe que, por mais que os sentimentos de Jameson sejam verdadeiros, estar ao seu lado a transformaria num simples enfeite. Tudo fica ainda mais confuso quando ela conhece Silas, um estrangeiro que parece enxergá-la — e aceitá-la — como realmente é. Só que seguir seu coração significaria decepcionar todos à sua volta...
Páginas: 344 páginas  Editora: Seguinte (5 de maio de 2020)  ISBN-10: 8555341035  ISBN-13: 978-8555341038  ASIN: B086M86R8N

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Biografia do autor: KIERA CASS nasceu em 1981, na Carolina do Sul, Estados Unidos. Formou-se em história na Universidade de Radford, na Virginia, e hoje mora em Christiansburg, com o marido e dois filhos. É autora da série A Seleção, que já vendeu mais de 2 milhões de exemplares no Brasil, e de A sereia. Odeia motoristas que não dão seta, viajar de avião e salada; ama materiais de papelaria, boy bands e sobremesa. 

Leia trecho do livro

Para Gerad, meu irmão punk, que me carregaria até o outro lado do Serengueti.
Ou pelo menos é o que ele diz.

ERA AQUELA ÉPOCA DO ANO EM QUE O SOL AINDA NASCIA GELADO . Mas o inverno já estava acabando, e as flores começavam a desabrochar. A promessa de uma nova estação me enchia de expectativas.

— Mal posso esperar pela primavera — suspirei enquanto via os pássaros voarem destemidos contra o azul do céu. Delia Grace amarrou o último laço do meu vestido e me conduziu até a penteadeira.

— Eu também — ela respondeu.

— Torneios. Fogueiras. O Dia da Coroação já está chegando… O tom da voz dela dava a entender que eu deveria estar mais animada, só que ainda tinha minhas reservas.

— Pois é.

Dava para sentir a frustração dela nos movimentos de suas mãos.

— Hollis, com certeza você será a parceira e acompanhante do rei durante os festejos! Não sei como consegue ficar tão calma.

— Graças aos céus temos a atenção do rei este ano — eu disse num tom leve, enquanto ela trançava meu cabelo para trás. — Do contrário, isto aqui estaria um tédio completo.

— Você fala como se flertar não passasse de um jogo — ela comentou, surpresa.

— Mas é um jogo — insisti. — Logo ele vai seguir em frente, por isso temos que aproveitar enquanto podemos.

Pelo espelho, vi Delia Grace morder o lábio sem desviar os olhos do que fazia.

— Alguma coisa errada? — perguntei.

Ela logo se animou e esboçou um sorriso.

— Nada. Só estou perplexa com seu descaso em relação ao rei. Acho que as intenções dele vão além do que imagina.

Baixei o olhar, tamborilando os dedos no tampo da penteadeira. Eu gostava de Jameson. Seria loucura não gostar. Ele era bonito, rico e, céus, era o rei. Também dançava bem e era uma ótima companhia, quando estava de bom humor. Mas eu não era tola. Eu o tinha observado passar de uma moça para outra ao longo dos meses anteriores. Haviam sido pelo menos sete, contando comigo. Isso considerando apenas os casos de que todos na corte sabiam. Minha ideia era aproveitar enquanto pudesse, depois aceitar quem meus pais escolhessem para mim. Pelo menos poderia lembrar daqueles dias quando fosse uma velha entediada.

— Ele ainda é jovem — repliquei afinal. — Não consigo vê-lo assumindo compromissos com ninguém pelos próximos anos de trono. Além disso, tenho certeza de que esperam que obtenha alguma vantagem política com o casamento. E não posso oferecer muito nesse quesito.

Uma batida soou à porta, e Delia Grace foi atender, com o rosto cheio de decepção. Dava para notar que ela achava mesmo que eu tinha chance, e imediatamente me senti culpada por ser tão difícil. Em nossos dez anos de amizade, sempre tínhamos apoiado uma à outra, mas as coisas tinham mudado entre nós nos últimos tempos.

Fazíamos parte da corte, e nossas famílias tinham criadas. Já as mulheres das famílias mais nobres e da realeza tinham damas de companhia. Mais do que empregadas, aquelas damas eram suas confidentes, suas acompanhantes… tudo. Delia Grace assumia o papel sem que eu estivesse em tal posição, convicta de que minha situação mudaria a qualquer momento.

A atitude dela tinha um significado maior do que eu era capaz de expressar, maior do que eu era capaz de encarar. O que é uma amiga senão alguém que acredita que você consegue mais do que imagina?

Ela voltou da porta com uma carta na mão e um brilho no olhar.

— Veio com o selo real — Delia Grace provocou, balançando a carta. — Mas, como não ligamos para o que o rei sente por você, suponho que não haja pressa em abrir.

— Quero ver — eu disse, levantando com a mão estendida. Ela logo puxou a carta para trás. — Sua maldosa! Pode me dar isso?

Delia Grace deu um passo para trás e no segundo seguinte eu já estava correndo atrás dela pelos meus aposentos, às gargalhadas. Consegui encurralá-la duas vezes num canto, mas ela era mais rápida, e escapuliu pelas brechas antes que eu conseguisse pegá-la. Eu já estava quase sem fôlego de tanto correr quando finalmente a agarrei pela cintura. Ela esticou o braço o máximo que pôde para proteger a carta. Talvez eu até conseguisse tomá-la de sua mão, mas bem quando eu estava erguendo o braço, minha mãe abriu as portas que ligavam meus aposentos aos dela. Então veio a bronca.

— Hollis Brite, você perdeu o juízo?! Delia Grace e eu nos separamos, pusemos as mãos para trás e fizemos uma reverência rápida.

— Ouvi vocês duas gritando feito animais do outro lado da parede. Como podemos esperar encontrar um pretendente para você se insiste nesse tipo de comportamento?

— Desculpa, mãe — murmurei, penitente.

Arrisquei erguer os olhos para ela. Lá estava minha mãe, com a mesma expressão exasperada que costumava estampar no rosto sempre que vinha falar comigo.

— Faz só uma semana que a menina dos Copeland ficou noiva, e os Devaux já estão negociando alguma coisa. Mas você ainda age feito criança. Engoli em seco, mas Delia Grace nunca foi de ficar calada.

— Não acha que está cedo demais para prometer Hollis a alguém? Ela tem tantas chances quanto as outras de conquistar o coração do rei.

Minha mãe fez o máximo para conter o sorriso condescendente.

— Todas sabemos que os olhos do rei gostam de passear. E não é como se Hollis levasse muito jeito para rainha, não é mesmo? — ela falou, com a sobrancelha bem arqueada, como que nos desafiando a discordar. — Além disso — acrescentou —, acha mesmo que você está em posição de falar das perspectivas de alguém?

Delia Grace engoliu em seco, com o rosto feito pedra. Eu já a tinha visto usar aquela máscara um milhão de vezes.

— Pois é — minha mãe concluiu. Depois de deixar clara sua decepção conosco, deu meia-volta e saiu. Soltei um suspiro e me virei para Delia Grace.

— Desculpa.

— Ela não disse nada que eu já não tivesse escutado — Delia Grace reconheceu ao me entregar a carta, afinal. — Também peço desculpas. Não queria criar problemas para você.

Peguei o envelope de sua mão e rompi o selo.

— Tudo bem. Se não fosse por isso, teria sido por outra coisa.

Pela cara de Delia Grace, eu soube que concordava comigo. Comecei a ler o bilhete.

— Ai, ai — disse, apalpando o cabelo solto. — Acho que vou precisar da sua ajuda com outro penteado.

— Por quê?

Lancei um sorriso para ela e balancei a carta como se fosse uma bandeira contra o vento.

— Porque sua majestade solicita nossa presença no rio hoje.

— Quantas pessoas você acha que vão estar lá?

— Vai saber. Ele gosta de estar rodeado por uma multidão. Retorci os lábios.

— Verdade. Queria ficar sozinha com ele pelo menos uma vez.

— Disse a pessoa que insiste que é tudo um jogo.

Voltei meu olhar para ela e trocamos um sorriso. Delia Grace sempre parecia saber mais do que eu queria admitir.

Viramos no corredor e vimos que as portas já abertas davam as boas-vindas ao recém-chegado sol de primavera. Meu coração acelerou quando vi o manto vermelho com pele de doninha nas bordas pendendo das costas de uma figura esguia mas forte no fim do trajeto. Embora ele não estivesse virado para mim, sua simples presença bastava para preencher o ar com um calor vibrante.

Curvei-me numa ampla reverência.

— Majestade.

E vi um par de sapatos pretos e brilhantes se voltarem para mim.

— LADY H OLLIS — O REI DISSE AO ESTENDER A MÃO CHEIA DE anéis. Eu a tomei, levantei e dei com um belo par de olhos mel. Algo na atenção profunda e focada que ele me dispensava sempre que estávamos juntos me deixava com a mesma sensação de quando Delia Grace e eu dançávamos e eu rodopiava rápido demais: meio zonza e ofegante.

— Majestade. Foi um grande prazer receber seu convite. Adoro o rio Colvard.

— Sim, a senhorita mencionou. Viu como lembro? — ele disse, tomando minha mão na sua. Em seguida, baixou a voz.

— Também lembro de você comentar que seus pais têm sido um pouco… autoritários ultimamente. Mas eu precisava convidá-los por questões de decoro.

Espiei atrás dele e vi que a comitiva era bem maior do que eu esperava. Meus pais estavam presentes, assim como alguns nobres do conselho privado e um monte de outras damas que eu sabia que estavam esperando impacientemente sua vez, assim que Jameson me deixasse de lado. Reparei que Nora me olhava de nariz empinado, com Anna Sophia e Cecily logo atrás, todas cheias de si, certas de que meu tempo se aproximava do fim.

— Não se preocupe. Seus pais não vão estar na nossa balsa — ele me garantiu. Sorri, grata pela pequena folga, mas infelizmente minha sorte não se estendia à carruagem que nos levaria pelo caminho sinuoso até o rio.

O castelo de Keresken ficava no topo do planalto de Borady, uma visão maravilhosa e inconfundível. Para descermos até o rio, nossas carruagens precisavam costurar lentamente pelas ruas da cidade de Tobbar, capital do reino… O que levava tempo.

Vi os olhos do meu pai brilharem quando ele tomou consciência da oportunidade de ter uma audiência privada com o rei durante o trajeto.

— Então, majestade, como vão as coisas na fronteira? — ele começou. — Ouvi dizer que nossos homens foram forçados a bater em retirada no mês passado.

Tive de me segurar para não revirar os olhos. Por que meu pai achava que lembrar o rei dos nossos fracassos recentes seria uma boa maneira de começar uma conversa? Jameson, porém, tirou aquilo de letra.

— É verdade. Só colocamos soldados na fronteira para manter a paz, então o que eles poderiam fazer sob ataque? Os relatórios dizem que o rei Quinten insiste que o território isoltano se estende até as planícies tiberanas.

Meu pai desdenhou, mas percebi que não estava tão calmo quanto aparentava. Sempre girava o anel de prata em seu dedo indicador quando estava nervoso.

— Aquilo é terra coroana há gerações.

— Exatamente. Mas não tenho medo. Estamos seguros dos ataques aqui, e os coroanos são excelentes soldados.

Olhei pela janela, entediada com a conversa sobre as disputas inconsequentes na fronteira. Jameson em geral era a melhor das companhias, mas meus pais acabavam com toda a alegria na carruagem.

Não consegui conter um suspiro aliviado quando chegamos ao porto e pude sair daquela cabine abafada.

— A senhorita não estava brincando quanto a seus pais — Jameson disse quando finalmente ficamos a sós.

— São as duas últimas pessoas que eu convidaria para uma comitiva, com certeza.

— E mesmo assim criaram a moça mais encantadora do mundo — ele disse, dando um beijo na minha mão.

Corei e desviei o rosto. Meus olhos se cruzaram com os de Delia Grace, que ia saindo de sua carruagem, seguida por Nora, Cecily e Anna Sophia. Se eu tinha achado minha viagem insuportável, os punhos cerrados dela enquanto caminhava até mim me diziam que a sua tinha sido muito pior.

— O que aconteceu? — cochichei.

— Nada que já não tenha acontecido mil vezes — ela jogou os ombros para trás e endireitou o corpo.

— Pelo menos estaremos juntas no barco — reconfortei-a. — Vamos. Não vai ser divertido ver a cara delas quando você subir no barco do rei?

Fomos até o patamar, e senti uma onda de calor subir pelo meu braço quando o rei Jameson tomou minha mão para me ajudar a embarcar. Como prometido, Delia Grace se juntou a nós, assim como dois dos conselheiros do rei, ao passo que meus pais e os demais convidados foram conduzidos aos vários outros barcos à disposição. O estandarte real se erguia orgulhoso no mastro, e o vermelho intenso de Coroa tremulava rápido, parecendo fogo contra a brisa do rio. Assumi feliz meu assento à direita de Jameson, que manteve os dedos enlaçados aos meus enquanto me ajudava a sentar.

Havia comida à disposição, e peles para que nos cobríssemos caso ficasse frio por conta do vento. Parecia que tudo o que eu era capaz de desejar já estava bem diante de mim. Aquilo ainda me surpreendia: a falta do que quer que fosse quando sentava ao lado de um rei.

À medida que descíamos o rio e o estandarte do rei era visto, as pessoas nas margens paravam e se curvavam, ou gritavam bênçãos a seu soberano. Com toda a compostura, ele lhes respondia acenando a cabeça, sentado totalmente ereto.

Eu sabia que nem todo soberano era bonito, mas Jameson era. Ele cuidava da aparência, mantendo o cabelo escuro sempre curto e a pele bronzeada sempre macia. Era elegante sem ser frívolo, mas gostava de ostentar suas melhores posses. Esse passeio de barco logo no começo da primavera era uma amostra disso.

Eu gostava disso nele, porque no mínimo podia sentar ao seu lado e me sentir parte inegável da realeza.

À margem do rio, perto do lugar onde tinham construído uma ponte nova, erguia-se uma estátua castigada pelo tempo que projetava sua sombra colina abaixo, em direção à água azul-esverdeada. Como ditava a tradição, os cavalheiros nos barcos se levantaram, ao passo que as damas baixaram a cabeça em respeito. Havia livros repletos de histórias da rainha Albrade cavalgando pelo interior do país para repelir os isoltanos enquanto o marido, o rei Shane, estava em Mooreland tratando de assuntos de Estado. Ao retornar, o rei mandara espalharem sete estátuas de sua esposa por Coroa, e a cada agosto todas as moças da corte dançavam com espadas de madeira na mão para recordar a vitória da rainha.

Ao longo da história de Coroa, as rainhas quase sempre eram mais lembradas do que os reis. A rainha Albrade nem era a mais reverenciada de todas. Havia a rainha Honovi, que caminhara até os limites do país e demarcara as fronteiras, abençoando com um beijo as árvores e rochas que usara de marcos. Até hoje, as pessoas vão até essas pedras — postas pela rainha em pessoa — e as beijam também. A rainha Lahja ficara famosa por cuidar das crianças coroanas no auge da peste isoltana. A doença mortal recebera tal nome porque deixava a pele azul como a bandeira de Isolte. A própria rainha percorrera corajosamente as cidades para procurar crianças sobreviventes e arranjar novas famílias para elas.

A rainha Ramira, mãe de Jameson, tinha ficado conhecida por todo o país por sua bondade. Havia sido o oposto do marido, o rei Marcellus. Enquanto ele tendia a atacar primeiro e nem perguntar depois, ela buscara a paz. Dizia-se que pelo menos três guerras tinham sido evitadas graças a seus argumentos polidos. Os rapazes de Coroa seriam eternamente gratos a ela. E suas mães também.

O legado das rainhas coroanas havia deixado marcas no continente inteiro, e talvez esse fosse mais um dos atrativos de Jameson. Ele não era apenas bonito e rico, não tornaria uma moça apenas uma rainha… mas uma lenda.

— Adoro água — Jameson comentou, trazendo-me de volta à beleza do momento. — Acho que uma das minhas coisas favoritas na infância era navegar até Sabino com meu pai.

— Seu pai era um navegador excelente — Delia Grace comentou, entrando na conversa. Jameson assentiu, entusiasmado.

— Um de seus muitos talentos. Às vezes acho que herdei mais características da minha mãe do que dele, mas o gosto pela navegação sempre me acompanhou. Isso, e a paixão que ele tinha por viagens. E a senhorita, Lady Hollis? Gosta de viajar? Dei de ombros.

— Nunca tive muita chance. Passei minha vida inteira entre o castelo de Keresken e o solar Varinger. Mas sempre quis ir a Eradore. — Suspirei. — Adoro o mar, e me disseram que as praias de lá são de uma beleza ímpar. —

São mesmo. — Ele sorriu e desviou o olhar. — Ouvi dizer que a moda entre os noivos é fazer uma viagem juntos quando se casam. — Ele voltou a olhar nos meus olhos. — Faça questão de que seu marido a leve a Eradore. A senhorita vai ficar radiante naquelas praias brancas.

Jameson desviou o rosto mais uma vez, enfiando amoras na boca como se falar de maridos, viagens e solidão não fosse nada. Olhei para Delia Grace, que retribuiu meu olhar, chocada. Eu tinha certeza de que, quando estivéssemos as duas a sós, analisaríamos cada segundo daquela conversa para tentar entender seu significado.

Será que Jameson quis dizer que na opinião dele eu deveria me casar? Ou tinha sugerido que eu deveria me casar… com ele?

Com tais perguntas na cabeça, me endireitei no assento e olhei para o outro lado do rio. Nora estava lá, no outro barco, com uma expressão amarga no rosto, assistindo a tudo com outras moças infelizes da corte. Conforme eu observava, fui notando que vários pares de olhos não se concentravam na beleza do dia, mas em mim. Contudo, o único par que demonstrava raiva era o de Nora.

Peguei uma amora e atirei contra ela, acertando-a bem no meio do peito. Cecily e Anna Sophia começaram a rir, e o queixo de Nora caiu em choque. Mas ela logo apanhou uma de suas frutas e jogou em mim, e sua expressão mudou para algo próximo da alegria. Com uma risadinha, peguei mais frutas e comecei uma espécie de guerra.

— Hollis, mas que diabos está fazendo? — minha mãe gritou do seu barco, a voz alta o bastante para superar os golpes dos remos contra a água. Olhei para ela e respondi toda séria:

— Estou defendendo minha honra, claro.

Virei para Nora de novo, não sem antes perceber que Jameson ria baixo a meu lado.

Uma torrente contínua de gargalhadas e amoras fluía de ambos os lados. Fazia tempo que eu não me divertia tanto, até que me inclinei um pouco demais para a frente, na tentativa de fazer um arremesso mais certeiro, e acabei caindo na água.

Ouvi os suspiros e gritos das pessoas ao meu redor, mas consegui tomar um bom fôlego antes de mergulhar e voltei à superfície sem me engasgar.

— Hollis! — Jameson exclamou com o braço estendido para mim. Eu o agarrei, e em questão de segundos ele me puxou de volta para a segurança do barco. — Hollis, querida, você está bem? Machucou alguma coisa?

— Não — respondi arfante, já tremendo por conta da água fria. — Mas acho que perdi os sapatos.

Jameson olhou para meus pés dentro das meias e caiu na gargalhada.

— Vamos ter que dar um jeito nisso, não é?

Houve risos por todos os lados quando viram que eu estava bem. Jameson tirou o paletó e me cobriu para me manter aquecida.

— De volta para o porto, então — ele ordenou, ainda sorridente. Jameson me puxou para perto e olhou no fundo dos meus olhos. A sensação era de que naquele momento, sem sapatos, com o cabelo bagunçado e encharcada, ele me achava irresistível. No entanto, com meus pais logo atrás e com uma dúzia de nobres circulando por perto, ele se limitou a dar um beijo cálido na minha testa fria.

Foi o bastante para produzir uma série de ondas que percorreram minhas entranhas, e me perguntei se todo momento com ele seria assim. Estava louca para que me beijasse. Sempre que conseguíamos ter um breve momento a sós, eu ficava na esperança de que Jameson me puxasse para si. Mas, por enquanto, nada. Eu sabia que ele tinha beijado Hannah e Myra; se beijara outras, elas não tinham contado. Eu me perguntava se o fato de Jameson não ter me beijado ainda era um bom ou mau sinal.

— Consegue ficar de pé? — Delia Grace perguntou, me trazendo de volta à realidade ao me ajudar a descer até o cais.

— O vestido pesa bem mais encharcado — reconheci.

— Ai, Hollis. Sinto muito! Não tinha a intenção de fazer você cair! — Nora exclamou ao desembarcar do navio em que estava.

— Besteira! Foi culpa minha, e aprendi uma lição muito valiosa. De agora em diante, só vou desfrutar do rio da minha janela — respondi com uma piscadela. Ela riu, e quase deu a impressão de que a risada tinha escapado.

— Tem certeza de que está bem?

— Claro. Talvez meu nariz escorra amanhã, mas estou bem.

Leve como a garoa, e duas vezes mais molhada. Não estou chateada, prometo.

Nora abriu um sorriso que pareceu autêntico.

— Aqui, deixa que te ajudo — ela se ofereceu.

— Eu cuido dela — Delia Grace a cortou.

O sorriso de Nora desapareceu no ato, e ela passou da simpatia para uma irritação inimaginável.

— Claro que cuida, tenho certeza. Já que uma moça como você jamais teria a chance de atrair a atenção de Jameson por si só, ficar agarrada na saia de Hollis é a melhor coisa que pode fazer.

— Ela arqueou a sobrancelha e nos deu as costas. — Eu seguraria bem forte no seu lugar.

Abri a boca para dizer a Nora que Delia Grace não tinha culpa pela própria situação, mas senti uma mão no peito me impedir.

— Jameson pode ouvir — Delia Grace disse por entre os dentes. — Vamos embora.

A mágoa em sua voz era inconfundível, mas ela tinha razão. Homens lutavam em campo aberto; mulheres, por trás dos leques. Me agarrei firme a Delia Grace ao longo do trajeto de volta ao palácio. Depois de tanta humilhação numa só tarde, me perguntava se ela não ia querer passar o dia seguinte reclusa. Tinha feito aquilo muitas vezes quando éramos mais jovens e seu coração não aguentava ouvir nem mais uma palavra.

Mas na manhã seguinte ela estava no meu quarto, calada, ajeitando meu cabelo em outro penteado intrincado. No meio do processo, alguém bateu na porta. Quando Delia Grace a abriu, deparou com um exército de criadas com buquês e mais buquês das primeiras flores da primavera.

— Mas o que significa isso? — Delia Grace perguntou, com um gesto para que elas pusessem as flores em qualquer superfície livre que conseguissem encontrar.

Uma criada fez uma reverência para mim e me entregou um bilhete dobrado. Sorrindo, comecei a lê-lo em voz alta:

— “Como talvez esteja gripada e não possa se aventurar pela natureza hoje, achei que a natureza deveria vir até sua rainha.”

Delia Grace arregalou os olhos.

— Sua rainha?

Assenti, com o coração disparado.

— Encontre meu vestido dourado, por favor. Acho que o rei merece um agradecimento.


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