Trecho do livro
11 DE JANEIRO DE 2013
Acordo mais um dia sentindo enjoos. Faço um esforço enorme para tentar comer algo no café da manhã. Minha avó, Pepita, estranha a falta de apetite. Invento que havia comido algo na noite anterior que não caiu bem.
Estou angustiada com a possibilidade de estar grávida. Meu plano era conseguir ingressar na Universidade Complutense de Madrid no curso de Enfermagem, que aliás, é considerado um dos melhores cursos do país. Além do reconhecimento e prestígio que ganhou por toda a Europa.
Um bebê agora dificultaria mais a minha vida.
Não estou preparada para ser mãe, jamais passou pela minha cabeça. Sinceramente ser mãe é algo que nunca seria por decisão própria.
— Eu posso cobrir você.
Termino de passar o batom vermelho olhando meu reflexo derrotado no espelho da penteadeira com luzes embutidas. Infelizmente não estou conseguindo controlar as lágrimas teimosas, mas logo teria que dar um jeito de as engolir.
Há dois anos estou trabalhando no clube Ruby. Um dos maiores clubes para homens. Apesar de ser no subúrbio, a maior parte dos clientes são os engravatados cheios da grana. Se Donna e Jax — os donos —soubessem a minha verdadeira idade nunca teriam deixado eu trabalhar aqui. Tive ajuda da minha melhor amiga para conseguir uma identidade falsa.
Infelizmente o que ganho no fast food não é o suficiente para suprir as despesas. O pouco que a minha avó recebe são para os seus remédios, plano de saúde e outras coisas relacionadas a ela. Então sou eu que mantenho as contas da casa, boa parte da comida e os cursos extras que fiz para conseguir um emprego que pague melhor. O que não resultou em muita coisa.
— Não precisa, Sofia. Está cansada de ter passado o dia em pé.
Durante o dia Sofia trabalha como vendedora em uma loja chique e exploradora no Moda Shopping.
— Mas sou sua melhor amiga. Aguento mais meia hora por você.
Arranca um sorriso dos meus lábios. Minha vida seria mais pesada e triste sem ela. Tenho certeza disso.
— Pode me esperar. Assim dorme comigo lá em casa.
— Certo. — Senta-se na cadeira ao lado e viro o rosto em sua direção, quando diz séria: — Faça o teste. abe logo com essa dúvida.
— Estou morrendo de medo, Sofi. Estudei tanto para manter boas notas e agora posso ter colocado tudo arder.
— Daremos um jeito. Não pode mais prolongar o teste. Está quantas semanas atrasada?
— Dez dias. — Engulo em seco. — Minha menstruação é certinha.
— Porra, Ana Brenda! Tinha que ter transado sem camisinha?
— Tem mais uma coisa.
— Pode falar, amiga. Estou sentada.
— Fiz as contas e transei justo no meu período fértil.
— Então já podemos descartar o teste. Poxa, Ana!
— Bebi muito naquele dia. Estava querendo extravasar, tirar a dor e raiva que meu pai causou. E então aconteceu. Talvez, o cara estivesse mais alterado do que eu, sei lá. Bonito, mais velho, charmoso e ao mesmo tempo sombrio.
— E eu pensando que a tatuagem tinha sido o auge da sua noite maluca.
Sofia recebeu um convite de uma festa particular de um ricaço. Na verdade, a festa estava rolando há dois dias. Ao chegarmos lá parecia que estávamos dentro de um filme que se passava a maior parte em um cassino. Vários jogos, mulheres de todos os jeitos exibindo seus corpos, homens bebendo, fumando, dançando com mulheres, entre si.
Em um dos ambientes foi montado um pequeno espaço para um tatuador profissional. Claro que nem havia passado pela minha cabeça que iria sentar na cadeira e tatuar algo no meu corpo.
Fui cativada pelo homem alto, forte, cabelo, barba e sobrancelhas grossas na cor castanho. A camiseta estava folgada no seu corpo, porém não impedia de notarmos os músculos definidos. Nada exagerado.
Ele sorvia o uísque como se fosse água. Talvez, assim como eu, quisesse esquecer de tudo enchendo a cara. Em algum momento daquela noite começamos a trocar olhares. E então veio sentar ao meu lado sem largar seu copo.
Parei de ingerir álcool e quis que o desconhecido largasse seu copo. Não fez isso por um segundo. Sempre pedindo mais uísque do barman. Até que aceitei seu convite para dançarmos. A atração foi latente.
Depois do José nunca mais havia tido outra experiência sexual. Senti que estava na hora. Obviamente o tesão contribuiu muito. Minha primeira vez com o José não foi ruim, pelo conbartrário. Meu ex deixou o ambiente romântico, fez tudo certinho, mas não gozei. E honestamente não esperava muita coisa quando perdesse a virgindade.
Algumas horas depois entramos em dos quartos vazios da mansão e transamos loucamente. Foi gostoso, quente e muito prazeroso. Quando saímos do quarto, descemos para bebermos algo no bar. E novamente o homão bonito começou a tomar o uísque como se fosse água, como se o álcool não atingisse seu organismo.
Parecia… natural.
Entre uma dança e outra paramos na área do tatuador. E guiada pela loucura novamente fiz outra coisa sem pensar. Aceitei fazermos uma tatuagem juntos. Ele solicitou ao tatuador uma pequena andorinha. Permiti que fosse tatuada na costela esquerda na linha da base dos meus seios. Sabia que doeria, pois escolhi um local bem delicado.
Luca — finalmente havia me dito ao menos seu primeiro nome — tatuou acima do seu peito esquerdo. E depois voltamos ao bar. Mordi a língua várias vezes para impedir de parecer idiota por chamar sua atenção quanto ao álcool. Porém, me contive. Um conhecido o chamou e disse que voltaria assim que possível.
Não aconteceu. Depois o procurei pela mansão, mas não o vi mais.
E agora estou sentindo o gostinho amargo da irresponsabilidade daquela noite.
— Farei o teste amanhã.
Levanto da cadeira, pego o vidrinho da base e começo a cobrir da melhor forma possível a tatuagem. Ser stripper também traz consequências e fazemos de tudo para evitá-las. A última coisa que queremos é que um cliente nos marque. Alguns chegam a passar dos limites.
Graças à Deus, Donna mantém os seguranças sempre em alerta.
Coloco a base na penteadeira e ajeito a peruca ruiva na minha cabeça, conferindo se está realmente presa. Seria horrível estar performando e a peruca soltar.
Afasto as cortinas e paro em frente à barra no centro do palco. Usando uma fantasia sexy de policial, começo a mover o corpo para as centenas de homens em suas mesas e banquetas no bar. Tento ser a melhor, apesar de estar acabada por dentro.
Obviamente tinha planos de conseguir um bom estágio para sair do clube. É um trabalho como qualquer outro, mas a sociedade é machista e hipócrita demais para aceitar uma mulher que trabalha com o corpo, seja de quaisquer formas.
Eu não quero envelhecer aqui…tenho objetivos. Mas agora parecem tão distantes.
Apenas de lingerie volto à barra a subindo para em seguida escorregar sensualmente. Finjo um sorriso ao terminar a performance. Ao chegar no camarim rapidamente pego minha mochila e sigo para o banheiro.
Tiro a lingerie suada vestindo um conjunto íntimo confortável. Trajo a calça jeans folgada e surrada, camisa com estampa de uma banda de rock três vezes maior do que meu tamanho, faço um coque no cabelo e coloco o boné.
Uso essa tática para chamar menos atenção possível dos homens, principalmente esse horário. Não é nada seguro. Recolho as minhas coisas guardando na mochila.
Jax aparece com as notas de euros enroladas e entrega para mim. Fiz um bom dinheiro hoje.
Sofia coloca sua mochila em suas costas e saímos pela saída dos funcionários. Assim como eu, também usa roupas largas. Tudo para evitar que homens sem noção joguem cantadas nojentas ou que sejam abusivos ao ponto de encurralar e fazer coisa pior.
Paramos em frente de uma farmácia e entramos. Compro três tipos de testes recebendo um olhar sarcástico da minha melhor amiga.
No fundo do meu âmago torço para os resultados serem negativos, mesmo tendo conhecimento de que a probabilidade de serem positivos são enormes.